sexta-feira, 12 de março de 2010

FIDC Lastreado com Precatórios Alimentícios




Para a constituição de um fundo creditório com lastro em precatórios alimentícios, bastaria uma regulamentação para tanto, prevendo a cessão do crédito constituído pelo precatório para o fundo e uma participação da Procuradoria do Estado no sentido de garantir a veracidade, legitimidade do precatório.



FONTE: COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Processo CVM nº RJ2002/4960

Reg. Col. nº 3890/2002


Assunto: Consulta de ASM Asset Manangement Ltda. sobre a possibilidade de inclusão de precatórios alimentícios nas carteiras de fundos de investimentos em direitos creditórios.

Interessada: ASM Asset Management Ltda.
Relator: Luiz Antonio de Sampaio Campos
Senhores Membros do Colegiado,

1. Trata-se de consulta formulada pela ASM Asset Management Ltda. sobre o entendimento desta Comissão a respeito da aplicação por um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), regulamentado pela Resolução CMN nº 2.907/01 e pela Instrução CVM nº 356/01, em créditos decorrentes de precatórios/mandados requisitórios judiciais alimentícios expedidos contra o Estado do Rio de Janeiro (fls. 01/03).

2. A ASM Asset Management ressalta que os precatórios alimentícios decorrem de uma contraprestação do Estado pelos trabalhos realizados por seus servidores e entende serem os precatórios alimentícios originados de prestações de serviço da Fazenda Pública passíveis de ser adquiridos para compor as carteiras dos FIDCs.

3. A GJU-1, no MEMO/CVM/GJU-1/Nº179/02, assim manifestou seu entendimento (fls. 07/08 bis):

i. o assunto não seria tão simples como foi apresentado no pedido, precatórios não seriam ativos financeiros e não haveria como a CVM responsabilizar-se pela legitimidade dos precatórios que integrariam a carteira do possível fundo;

ii. seriam vários os órgãos judiciais no Estado do Rio de Janeiro que poderiam emitir precatórios alimentícios, diferentemente do que aponta o pedido da ASM de que o precatório alimentício é aquele reconhecido por sentença judicial do dependente do servidor público falecido;

iii. embora os precatórios alimentícios gozem de prioridade na liquidação, não possuiriam muita liquidez, assim, caso fosse autorizada a constituição do fundo em exame, deveria ser composta de algumas cautelas;

iv. é sugerido aos interessados que continuem as pesquisas de negociação com precatórios para que seja apresentada à CVM uma proposta de constituição de FDIC mais completa e direcionada, já que não competiria à CVM fiscalizar a legitimidade de cada precatório que poderia compor a carteira do Fundo a ser constituído; e

v. para a constituição de um fundo creditório com lastro em precatórios alimentícios, bastaria uma regulamentação para tanto, prevendo a cessão do crédito constituído pelo precatório para o fundo e uma participação da Procuradoria do Estado no sentido de garantir a veracidade, legitimidade do precatório.

4. O Sub Procurador-Chefe da GJU-1, em despacho ao memo citado, entende juridicamente possível a constituição de fundo de investimento em direitos creditórios com a carteira formada preponderantemente por precatórios judiciais, já que a Instrução CVM nº 356/01 em seu artigo 2º, I, apesar de não incluir esse tipo de crédito expressamente, admite os direitos insertos em outros ativos financeiros e modalidades de investimento admitidos nos termos da Instrução. Uma vez que não se encontraria, em tal normativo, uma regra que fornecesse critérios para a admissão de "outros ativos e modalidades", a CVM poderia definir, caso a caso, o enquadramento de outras hipóteses no conceito de direitos creditórios. No entanto, caso a CVM admita a constituição de fundos de recebíveis lastreados em precatórios judiciais, deverá ser exigido, além do instrumento de cessão de créditos, prévia manifestação da Procuradoria Geral do Estado confirmando a ausência de quaisquer irregularidades que possam prejudicar a exeqüibilidade do termo de cessão (fls. 09).

5. Em nova manifestação, a PJU reitera que (fls. 62):

i. a natureza jurídica dos precatórios não seria a de ativo financeiro, porém, os mesmos poderiam ser considerados como tal para os fins da Instrução CVM nº 356/01;

ii. não haveria obstáculos quanto à possibilidade de custódia e registro dos precatórios e das quotas do fundo nos termos do §4º do artigo 40 da mencionada Instrução, desde que a própria CVM fosse protegida, nos moldes do memorando anterior, no sentido de não vir a ser responsabilizada pela veracidade ou legalidade do precatório que integraria a carteira do fundo, bem como para que a CVM não fosse questionada em escândalos envolvendo emissões ou pagamentos irregulares de precatórios à luz dos que já ocorreram em nosso país.

6. O Procurador-Chefe Em Exercício acrescenta que, por ser o precatório a forma pela qual se processa a execução contra a Fazenda Pública, consubstanciada numa sentença transitada em julgado e já devidamente liquidada, se impõe manifestação da PGE no sentido de reconhecer a sua autenticidade, legitimidade e valor, além de afirmar que não será proposta ação rescisória da sentença objeto do precatório, pois o único risco que o investidor deve correr diz respeito à capacidade de o Estado/Devedor ter condições de pagar aquele precatório. Quanto à custódia, não vê problema quanto à sua efetivação, pois, embora infungível, o precatório pode ser objeto de cessão, não havendo qualquer óbice à sua custódia por instituição autorizada pela CVM (fls. 63).

7. A GIC, no MEMO/CVM/GIC/Nº 016/02, manifestou seu entendimento no sentido de que (fls. 64):

i. os precatórios alimentícios não seriam ativos financeiros e não poderiam ser enquadrados como direitos creditórios originários de operações realizadas no segmento de prestações de serviços;

ii. à luz da legislação atual, tais precatórios não poderiam fazer parte da carteira de um FIDC.

8. A SIN, no MEMO/CVM/SIN/Nº 037/02, manifestou seu entendimento de que (fls. 65):
i. a inclusão, na carteira de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios, de ativos não previstos na legislação em vigor dependeria de prévia alteração da Instrução CVM nº 356/01; e
ii. sugere que o pleito da ASM Asset Management Ltda. seja encaminhado ao Colegiado para que este aprecie a conveniência de se alterar o normativo em questão.

9. Analisados os autos, entendo possível que se defira o pleito ora formulado.

10. Na linha do entendimento manifestado pela PJU, é juridicamente possível a constituição de um fundo de investimento em direitos creditórios com carteira formada preponderantemente por precatórios judiciais. A Instrução CVM nº 356/01, apesar de não incluir expressamente esse tipo de crédito, admite a possibilidade de "direitos insertos em outros ativos financeiros".

11. Por mais que, a princípio, os precatórios alimentícios possam parecer não se enquadrar no conceito de "ativos financeiros", ou como direitos creditórios originários de operações realizadas no segmento de prestações de serviços, tal questão pode ser resolvida através de uma manifestação do Colegiado, em análise do caso concreto e sem a necessidade de se alterar a Instrução CVM nº 356/01.

12. É que, sendo a criação de normas no âmbito da competência legal da CVM, prevista na Lei nº 6.385/76, atribuídas ao Colegiado da autarquia, entende-se que seria possível que este, diante do caso concreto, venha a decidir aplicar ou afastar a aplicação de determinado normativo de sua competência.

13. No que se refere ao presente caso concreto, e na linha do entendimento manifestado pela PJU, para que se possa compor a carteira de um FIDC com precatórios alimentícios, é necessário que, adicionalmente, a Procuradoria Geral do Estado certifique a veracidade, a legitimidade, a realidade dos precatórios alimentícios objeto do fundo de direitos creditório em questão, uma vez que escaparia a esta Autarquia a competência para tanto.

14. Por todo o exposto, voto no sentido de se aprovar, especificamente para o caso concreto, que a ASM Asset Management Ltda venha a constituir fundo de investimento em direito creditório com lastro em precatórios alimentícios, desde que a garantia de regularidade de tais precatórios seja feita pela Procuradoria Geral do Estado.

15. Nada obstante, caso se entenda necessário e conveniente, sugiro que a Instrução que rege os fundos de investimento em direito creditórios seja alterada para permitir que os precatórios alimentícios possam compor as carteiras de tais fundos.
É o meu Voto.
Rio de Janeiro, 21 de janeiro de 2003
Luiz Antonio de Sampaio Campos
Diretor-Relator

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