quarta-feira, 30 de setembro de 2009

DESAPROPRIAÇÕES NO PARANÁ - FOZ DO IGUAÇU





FONTE: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA




PROCESSO ORIGINÁRIO 1ª INSTÂNCIA.


AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO Nº 98.10.11659-4 (PR)
Data de autuação: 15/05/1998
Observação: AREA DE TERRA MEDINDO APROXIMADAMENTE 40.025.5200 HA, DENOMINADA COLONIA RIO QUARTO. DESMEMBRAMENTO DOS AUTOS 87.101.1613-3
Juiz: Sergio Luis Ruivo Marques
Órgão Julgador: JUÍZO SUBSTITUTO DA 01A VF E JEF CÍVEL/PREV DE FOZ DO IGUAÇU
Órgão Atual: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4A REGIÃO
Localizador: GR
Situação: MOVIMENTO
Assuntos:

1. Desapropriação por Interesse Social Comum/ Lei 4.132/62


AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
Advogado: NIRCLESIO JOSE ZABOT

RÉU: JOSE SABINO DE OLIVEIRA


PROCESSO EM 2ª INSTÂNCIA.


REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 2002.04.01.011434-5 (TRF)

Originário: DESAPROPRIAÇÃO Nº 98.10.11659-4 (PR)
Data de autuação: 06/03/2002
Relator: Juíza Federal MARCIANE BONZANINI - 3ª TURMA
Órgão Atual: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Localizador: GR
Situação: MOVIMENTO
Assuntos:

1. Desapropriação por Interesse Social para Reforma Agrária


PARTE AUTORA: JOSE SABINO DE OLIVEIRA

PARTE RE': INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA

Advogado: Marcelo Ayres Kurtz

DESAPROPRIAÇÃO Nº 98.10.11659-4 (PR)



QUESTÕES ESCLARECIDAS FORMANDO JURISPRUDÊNCIA PARA OS PROCESSOS DE DESAPROPRIAÇÃO EM FAIXA DE FRONTEIRA NO ESTADO DO PARANÁ.

TESES EM DEBATE AO FINAL ÍNTEGRA DA DECISÃO.

Nulidade do título de domínio do expropriado não significa impossibilidade jurídica de desapropriação, ligando-se ao mérito da própria ação

Possibilidade de análise em ação de desapropriação, considerando os contornos específicos do caso (violência e disputa de terras concedidas a non domino ), da validade do título de domínio do expropriado.

Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertence, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.

A dúvida relativa ao proprietário privado do imóvel (não é o caso dos autos) é irrelevante para o andamento da desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada pelo Poder Público.

A discussão quanto ao proprietário privado somente é relevante para definir quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de depositar ou apurar o seu quantum .

No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as terras a serem desapropriadas. É evidente que seus imóveis não podem ser objeto de Ação de Desapropriação, muito menos quando por ela intentada.




Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 763.542 - PR (2005/0106944-4)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN


RECORRENTE : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : CESAR AUGUSTO BINDER E OUTRO(S)
RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA
AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : MARCELO AYRES KURTZ E OUTRO(S)
INTERES. : JOSÉ SABINO DE OLIVEIRA
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS

DECISÃO

Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição da República, contra acórdão assim ementado:

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. ÁREA SITUADA NA FAIXA DE FRONTEIRA, CONDIÇÕES DA AÇÃO ATENDIDAS. POSSIBILIDADE DE EXAME DA VALIDADE DO TÍTULO DO EXPROPRIADO COMO QUESTÃO PRÉVIA AO DIREITO À INDENIZAÇÃO.

1. Nulidade do título de domínio do expropriado não significa impossibilidade jurídica de desapropriação, ligando-se ao mérito da própria ação. A legitimidade passiva do expropriado é afirmada a partir do título de domínio que possui. O interesse processual deve ser analisado no caso concreto, não meramente a partir da forma processual utilizada. Utilização da ação de desapropriação para regularização fundiária e para estancar situação de violência e disputa por terras.

2. Possibilidade de análise em ação de desapropriação, considerando os contornos específicos do caso (violência e disputa de terras concedidas a non domino ), da validade do título de domínio do expropriado.

3. Remessa oficial provida para anular a sentença.

O recorrente alega ter havido violação dos arts. 128 e 460 do CPC; do art. 2º, §§ 1º e 2º da Lei 9.871/1999; argumentando que:

a) "não é o Estado do Paraná legitimado passivamente para o feito, pois na desapropriação não responderá pela indenização da posse e tampouco é ele atingido pelo ato desapropriatório" (fl. 128);

b) "o presente processo não viabilizava espaço para o reconhecimento da nulidade do título de concessão de propriedade" (fl. 129); e

c) " a questão prejudicial, qual seja, a legitimidade do domínio, deve ser resolvida por meio de procedimento específico ou
ação própria, conforme, inclusive, foi pedido pela autarquia expropriante em sua
petição inicial" (fl. 132).

Contra-razões apresentadas (fls. 157-168).

O Ministério Público Federal opina pelo provimento do Recurso Especial, conforme parecer de fls. 177-182.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, cabe salientar que a tese concernente à ilegitimidade passiva do Estado do Paraná não merece prosperar, tendo em vista que o ora recorrente não apontou quais dispositivos legais deixaram de ser observados pelo acórdão impugnado. Isso porque o STJ entende ser inviável o Recurso Especial, fundado na alínea "a" do permissivo constitucional, que não especifica quais normas legais foram violadas. Incide, na espécie, por analogia, o princípio contido na Súmula 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

Passo ao mérito.

Cinge-se a controvérsia à possibilidade de discussão sobre o domínio público das terras objeto de Ação de Desapropriação, por se tratar, no essencial, de questão atinente à possibilidade jurídica do pedido (alega-se que o bem pertence ao próprio Poder Público expropriante).

É indiscutível que o art. 20 impede, em regra, o debate acerca de domínio nas Ações de Desapropriação:

Art. 20. A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.

De modo coerente, veda-se o levantamento da indenização no caso de dúvida quanto ao domínio (o que pressupõe o depósito pelo expropriante):

Art. 34. O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.

Parágrafo único. Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o preço ficará em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para disputá-lo.

Ao interpretar esses dispositivos, a Segunda Turma tem entendido que seria inviável o debate relativo ao domínio das terras de fronteiras, que deve ser remetido às vias próprias (ação direta – art. 20 do DL 3.365/1941).

Ocorre que esses dispositivos legais, acima transcritos, referem-se, s.m.j., à discussão dominial entre particulares e não são aplicáveis quando a controvérsia recai sobre a possibilidade de desapropriação em si, no caso de o imóvel pertencer ao expropriante. Assim como ninguém pode comprar de outrem o que é seu, tampouco pode a Administração indenizar terceiros por aquilo que integra o domínio público.

Esclareço: se há dúvida quanto ao proprietário privado do imóvel desapropriado, se Tício ou Caio, isso é irrelevante para o andamento da desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada pelo Poder Público, já que a terra não lhe pertence.

Essa discussão quanto ao proprietário privado somente interessa na definição de quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de depositar ou apurar o quantum do depósito.

É por essa razão que o art. 20 do DL 3.365/1941 refere-se à contestação da desapropriação, que é apresentada, evidentemente, pelo expropriado ("A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta").

Não há dúvida, por conseguinte, de que o particular não pode suscitar, em sua resposta processual, o debate a respeito do domínio, pois tal matéria em nada alteraria o contexto jurídico do caso: quem quer que venha a ser considerado o dono verdadeiro, a terra continuará privada e, se o Estado dela precisa, necessário indenizar seus reais proprietários. Nada mais razoável então que debate desta natureza seja feito em outra ação, considerando-se que o procedimento da desapropriatória prestigia o interesse social na imediata imissão na posse e na célere transferência do domínio para o Poder Público. Do contrário, as desapropriações, especialmente para reforma agrária, demorariam dezenas de anos para surtir o efeito prático, tido por urgente pelo Poder Público, isto é, o assentamento dos sem-terra e a conseqüente pacificação social.

Note-se, portanto, que o art. 20 do DL 3.365/1941 é dispositivo inscrito em favor do Poder Público. É paradoxal interpretá-lo de modo a impelir a União a pagar por um imóvel que lhe pertence ou a continuar com uma ação desapropriatória a qual falte o pressuposto jurídico mais importante, vale dizer, a dominialidade alheia do bem!

No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as terras a serem desapropriadas. É evidente que o imóvel da União não pode ser objeto de Ação de Desapropriação, muito menos quando intentada por ela mesma. O debate sobre a propriedade, nessa hipótese excepcional, prejudica a existência da ação expropriatória.

Trata-se, como visto, de óbice ao próprio desenvolvimento válido do processo, cujo enfrentamento não pode ser evitado ou adiado pelo Judiciário, sob pena de condenar absurdamente a União a pagar por imóvel que lhe pertence e foi, a seguir, retitulado em favor dos particulares!

O eminente Ministro Luiz Fux, em diversos processos na Primeira Turma, tem esclarecido com maestria o cerne da questão (REsp 542.056/PR, por ele relatado):

Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.

A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365/41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria, o que encerra figura assemelhada à confusão.

Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.

Como visto, os arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941 referem-se à dúvida dominial entre os particulares. Esse debate, em regra, é irrelevante para o prosseguimento da Ação de Desapropriação, que prestigia o interesse social na imediata imissão na posse e célere transferência do domínio para o Poder Público. O levantamento da indenização pelo particular fica na dependência da solução da controvérsia quanto à propriedade do imóvel.

Os autos tratam de hipótese excepcional e diversa daquela prevista no Decreto-Lei 3.365/1941, o que leva ao afastamento da aplicação da regra em questão.

Os dispositivos citados (arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941) não podem impedir a discussão quanto à possibilidade jurídica do pedido, já que é inviável uma Ação de Desapropriação de imóveis da União situados na faixa de fronteira. Essa matéria não está sendo trazida pela parte expropriada - via contestação, como referida no art. 20 -, mas pela Autoridade desapropriante.

Nesse sentido, precedente da Primeira Seção desta Corte, de minha relatoria, julgado em 12 de agosto de 2009 –

EREsp 783840/PR: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. TERRAS DE FRONTEIRA. DEBATE ACERCA DA PROPRIEDADE PÚBLICA DOS IMÓVEIS. POSSIBILIDADE. CONDIÇÃO DA AÇÃO: POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. ARTS. 20 E 34 DO DL 3.365/1941. INAPLICABILIDADE.
(...)

7. O art. 20 do DL 3.365/1941 impede, em regra, a discussão sobre o domínio nas Ações de Desapropriação. De modo coerente, o art. 34, parágrafo único, veda o levantamento da indenização no caso de dúvida quanto ao domínio (o que pressupõe o depósito pelo expropriante).

8. Ocorre que esses dispositivos legais (arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941) referem-se à questão dominial entre particulares e são inaplicáveis se a dúvida recair sobre a possibilidade de desapropriação, no caso de o imóvel pertencer ao expropriante.

9. A dúvida relativa ao proprietário privado do imóvel (não é o caso dos autos) é irrelevante para o andamento da desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada pelo Poder Público.

10. A discussão quanto ao proprietário privado somente é relevante para definir quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de depositar ou apurar o seu quantum . Por essa razão, o art. 20 do DL 3.365/1941 refere-se à contestação da desapropriação, que é apresentada, evidentemente, pelo expropriado.

11. O art. 20 do DL 3.365/1941 é dispositivo inscrito em favor do Poder Público, que prestigia a celeridade processual e o interesse social.

Seria paradoxal interpretá-lo de modo a compelir a União a pagar por imóvel que lhe pertence.

12. No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as terras a serem desapropriadas. É evidente que seus imóveis não podem ser objeto de Ação de Desapropriação, muito menos quando por ela intentada.
(...)

16. Embargos de Divergência não providos Diante do exposto, nos termos do art. 557, caput, do CPC, nego seguimento ao Recurso Especial.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília (DF), 08 de setembro de 2009.
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator

sábado, 19 de setembro de 2009

DESAPROPRIAÇÃO EM FRONTEIRA PARANÁ: Determina-se o Imediato Pagamento das Indenizações


O objetivo da presente matéria, é formular as perguntas e obter as respostas mais que definitivas, terminativas; estás, perguntas e respostas formuladas e respondidas pelos Tribunais.

Superado os destaques, a decisão na sua íntegra, segue-me abaixo.


FONTE:

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4º REGIÃO.

PERGUNTAS E RESPOSTAS EXTRAÍDAS DA DECISÃO QUE SE PUBLICA A ABAIXO.



1º) “Mas, então, resta perguntar: Quando e em que sede travar-se-ia a discussão sobre a validade do título ? A resposta é simples: a União deveria ajuizar, logo após prolatada a sentença, ação dominial, em que buscaria, além do reconhecimento de sua propriedade, o desfazimento do título de propriedade e cancelamento do respectivo registro”.


2º) “... perguntar-se, agora: qual o fundamento sobre o qual repousa a recusa do INCRA em indenizar o Autor ? Certamente, não é a validade do título de propriedade, pois que pessoas portadoras dos mesmos papéis houveram-nos como ratificados como a própria autarquia reconhece explicitamente. Ao expropriado, faltar-lhe-ia o requisito da posse”.


3º) “Mas, quem demonstrou tal ausência de posse, que a propriedade em si mesma faz presumir, vez que "será deferida a posse a quem evidentemente tiver o domínio, se com base neste for ela disputada" ? Debalde retrucar que o domínio da União é que é o evidente, porque exposto em sede constitucional, porquanto se sabe que há terrenos da faixa de fronteira pertencentes a particulares; e, conforme já se viu, o próprio INCRA já reconheceu a propriedade de muitos daqueles que detentores do mesmo título”.


4º) “Anote-se, mais, porque relevante, que a discussão dominial havia de travar-se entre a União e o expropriado; o Ministério Público, evidentemente, é parte ilegítima passiva concernentemente ao tema. Assim, além de não se prestar a ação civil pública para o escopo, a relação processual na ação civil pública está flagrantemente mal formada”.


5º) “Ora, com a desapropriação, por sentença passada em julgado, a propriedade passou ao INCRA, que, irrecusavelmente, é pessoa jurídica diversa da União”.


6º) “A escolha da área para desapropriar, esta sim, situa-se em área de oportunidade e conveniência; é assunto político, e o juiz não se faz substituir ao administrador; mas o tratamento igualitário é direito subjetivo de quem se encontre em igual situação”.


7º) “Despiciendo dizer-se agora que as terras já pertenciam à União; seria admitir que o processo desapropriatório havido, chegado a termo, com trânsito em julgado da sentença respectiva, não passa de simulacro, de fingimento, nada guardando de seriedade. Fazer-se tabula rasa da sentença passada em julgado é temerariamente rir da Justiça”.


JURISPRUDÊNCIAS:

Supremo Tribunal Federal: Reclamação nº 1.169/PR

Superior Tribuna de Justiça: Recurso Especial nº 463762/PR

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2003.04.01.056175-5/PR

Publicado no D. J. U em 13/07/2005.

DA IDENTIDADE FACTUAL E JURÍDICA ENTRE AS AÇÕES:
CIVIL PÚBLICA; E DECLARATÓRIO DE NULIDADE DE TÍTULOS.


“Encontro identidade factual e jurídica entre a decisão ora em análise e aquela, também da lavra do i. Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, lançada no bojo de ação desapropriatória, que determinava a suspensão dos pagamentos das indenizações sob o fundamento de que tramitava Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal, na qual se discutia o domínio da área.”


SOBRE A LEGISLAÇÃO PRÓPRIA PARA AS DESAPROPRIAÇÕES EM FRONTEIRA NO ESTADO DO PARANÁ.

“...Nenhuma situação de beligerância pode pretextar tamanha distorção de figuras jurídicas, improvisando-se uma legislação sui generis, uma desapropriação com negativa da propriedade, um depósito de uma indenização que não se pretende pagar, autarquia desapropriando bem que pretende seja da União; enfim, toda uma série de absurdos com conseqüências igualmente absurdas, tal como a utilização de ação civil pública para discussão de domínio”


RECLAMAÇÃO Nº 1.169 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

"Em um primeiro momento, há que se considerar que desapropriação não é remédio judicial para anulação de títulos dominiais. Entender que o depósito realizado foi uma mera ficção, porquanto nada havia para indenizar, quer em relação a quem havia a posse, quer em relação a quem jamais a exerceu, é adentrar na esfera do inimaginável, trabalhando no abstrato, sem âncoras quaisquer a estabelecer mínimo nexo com o universo fático. Houve uma desapropriação, chegada a termo, com trânsito em julgado. Reclamação não é remédio processual para afastar a res judicata, principalmente quando esta se mostra definitiva, ultrapassado o prazo da rescisória. A respeito, o MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE , no julgamento da RCL 1169-PR"


"Ora, é firme o entendimento do STF no sentido de que a reclamação, não sendo sucedâneo da ação rescisória, é incabível contra decisão transitada em julgado (v.g. Rcl 365, Moreira Alves, DJ de 7.8.92 e Rcl 603, Velloso, DJ 12.2.88; Rcl /Ag Rg) 1.901-SP, rel. Ministro Celso de Mello, 3.10.2001; Rcl (AgRg) 1.108-SP, rel. Ministro Nelson Jobim, 15.2.2001. (RCL 1108)".


"Na espécie, vale frisar, as decisões reclamadas transitaram em julgado antes do ajuizamento da reclamação-este ocorrido em 11.10.99".


RECURSO ESPECIAL Nº 463762/PR SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANULAÇÃO DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE. SUSTAÇÃO LIMINAR DO LEVANTAMENTO DO PREÇO. COMPETÊNCIA FUNCIONAL.

1. O juiz da ação em que se discute a dúvida fundada sobre o domínio de bem desapropriado, cujo preço encontra-se depositado, não é competente para determinar a sustação do pagamento. A competência é do juízo da ação expropriatória.

2. Tratando-se de competência funcional, admite-se sua verificação em qualquer tempo e grau de jurisdição.

3. Recursos improvidos, determinando-se o imediato levantamento do saldo remanescente depositado na ação desapropriatória.

(RESP n. 463762/PR - Relator p/ acórdão Ministro Paulo Medina, julgamento em 21.10.2003).


Tais fundamentos, aliado ao fato de que os expropriados penam há quase 30 anos para receber os valores devidos a título de indenização, tenho por conformados os pressupostos que devem concorrer para outorga da antecipação da tutela recursal, a qual defiro.

ÍNTEGRA DA DECISÃO

Publicado no D.J.U. de 13/07/2005


AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2003.04.01.056175-5/PR
RELATOR : Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
AGRAVANTE : EUCLIDES JOSE FORMIGHIERI e outro
ADVOGADO : Jose Alberto Dietrich Filho e outro
AGRAVADO : UNIAO FEDERAL
ADVOGADO : Luís Henrique Martins dos Anjos
AGRAVADO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
ADVOGADO : Marcelo Ayres Kurtz e João Carlos Bohler


DECISÃO

Questionam os recorrentes a decisão exarada pelo i. Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, da 1ª Vara Federal de Umuarama/PR, que, na ação de nulidade dos registros imobiliários lançados nas matrículas ns. 4.229, 4.230, 6.304, 22.080; 22.267 e 33.579, todas do Cartório de Registro de Imóveis de Cascavel, originários do imóvel rural denominado Colônia Pindorama, deferiu tutela de urgência determinando a suspensão do levantamento de qualquer valor de indenização, inclusive honorários advocatícios, depositados na Ação de Desapropriação n. 95.5010647-0, em trâmite naquela 1ª Vara Federal, e cujo objeto é a expropriação dos imóveis relacionados com os registros impugnados.

Há pedido de efeito suspensivo.

Encontro identidade factual e jurídica entre a decisão ora em análise e aquela, também da lavra do i. Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, lançada no bojo de ação desapropriatória, que determinava a suspensão dos pagamentos das indenizações sob o fundamento de que tramitava Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal, na qual se discutia o domínio da área. Ao apreciar o conteúdo desta decisão, em sede de embargos de declaração, os quais foram acolhidos para dar provimento ao AI n. 2003.04.01.000302-0 e reformá-la, assim me manifestei:

A vexata quaestio das desapropriações em faixa de fronteira no Estado do Paraná houve, desde seu início, um tratamento juridicamente teratológico, que todo esforço dos procuradores da autarquia não logram justificar. Nenhuma situação de beligerância pode pretextar tamanha distorção de figuras jurídicas, improvisando-se uma legislação sui generis, uma desapropriação com negativa da propriedade, um depósito de uma indenização que não se pretende pagar, autarquia desapropriando bem que pretende seja da União; enfim, toda uma série de absurdos com conseqüências igualmente absurdas, tal como a utilização de ação civil pública para discussão de domínio.

Em um primeiro momento, há que se considerar que desapropriação não é remédio judicial para anulação de títulos dominiais. Entender que o depósito realizado foi uma mera ficção, porquanto nada havia para indenizar, quer em relação a quem havia a posse, quer em relação a quem jamais a exerceu, é adentrar na esfera do inimaginável, trabalhando no abstrato, sem âncoras quaisquer a estabelecer mínimo nexo com o universo fático. Houve uma desapropriação, chegada a termo, com trânsito em julgado. Reclamação não é remédio processual para afastar a res judicata, principalmente quando esta se mostra definitiva, ultrapassado o prazo da rescisória. A respeito, o MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE , no julgamento da RCL 1169-PR (fls. 826 destes autos), ministra:

"De acordo com as certidões de f. 1.270/1.272, as decisões reclamadas transitaram em julgado nos dias 20.5.99 (Ap.Cível 92.04.13008-3), 21.2.95 (Ap. Cível nº 92.04.22070-8) e 2.5.95 (Ap. Cível 92.04.22069).

Ora, é firme o entendimento do STF no sentido de que a reclamação, não sendo sucedâneo da ação rescisória, é incabível contra decisão transitada em julgado (v.g. Rcl 365, Moreira Alves, DJ de 7.8.92 e Rcl 603, Velloso, DJ 12.2.88; Rcl /Ag Rg) 1.901-SP, rel. Ministro Celso de Mello, 3.10.2001; Rcl (AgRg) 1.108-SP, rel. Ministro Nelson Jobim, 15.2.2001. (RCL 1108).

Na espécie, vale frisar, as decisões reclamadas transitaram em julgado antes do ajuizamento da reclamação-este ocorrido em 11.10.99 - o que torna impertinente a invocação do decidido na Rcl 509 (Pertence, DJ 4.8.00), quando o Tribunal assentou que 'ajuizada a reclamação antes do trânsito em julgado da decisão reclamada, e não suspenso liminarmente o processo principal, a eficácia de tudo quanto nele se decidir ulteriormente, incluído o eventual trânsito em julgado do provimento que se tacha de contrário à autoridade de acórdão do STF, será desconstituída pela procedência da reclamação.'

A jurisprudência que não admite a reclamação para desconstituir decisão com trânsito em julgado é de ser mantida.

Com precisão nota, a respeito, o parecer sobre o caso do d. Eduardo Ribeiro:

'Se de singular importância se preserve a autoridade dos julgados do Supremo Tribunal Federal, não sendo sem razão que ao instrumento a isso destinado se haja emprestado dignidade constitucional, não é menos exato que a coisa julgada constitui valor de especial relevo, não podendo nem mesmo a lei atingi-la. Indispensável à segurança e à paz social que, uma vez tornado imutável o julgado, pela exaustão da possibilidade de recursos, se alcance tranqüilidade quanto ao bem da vida garantido pela sentença. Não se compatibiliza com nosso sistema possa, a qualquer tempo, ser desconstituída a coisa julgada, o que importaria negar sua finalidade precípua.
Para a reclamação, admissível tanto no Supremo Tribunal como no Superior Tribunal de Justiça, não há previsão de limite temporal. Desse modo, a aceitar-se não encontre aquela limitação, décadas depois do trânsito em julgado, estaria a sentença exposta a ser retirada do mundo jurídico. Isso significaria que o exercício da função jurisdicional não traria nunca a segurança que constitui, exatamente, uma de suas razões de ser.

Jamais se poderá saber se determinado bem está incorporado ao patrimônio jurídico de alguém, pois subsistiria a permanente ameaça de ser dele retirado, por entender-se que contrariada decisão do Supremo ou do STJ.

Na vigência da Constituição de 1988 essa questão foi objeto de exame, pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a Reclamação 509. Vossa Excelência, que a relatou, chegou a afirmar que, na reclamação, 'sempre se teve por dogma que a coisa julgada é inatacável.' Em vista de observações aduzidas pelo Ministro Moreira Alves, admitiu, em seguida, uma distinção, tendo como certo que 'ajuizada a reclamação antes do trânsito em julgado da decisão reclamada ela é admissível, e não suspenso liminarmente o processo, o que se nele vier a decidir ficará desconstituído pela eventual procedência da reclamação.' Esse o entendimento estampado na ementa do acórdão.
..............................................................................................................................'.Nem cabe redargüir, como o fez o em. Procurador-Geral., que as decisões reclamadas, 'por ofenderem a coisa julgada advinda do v. acórdão prolatado por esta Suprema Corte, jamais transitaram em julgado, eis que fulminadas de nulidade absoluta...'

Não é certo, data venia, que a sentença contrária a decisão transitada em julgado - ainda que promanada do Supremo Tribunal - seja eivada de nulidade absoluta: do contrário, não seria a ofensa à coisa julgada uma das hipóteses de rescindibilidade da sentença passada em julgado, sujeita porém à ação rescisória, ao prazo bienal de decadência.

Decadência cujos efeitos - bem por isso - não é de admitir possa a reclamação desfazer a qualquer tempo."

Com tais argumentos, foi rejeitada reclamação contra os acórdãos deste Tribunal que reconheceram válida a desapropriação especificamente em relação a EUCLYDES JOSÉ FORMIGHIERI (Reclamante: Procurador Geral da República, Reclamado este Tribunal, interessado EUCLYDES JOSÉ FORMIGHIERI)

Ora, se existe uma reclamação específica, cujo mérito não chegou a ser alcançado em homenagem à coisa julgada, como pretender que decisões de mérito de reclamações outras, concernentes a outros processos, que não guardam vínculo com o expropriado Formighieri, possam embasar decisão jurídica neste processo ? Seria uma forma de tomar emprestado de processos alheios um julgamento que o Supremo Tribunal Federal não quis fazer no caso cujo exame lhe estava submetido, porque não havia pressuposto para tal. Guarda razão, portanto o agravante, quando aponta contradição no acórdão, consistente esta em tomarem-se decisões de processos alheios enquanto rejeitada aquela que específica do feito.

E, falando-se em coisa julgada, estamos diante de uma desapropriação chegada a termo, com trânsito em julgado. Segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO ("Curso de Direito Administrativo", 13ª Edição, Malheiros, p. 711, "do ponto de vista teórico, pode-se dizer que desapropriação é o procedimento através do qual o Poder Público, compulsoriamente despoja alguém de sua propriedade e a adquire, mediante indenização, fundada em interesse público."

WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO ("Curso de Direito Civil", 3º vol, 27ª Edição, Saraiva, p. 171), após incluí-la dentre as maneiras de perder-se a propriedade, firma que "realmente, pela expropriação, o titular perde a propriedade, que se transfere, por necessidade ou utilidade pública, e também por interesse social, para o patrimônio do expropriante. No interesse da coletividade, opera-se a passagem do domínio para a entidade que promova a desapropriação."

Esta passagem para o domínio da autarquia já ocorreu. Despiciendo dizer-se agora que as terras já pertenciam à União; seria admitir que o processo desapropriatório havido, chegado a termo, com trânsito em julgado da sentença respectiva, não passa de simulacro, de fingimento, nada guardando de seriedade. Fazer-se tabula rasa da sentença passada em julgado é temerariamente rir da Justiça. O que se pode dizer, na hipótese vertente, com razão, é que a desapropriação havida ficou pendente de discussão quanto à validade do título de propriedade, sobre que o expropriante, desde a exordial, ressalvou existirem dúvidas.

Mas, então, resta perguntar: Quando e em que sede travar-se-ia a discussão sobre a validade do título ? A resposta é simples: a União deveria ajuizar, logo após prolatada a sentença, ação dominial, em que buscaria, além do reconhecimento de sua propriedade, o desfazimento do título de propriedade e cancelamento do respectivo registro. Mas, passados já mais de dez anos, não o fez o órgão público. A Ação Civil Pública, evidentemente, não é ação onde se possa resolver sobre domínio, nem guarda força rescisória sobre sentença desapropriatória passada em julgado. Os títulos de propriedade que o expropriado possui não podem ser olimpicamente desconsiderados. São papéis públicos, a que se deve fé enquanto não tornados insubsistentes por decisão judicial.

De perguntar-se, agora: qual o fundamento sobre o qual repousa a recusa do INCRA em indenizar o Autor ? Certamente, não é a validade do título de propriedade, pois que pessoas portadoras dos mesmos papéis houveram-nos como ratificados como a própria autarquia reconhece explicitamente. Ao expropriado, faltar-lhe-ia o requisito da posse. Mas, quem demonstrou tal ausência de posse, que a propriedade em si mesma faz presumir, vez que "será deferida a posse a quem evidentemente tiver o domínio, se com base neste for ela disputada" ? Debalde retrucar que o domínio da União é que é o evidente, porque exposto em sede constitucional, porquanto se sabe que há terrenos da faixa de fronteira pertencentes a particulares; e, conforme já se viu, o próprio INCRA já reconheceu a propriedade de muitos daqueles que detentores do mesmo título. Assevera o INCRA que o reconhecimento de tais título seria "liberalidade". Não vejo como emprestar à Administração discricionariedade nesta área. A escolha da área para desapropriar, esta sim, situa-se em área de oportunidade e conveniência; é assunto político, e o juiz não se faz substituir ao administrador; mas o tratamento igualitário é direito subjetivo de quem se encontre em igual situação. O estabelecimento de um discrimen (ter ou não a posse, como in casu), principalmente quando a questão está pendente em juízo, não pode ser resolvida senão em processo judicial regular, pena de negar-se o contraditório, cerceada a defesa. Verificada a prescrição (art. 172 do Código Civil anterior, c. c. os arts. 2.028 e 205 do Código Civil vigente), não vejo como continuar obstaculizando o levantamento sem malferir seriamente todo o sistema jurídico brasileiro, desrespeitando a res judicata, negando validade a processo regular de desapropriação, confundindo figuras processuais absolutamente distintas, emprestando-lhes escopos que jamais guardaram; enfim, improvisando um processo sui generis, casuisticamente, enquanto o desapropriado intenta em vão levantar a indenização que lhe foi destinada sob condição de solucionamento de uma demanda que a União não quis promover. Ora, com a desapropriação, por sentença passada em julgado, a propriedade passou ao INCRA, que, irrecusavelmente, é pessoa jurídica diversa da União. A transmigração do direito de propriedade ocorreu, com a autoridade e imutabilidade que o trânsito em julgado emprestou à sentença respectiva.

Anote-se, mais, porque relevante, que a discussão dominial havia de travar-se entre a União e o expropriado; o Ministério Público, evidentemente, é parte ilegítima passiva concernentemente ao tema. Assim, além de não se prestar a ação civil pública para o escopo, a relação processual na ação civil pública está flagrantemente mal formada.

A mim não me são estranhos comentários quanto a possíveis favorecimentos políticos que teriam gerado as escrituras de que dispõe o expropriado. Todavia, como explicar a omissão do próprio INCRA e da União em relação ao assunto.

Não bastassem estes significativos argumentos, que para mim, permissa venia, servem ao propósito de desconstituir as razões que estribaram a interlocutória em análise, flagro a ocorrência de error in procedendo do Juízo a quo, ao editar decisão que neutraliza a prestação jurisdicional em outra demanda, a qual, embora também esteja sob sua jurisdição, constitui ação autônoma e independente, não podendo ter seu curso regular bloqueado por ato jurisdicional exarado por autoridade de igual hierarquia; quando muito admitir-se-ia que, ante a notícia da parte interessada acerca da existência da ação de nulificação dos títulos, o Juízo responsável pela ação de desapropriação deliberasse a respeito, sob pena de usurpação de jurisdição. Naquela Ação Civil Pública que noticiei acima, tombada sob n. 98.5010865-7, foi exarada decisão com idêntico alcance, propósito e fundamentos da ora combatida, suspendendo o levantamento de qualquer valor de indenização, inclusive honorários advocatícios, depositados à disposição do Juízo da expropriatória, a qual, contudo, foi cassada por esta Corte Regional, cujo acórdão veio a ser confirmado pelo Egrégio STJ. Na Instância Especial, como fundamento de decidir, o aresto contou exatamente com a configuração de desrespeito à competência funcional, in verbis:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANULAÇÃO DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE. SUSTAÇÃO LIMINAR DO LEVANTAMENTO DO PREÇO. COMPETÊNCIA FUNCIONAL.

1. O juiz da ação em que se discute a dúvida fundada sobre o domínio de bem desapropriado, cujo preço encontra-se depositado, não é competente para determinar a sustação do pagamento. A competência é do juízo da ação expropriatória.

2. Tratando-se de competência funcional, admite-se sua verificação em qualquer tempo e grau de jurisdição.

3. Recursos improvidos, determinando-se o imediato levantamento do saldo remanescente depositado na ação desapropriatória.

(RESP n. 463762/PR - Relator p/ acórdão Ministro Paulo Medina, julgamento em 21.10.2003).

Tais fundamentos, aliado ao fato de que os expropriados penam há quase 30 anos para receber os valores devidos a título de indenização, tenho por conformados os pressupostos que devem concorrer para outorga da antecipação da tutela recursal, a qual defiro.

Comunique-se.

Intime-se a parte agravada para resposta.
Após, ao Ministério Público Federal.
Publique-se.
Porto Alegre, 16 de março de 2005.


Des. Fed. LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
Relator

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

COLÔNIA GUAIRACÁ: Desapropriação em Fronteira Estado do Paraná



FONTE:
Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudência



RECURSO ESPECIAL Nº 826.048 - PR (2006⁄0049453-8)
RELATOR : MINISTRO JOSÉ DELGADO
RECORRENTE : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : CÉSAR AUGUSTO BINDER E OUTROS
RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTROS
INTERES. : BENEDITO SEBASTIÃO ALVES E OUTROS
ADVOGADO : LUIZ ROBERTO ROMANO

EMENTA

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NO ESTADO DO PARANÁ. ÁREA EM ZONA DE FRONTEIRA DENOMINADA COLÔNIA GUAIRACÁ. ALIENAÇÃO PELO ESTADO. DECRETAÇÃO DE NULIDADE DO TÍTULO DO EXPROPRIADO PELA SENTENÇA. ILEGITIMIDADE DO ESTADO PARA FIGURAR NA LIDE. AUSÊNCIA DE INFRINGÊNCIA DO ART. 535 DO CPC. NÃO-PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 282⁄STF E 211⁄STJ
.

1. Cuidam os autos de ação de desapropriação ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA em desfavor de BENEDITO SEBASTIÃO ALVES e OUTROS com o intuito de regularização fundiária de terras situadas na Colônia Guairacá, no Estado do Paraná, diante de distúrbios existentes à época quanto à sua posse e propriedade, tendo o INCRA sido emitido na posse em 16⁄03⁄1976.

Sentença afastou as preliminares, bem como a existência de conflito a ser dirimido pelo STF, para julgar procedente o pedido a fim de consolidar a propriedade do INCRA sobre a área desapropriada, reputando nulos de pleno direito os títulos de propriedade dos expropriados, não sendo devida qualquer indenização. Outrossim, determinou a expedição de ofício ao INCRA autorizando o levantamento e⁄ou cancelamento de todos os TDAs depositados em favor dos expropriados.

Apelações dos desapropriados e do Estado do Paraná, às quais o TRF⁄4ª Região negou provimento sob os seguintes fundamentos:

a) é possível a análise da validade do título dominial do expropriado;

b) não há como apreciar a questão do domínio sem que o Estado do Paraná integre a lide, na qualidade de litisconsorte passivo necessário;

c) ilegitimidade do título dominial do expropriado, uma vez que o imóvel expropriando integrava o patrimônio da União;

d) nulo o título originário da cadeia dominial, não há que se falar em pagamento de indenização restando prejudicadas as questões atinentes ao preço justo.

Recurso especial do Estado do Paraná requerendo:

a) a declaração de nulidade do acórdão que apreciou os embargos de declaração, determinando-se o retorno dos autos ao TRF⁄4ª Região para o saneamento das omissões apontadas;

b) em caso de negativa desse pleito, seja cassado o acórdão recorrido, reconhecendo-se:

(a) sua ilegitimidade passiva; ou

(b) a invalidade do provimento extra petita de nulidade do título translativo em feito de desapropriação;

(c) ausência de interesse de agir do ente estatal;

(d) que deve ser afastada a nulidade dos títulos de propriedade dos expropriados em razão do permissivo criado pela Lei nº 9.871⁄99, pois esta possibilita a ratificação de atos de alienação originariamente non domino, o que legitima, por força da referida legislação, a transformação de ato nulo em anulável. Aponta-se negativa de vigência dos seguintes preceitos: arts. 3º, 47, 128, 264, 267, VI, 460 e 535, II, do CPC; arts. 1º, 2º e 3º, § 1º, da Lei nº 9.871⁄99; art. 6º da LC nº 76⁄93; arts. 20 e 34 do Decreto-Lei nº 3.365⁄41.

Contra-razões argumentando:

(a) os dispositivos tidos como violados não foram prequestionados;

(b) incidência da Súmula nº 7⁄STJ;

(c) descabimento da preliminar de julgamento extra petita. Parecer do MPF opinando pelo não-conhecimento do apelo e, no mérito, pelo não-provimento.


2. Ausência de prequestionamento dos arts. 267, VI, CPC, 6º da LC 76⁄93 e 20 do Decreto-Lei nº 3.365⁄41. Incidência das Súmulas 282⁄STF e 211⁄STJ.


3. Não-configuração de violação do art. 535, II, do CPC, porquanto todas as questões pertinentes ao desate da lide foram devidamente examinadas pela Corte a quo, sendo certo que o Julgador não está obrigado a responder todos os questionamentos das partes quando houver encontrado fundamentação suficiente para julgar a controvérsia.


4. O acórdão recorrido emitiu o pronunciamento de que o Estado do Paraná é parte legítima para integrar a lide, pois a ação diz respeito a terras devolutas, cuja transferência decorreu de ato por ele praticado. Assim, a decisão que julgasse a validade dessa transferência afetaria a esfera jurídica do cedente, não havendo como apreciar a questão do domínio sem que esse ente público integrasse a lide na qualidade de litisconsorte passivo necessário.


5. Em que pese o saber jurídico exposto no voto condutor do aresto de segundo grau, entendo que a melhor exegese a ser aplicada ao caso concreto é a de que o Estado do Paraná não possui legitimidade para figurar no pólo passivo da presente ação de desapropriação, tendo em vista que não responderá pela indenização da posse, tampouco será atingido pelo ato expropriatório. Ainda que se pudesse admitir eventual discussão acerca do domínio nesta espécie de ação, não haveria guarida para a permanência do ente federativo na lide, pois não é titular de qualquer direito discutido nos autos.


6. Fica prejudicada a análise dos demais preceitos normativos invocados como malferidos no recurso especial em face do acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva do recorrente. Igualmente, no que diz respeito à alínea "c", pois a divergência pretoriana sustenta-se na necessidade do manejo de ação específica para a anulação de título translativo de propriedade.

7. Recurso especial parcialmente conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Teori Albino Zavascki e Denise Arruda votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Luiz Fux.

Brasília (DF), 17 de agosto de 2006 (Data do Julgamento)

MINISTRO JOSÉ DELGADO
Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 826.048 - PR (2006⁄0049453-8)

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): Trata-se de recurso especial (fls. 267⁄291) interposto pelo ESTADO DO PARANÁ, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, contra acórdãos prolatados pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim sumariados:

- da apelação (fls. 249⁄250):

"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NO ESTADO DO PARANÁ. TERRAS LOCALIZADAS EM ZONA DE FRONTEIRA DE 66 KM. ALIENAÇÃO PELO ESTADO DO PARANÁ. VALIDADE QUESTIONADA. POSSIBILIDADE DE EXAME E DECRETAÇÃO DA NULIDADE DO TÍTULO DO EXPROPRIADO. INOCORRÊNCIA DE SENTENÇA EXTRA PETITA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARANÁ COMO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INTERESSE DE AGIR DO INCRA. OCORRÊNCIA. NULIDADE DO TÍTULO DOMINIAL DO EXPROPRIADO. PATRIMÔNIO PÚBLICO DA UNIÃO. EXCLUSÃO DE INDENIZAÇÃO.

1. Tratando-se de uma ação atípica de desapropriação, que visa à regularização fundiária de uma região marcada por conflitos ocasionados justamente por uma série de alienações a non domino realizadas pelo Estado do Paraná a terceiros, a análise da validade do título dominial do expropriado mostra-se essencial ao cumprimento de tal finalidade.
2. A impossibilidade de análise da validade de tais títulos, respeitado o contraditório e a ampla defesa, representaria desprestígio ao princípio da instrumentalidade e da efetividade da jurisdição, uma vez que a discussão quanto ao domínio teria que ser levada a outras vias processuais com a única finalidade de enfrentar a legitimidade do título ora impugnado.


3. O expropriante, ainda que tenha depositado o preço para fins de preenchimento dos requisitos da ação, impugnou, desde a inicial, a validade do título de domínio da expropriada, não devendo o julgado dela eximir-se, em decisão de mérito, considerando a atipicidade da presente ação expropriatória.
4. Dizendo a ação respeito a terras devolutas, cuja transferência decorreu de ato do Estado do Paraná, a decisão que julgar a validade dessa transferência afetará a esfera jurídica do cedente, pelo que não há como apreciar a questão do domínio sem que o Estado do Paraná integre a lide, na qualidade de litisconsorte passivo necessário.



5. Tendo em conta ser esta ação o meio mais célere para pôr fim às violentas disputas fundiárias da região, não há que falar em ausência de interesse processual do INCRA, a quem competirá a titulação dos imóveis em nome de quem efetivamente os explore.


6. Não havendo dúvida quanto à origem da cadeia dominial das terras, que se deu a partir de concessão a non domino realizada pelo Estado do Paraná, não há como concluir pela legitimidade do título dominial do expropriado, uma vez que o imóvel expropriando integrava o patrimônio da União.


7. A mera possibilidade de ratificação dos títulos concedidos não é suficiente, por si só, para convalidar ato originariamente viciado se não são atendidos os requisitos exigidos.


8. Nulo o título originário da cadeia dominial, não há, evidentemente, que se falar em pagamento de indenização ao dito expropriado, restando prejudicadas as questões atinentes ao preço justo.


9. Apelos improvidos."

- dos embargos de declaração (fl. 263):

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO.

- Não há omissão quando apreciado todo o objeto da lide, sendo os argumentos expendidos no acórdão suficientes para o prequestionamento da matéria."

Cuidam os autos de ação de desapropriação ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA em desfavor de BENEDITO SEBASTIÃO ALVES e OUTROS com o intuito de regularização fundiária de terras situadas na Colônia Guairacá, no Estado do Paraná, diante de distúrbios existentes à época quanto à sua posse e propriedade, tendo o INCRA sido imitido na posse em 16⁄03⁄1976.

Citado, o ESTADO DO PARANÁ sustentou preliminarmente ilegitimidade passiva e, no mérito, que eventual decretação de nulidade dos títulos e, conseqüentemente, o cancelamento dos registros imobiliários da cadeia sucessória seriam decorrentes do descumprimento dos titulares das condições para obter sua ratificação, nos termos da Lei nº 9.871⁄99.

O Juízo monocrático prolatou sentença (fls. 139⁄163), afastando as preliminares, bem como a existência de conflito a ser dirimido pelo STF, para julgar procedente o pedido a fim de consolidar a propriedade do INCRA sobre a área desapropriada, reputando nulos de pleno direito os títulos de propriedade dos expropriados, não sendo devida qualquer indenização. Outrossim, determinou a expedição de ofício ao INCRA, autorizando o levantamento e⁄ou cancelamento de todos os TDAs depositados em favor dos expropriados.

Os expropriados interpuseram apelação (fls. 164⁄180) requerendo a reforma do decisum por entender que não deve ser afastada a aplicação do art. 148 do CC⁄1916, preservando o direito de receberem indenização. Outrossim, como são adquirentes de boa-fé, estranhos à relação jurídica estabelecida entre a União Federal e o Estado do Paraná, quando da distribuição irregular das terras devolutas, tanto o expropriado quanto seus sucessores devem ser considerados terceiros de boa-fé.

O Estado do Paraná manejou a mesma espécie recursal (fls. 183⁄201) pugnando pela declaração de nulidade da sentença ou pela sua reforma, consoante as seguintes razões:

(a) julgamento extra petita, pois discutiu-se a validade da titularidade da área expropriada e o preço pago pelo apelante há mais de 5 décadas, o que não é objeto da contenda;

(b) ressaltou que a lide tem como escopo:

(b.1.) conversão do depósito inicial em pagamento de preço;

(b.2.) expedição de mandado de imissão na posse do imóvel e de mandado de registro de domínio do imóvel em nome do expropriante;


(c) ilegitimidade passiva por não ser titular do domínio das áreas expropriadas; (


d) ausência de interesse processual por não ser proprietário, tampouco expropriado;


(e) se a União, por meio da Lei nº 9.871⁄99, permite a ratificação de atos de alienação originariamente non domino, é certo que legitimou-se, por força da referida legislação, a transformação de ato nulo em anulável. Dessa forma, a eventual decretação da nulidade dos títulos através de ação própria não poderá ter como fundamento a simples constatação de que as terras tituladas situavam-se na faixa de fronteira, haja vista que o ato do Estado foi legitimado por tal legislação.

O TRF⁄4ª Região proferiu acórdão negando provimento às apelações, enumerando na ementa as principais razões desse entendimento.

Opostos embargos de declaração (fls. 253⁄255), que restaram rejeitados (fl. 263) em razão de ausência de omissão a ser sanada e por entender que os dispositivos tidos como violados já haviam sido suficientemente analisados no aresto embargado.

Insistindo pela via especial, o Estado do Paraná requer a reforma dos arestos objurgados a fim de que seja declarada a nulidade do acórdão que apreciou os embargos de declaração, determinando-se o retorno dos autos ao TRF⁄4ª Região para o saneamento das omissões apontadas. Em caso de negativa desse pleito, que seja cassado o acórdão recorrido, reconhecendo-se:


(a) sua ilegitimidade passiva;


(b) a invalidade do provimento extra petita de nulidade do título translativo em feito de desapropriação;


(c) ausência de interesse de agir do ente estatal;


(d) que deve ser afastada a nulidade dos títulos de propriedade dos expropriados em razão do permissivo criado pela Lei nº 9.871⁄99, que possibilita a ratificação de atos de alienação originariamente non domino, o que legitima, por força da referida legislação, a transformação de ato nulo em anulável. Dessa forma, a eventual decretação da nulidade dos títulos através de ação própria, não poderá ter como fundamento a simples constatação de que as terras tituladas situavam-se na faixa de fronteira, haja vista que o ato do Estado foi legitimado por tal legislação.

Alega-se violação dos seguintes dispositivos legais:

do Código de Processo Civil: Art. 3º: "Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade."

Art. 47: "Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo."

Art. 128: "O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte."

Art. 264: "Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei.
Parágrafo único. A alteração do pedido ou da causa de pedir em nenhuma hipótese será permitida após o saneamento do processo."

Art. 267, VI: "Extingue-se o processo, sem julgamento do mérito: Vl - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual."

Art. 460: "É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado.

Parágrafo único. A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional".

Art. 535, II: "Cabem embargos de declaração quando: II - for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal."

- da Lei nº 9.871⁄99:

Art. 1º: "Fica estabelecido o prazo de dois anos, contado de 1o de janeiro de 1999, para que detentor de título de alienação ou concessão de terras feitas pelos Estados na faixa de fronteira de até cento e cinqüenta quilômetros, ainda não ratificado, requeira ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Incra, a ratificação de que trata o art. 5o, § 1o, da Lei no 4.947, de 6 de abril de 1966, observado o disposto no Decreto-Lei no 1.414, de 18 de agosto de 1975.
§ 1o Decorrido o prazo estabelecido no caput, sem que tenha sido requerida a ratificação autorizada à União, ou não sendo esta possível, por desatendimento às disposições do


Decreto-Lei no 1.414, de 1975, o Incra deverá:

I - declarar nulo o título de alienação ou concessão, em ato motivado, no qual demonstrada a nulidade originária do título e a impossibilidade da ratificação;

II - dar ciência da decisão ao interessado e publicá-la no Diário Oficial da União;


III - promover o cancelamento dos correspondentes registros, na forma do disposto na Lei no 6.739, de 5 de dezembro de 1979, procedendo-se em relação a eventuais ocupantes do imóvel conforme o previsto na parte final do art. 6o do referido Decreto-Lei;

IV - requerer o registro do imóvel em nome da União no competente Registro de Imóveis.

§ 2o O prazo estabelecido neste artigo não impede que o Incra, durante a sua fluência, com a finalidade de solucionar grave conflito social, promova, de ofício, vistoria objetivando verificar se o imóvel rural alcançado pelo caput preenche todos os requisitos necessários à ratificação do respectivo título de propriedade.

§ 3o Reunindo o imóvel, objeto da vistoria de que trata o § 2o, as condições para ser ratificado, o Incra expedirá o competente título de ratificação ou, caso contrário, procederá na forma prevista no § 1o."

Art. 2º: "Sempre que o imóvel abrangido por título de que trata o art. 1o for objeto de ação de desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, o Incra, de imediato, impugnará o domínio do imóvel.

§ 1o Na hipótese prevista no caput, o preço do imóvel, depositado em juízo, ficará retido até a decisão final sobre a propriedade da área.

§ 2o O disposto neste artigo aplica-se às ações judiciais em andamento."

Art. 3º: "Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaía sobre imóvel rural, objeto de registro, no registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1º - Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado."

- da LC nº 76⁄93:

Art. 6º: "O juiz, ao despachar a petição inicial, de plano ou no prazo máximo de quarenta e oito horas:

I - mandará imitir o autor na posse do imóvel;

II - determinará a citação do expropriando para contestar o pedido e indicar assistente técnico, se quiser;

III - expedirá mandado ordenando a averbação do ajuizamento da ação no registro do imóvel expropriando, para conhecimento de terceiros.

§ 1º Efetuado o depósito do valor correspondente ao preço oferecido, o juiz mandará, no prazo de quarenta e oito horas, imitir o autor na posse do imóvel expropriando. (Revogado pela LCP 88, de 23⁄12⁄96)

§ 1º Inexistindo dúvida acerca do domínio, ou de algum direito real sobre o bem, ou sobre os direitos dos titulares do domínio útil, e do domínio direto, em caso de enfiteuse ou aforamento, ou, ainda, inexistindo divisão, hipótese em que o valor da indenização ficará depositado à disposição do juízo enquanto os interessados não resolverem seus conflitos em ações próprias, poderá o expropriando requerer o levantamento de oitenta por cento da indenização depositada, quitado os tributos e publicados os editais, para conhecimento de terceiros, a expensas do expropriante, duas vezes na imprensa local e uma na oficial, decorrido o prazo de trinta dias. (Renumerado pela LCP 88, de 23⁄12⁄96)".

- do Decreto-Lei nº 3.365⁄41:

Art. 20: "A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou Impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta."

Art. 34: "O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.
Parágrafo único. Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o preço ficará em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para disputá-lo."

Aponta divergência jurisprudencial em relação ao AG 200201000133153⁄MT, TRF⁄1ª Região, 3ª Turma, Rel. Des. Plauto Ribeiro, DJ de 24⁄09⁄2004, litteris:

"CIVIL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ALIENAÇÃO DE TERRAS DEVOLUTAS. ESTADO MEMBRO. DESAPROPRIAÇÃO. SENTENÇA DEFINITIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANULAÇÃO DE VENDA DE TERRAS DEVOLUTAS.

1. Tendo o Estado Federado, dentro da sua competência constitucional e legal, como titular do domínio das terras devolutas (art. 64 – CF⁄1891), alienado o imóvel à parte, segundo os cânones civis de aquisição da propriedade imobiliária (título aquisitivo + modo de aquisição), essa realidade cartorária, ornada pela presunção de veracidade e, de resto, qualificada por longos anos de duração, não pode ser unilateralmente considerada como nula e sem efeito jurídico pelo INCRA, senão mediante amplo contraditório, através da propositura da competente ação anulatória.

2. A ação civil pública, destinada à composição de danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, a interesse difuso ou coletivo, por infração da ordem econômica e da economia popular, e à ordem urbanística (Lei nº 7.347⁄85), não tem serventia para buscar a anulação de venda de terras devolutas por Estado-membro, posteriormente desapropriadas e com sentença passada em julgado, até mesmo porque não é sucedâneo serôdio da ação rescisória não proposta no biênio legal.

3. Transitada em julgado a sentença da ação de desapropriação (há mais de dez anos), depois do manejo de todos os recursos possíveis pelo expropriante, não se justifica a suspensão do pagamento do precatório à conta da alegação de que o imóvel expropriado, em tempos idos, fora vendido irregularmente por Estado Federado ao desapropriado.

4. Provimento do agravo de instrumento."

O INCRA apresentou contra-razões (fls. 311⁄321) pugnando pela negativa de provimento do recurso especial, esposando os seguintes argumentos: (a) os dispositivos tidos como violados não foram devidamente prequestionados; (b) incidência da Súmula nº 7⁄STJ, pois objetiva-se o reexame do conteúdo fático-probatório; (c) descabimento da preliminar de julgamento extra petita.

Instado a manifestar-se, o MPF ofertou parecer (fls. 329⁄336) opinando preliminarmente pelo não-conhecimento do recurso por: (a) incidência da Súmula 7⁄STJ; (b) ausência de prequestionamento dos seguintes dispositivos legais: 264, caput, do CPC; 1º, §§ 1º a 3º; 4º; da Lei nº 9.871⁄99; 20 do DL nº 3.365⁄41 e 6º, § 1º, da LC nº 76⁄93; (c) interpretação razoável dos arts. 460 e 535, II, do CPC e 34, parágrafo único, DL nº 3.365⁄41. No mérito, entende que deve ser negado provimento ao recurso fundado na alínea "a". Não apresentou manifestação quanto à admissão pela alínea "c".

É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 826.048 - PR (2006⁄0049453-8)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NO ESTADO DO PARANÁ. ÁREA EM ZONA DE FRONTEIRA DENOMINADA COLÔNIA GUAIRACÁ. ALIENAÇÃO PELO ESTADO. DECRETAÇÃO DE NULIDADE DO TÍTULO DO EXPROPRIADO PELA SENTENÇA. ILEGITIMIDADE DO ESTADO PARA FIGURAR NA LIDE. AUSÊNCIA DE INFRINGÊNCIA DO ART. 535 DO CPC. NÃO-PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 282⁄STF E 211⁄STJ.

1. Cuidam os autos de ação de desapropriação ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA em desfavor de BENEDITO SEBASTIÃO ALVES e OUTROS com o intuito de regularização fundiária de terras situadas na Colônia Guairacá, no Estado do Paraná, diante de distúrbios existentes à época quanto à sua posse e propriedade, tendo o INCRA sido emitido na posse em 16⁄03⁄1976.

Sentença afastou as preliminares, bem como a existência de conflito a ser dirimido pelo STF, para julgar procedente o pedido a fim de consolidar a propriedade do INCRA sobre a área desapropriada, reputando nulos de pleno direito os títulos de propriedade dos expropriados, não sendo devida qualquer indenização. Outrossim, determinou a expedição de ofício ao INCRA autorizando o levantamento e⁄ou cancelamento de todos os TDAs depositados em favor dos expropriados.

Apelações dos desapropriados e do Estado do Paraná, às quais o TRF⁄4ª Região negou provimento sob os seguintes fundamentos: a) é possível a análise da validade do título dominial do expropriado; b) não há como apreciar a questão do domínio sem que o Estado do Paraná integre a lide, na qualidade de litisconsorte passivo necessário; c) ilegitimidade do título dominial do expropriado, uma vez que o imóvel expropriando integrava o patrimônio da União; d) nulo o título originário da cadeia dominial, não há que se falar em pagamento de indenização restando prejudicadas as questões atinentes ao preço justo.

Recurso especial do Estado do Paraná requerendo: a) a declaração de nulidade do acórdão que apreciou os embargos de declaração, determinando-se o retorno dos autos ao TRF⁄4ª Região para o saneamento das omissões apontadas; b) em caso de negativa desse pleito, seja cassado o acórdão recorrido, reconhecendo-se: (a) sua ilegitimidade passiva; ou (b) a invalidade do provimento extra petita de nulidade do título translativo em feito de desapropriação; (c) ausência de interesse de agir do ente estatal; (d) que deve ser afastada a nulidade dos títulos de propriedade dos expropriados em razão do permissivo criado pela Lei nº 9.871⁄99, pois esta possibilita a ratificação de atos de alienação originariamente non domino, o que legitima, por força da referida legislação, a transformação de ato nulo em anulável. Aponta-se negativa de vigência dos seguintes preceitos: arts. 3º, 47, 128, 264, 267, VI, 460 e 535, II, do CPC; arts. 1º, 2º e 3º, § 1º, da Lei nº 9.871⁄99; art. 6º da LC nº 76⁄93; arts. 20 e 34 do Decreto-Lei nº 3.365⁄41. Contra-razões argumentando: (a) os dispositivos tidos como violados não foram prequestionados; (b) incidência da Súmula nº 7⁄STJ; (c) descabimento da preliminar de julgamento extra petita. Parecer do MPF opinando pelo não-conhecimento do apelo e, no mérito, pelo não-provimento.

2. Ausência de prequestionamento dos arts. 267, VI, CPC, 6º da LC 76⁄93 e 20 do Decreto-Lei nº 3.365⁄41. Incidência das Súmulas 282⁄STF e 211⁄STJ.

3. Não-configuração de violação do art. 535, II, do CPC, porquanto todas as questões pertinentes ao desate da lide foram devidamente examinadas pela Corte a quo, sendo certo que o Julgador não está obrigado a responder todos os questionamentos das partes quando houver encontrado fundamentação suficiente para julgar a controvérsia.

4. O acórdão recorrido emitiu o pronunciamento de que o Estado do Paraná é parte legítima para integrar a lide, pois a ação diz respeito a terras devolutas, cuja transferência decorreu de ato por ele praticado. Assim, a decisão que julgasse a validade dessa transferência afetaria a esfera jurídica do cedente, não havendo como apreciar a questão do domínio sem que esse ente público integrasse a lide na qualidade de litisconsorte passivo necessário.

5. Em que pese o saber jurídico exposto no voto condutor do aresto de segundo grau, entendo que a melhor exegese a ser aplicada ao caso concreto é a de que o Estado do Paraná não possui legitimidade para figurar no pólo passivo da presente ação de desapropriação, tendo em vista que não responderá pela indenização da posse, tampouco será atingido pelo ato expropriatório. Ainda que se pudesse admitir eventual discussão acerca do domínio nesta espécie de ação, não haveria guarida para a permanência do ente federativo na lide, pois não é titular de qualquer direito discutido nos autos.

6. Fica prejudicada a análise dos demais preceitos normativos invocados como malferidos no recurso especial em face do acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva do recorrente. Igualmente, no que diz respeito à alínea "c", pois a divergência pretoriana sustenta-se na necessidade do manejo de ação específica para a anulação de título translativo de propriedade.

7. Recurso especial parcialmente conhecido e provido.

VOTO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): O pleito merece parcial conhecimento pela alínea "a".

Verifica-se que não foram prequestionados os seguintes dispositivos legais: arts. 267, VI, CPC, 6º da LC 76⁄93 e 20 do Decreto-Lei nº 3.365⁄41. Incidência das Súmula 282⁄STF e 211⁄STJ.

Não visualizo a alegada violação do art. 535, II, do CPC, porquanto todas as questões pertinentes ao desate da lide foram devidamente examinadas pela Corte a quo, sendo certo que o Julgador não está obrigado a responder todos os questionamentos da parte quando houver encontrado fundamentação suficiente para julgar a controvérsia.

O importante é que o Colegiado não se furtou ao exame dos pontos essenciais postos à sua apreciação, oferecendo prestação jurisdicional suficiente e fundamentada.

Nesses moldes, é de ser negado provimento ao presente apelo pela indicação de afronta ao disposto no art. 535 do CPC.

Observo, de início, que há prequestionamento da matéria relativa à ilegitimidade passiva do Estado do Paraná, motivo que autoriza o conhecimento e o enfrentamento da controvérsia.

O acórdão vergastado assim se pronunciou a respeito (fls. 237⁄238):

"Da ilegitimidade passiva do Estado do Paraná

Da mesma forma, dizendo a ação respeito a terras devolutas, cuja transferência decorreu de ato de responsabilidade do Estado do Paraná, inequivocamente a decisão afetará a esfera jurídica do cedente, pelo que não há como acolher a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam.

Ademais disso, a condição de litisconsorte passivo necessário do Estado do Paraná decorre do artigo 3º, caput e § 1º da Lei nº 9.871, de 23 de novembro de 1999, que assim dispõe:

"Art. 3º. Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaía sobre imóvel rural, objeto de registro, no registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1º - Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado."

Observe-se que foi proferido voto vencido na Corte Regional, que se manifestou pela ilegitimidade do Estado do Paraná.

Arrazoada se apresenta a postulação do recorrente nesse aspecto. Confira-se (fls. 277⁄278):

"A Preliminar de Ilegitimidade Passiva:

Ofensa aos artigos 3º, 47 e 267, VI DO CPC, e art. 3º, § 1º da Lei nº 9.871⁄99
No tocante à ilegitimidade passiva do Estado do acórdão recorrido assinala que:

... tendo em conta que a solução do caso não se encontra adstrita ao escopo de uma ação de desapropriação típica (imissão na posse e definição do justo preço), entendo adequada e necessária a sua integração à lide, nos termos do art. 3º e § 1º da Lei 9.871⁄99. Soma-se a esses fundamentos o disposto no art. 47, caput do CPC, de acordo com o qual o Estado do Paraná também estará sob a égide dos efeitos da sentença em relação à decisão quanto à alegação de invalidade do título dominial portado pelo expropriado."

Como se vê, o exceto supra destacado demonstra que a questão da legitimidade passiva do ora Recorrente está diretamente atrelada à possibilidade de decretação de nulidade do título de domínio do imóvel expropriado, no âmbito da ação de desapropriação. Assim, o acolhimento das razões aduzidas no item antecedente conduz, inexoravelmente, à exclusão do Estado do Paraná do pólo passivo desta demanda expropriatória.

Ainda, oportuno salientar que a citação de que trata o artigo 3º, § 1º da Lei 9.871⁄99 tem lugar nas ações de desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária e objetiva, UNICAMENTE, oportunizar ao Estado a manifestação acerca de eventual interesse na área expropriada, opondo-se, nesse caso, ao domínio daquele em nome de quem o imóvel encontra-se registrado.

Tanto isso é verdade que, ad argumentandum, os §§ 2º e 3º do mesmo artigo estabelecem que, havendo tal sorte de oposição por parte do ente estatal:

a) "o preço do imóvel, depositado em juízo, ficará retido até a decisão final sobre a propriedade da área" (§ 2º);

b) "caso venha a ser reconhecido o domínio do Estado sobre a área, fica a União previamente autorizada a desapropriar o imóvel rural de domínio do Estado, prosseguindo a ação de desapropriação em relação a este" (§ 3º)

Constata-se, pois, que a hipótese contemplada no dispositivo supra é da mesma natureza da situação tratada no artigo 34 do Decreto-lei 3.365⁄41, qual seja, o procedimento a ser adotado na ação de desapropriação quando houver dúvida quanto a quem deva receber a indenização - o particular, em nome de quem encontra-se registrado o imóvel expropriado, ou o Estado, em cujo território esteja localizado este bem.

Claramente, o referido artigo 3º e seus parágrafos referem-se à discussão do domínio entre os virtuais expropriados e não entre expropriante e expropriado(s). No caso dos autos, entretanto, o ente estatal, citado, manifestou o seu desinteresse na área objeto de desapropriação e, por isso, não faz qualquer sentido a sua manutenção na lide.

Ademais, não remanescem dúvidas de que as referidas disposições normativas admitem a oposição do Estado ao domínio do expropriado APENAS para efeito de impedir o levantamento do preço, devendo o mérito dessa questão ser discutido em ação própria.

Em conseqüência, revela-se de todo IMPERTINENTE a invocação feita pelo acórdão recorrido ao artigo 47 caput do CPC, já que, em vista das relatadas peculiaridades do caso vertente, a sentença a ser proferida nestes autos não pode produz quaisquer efeitos na esfera jurídica do Estado do Paraná.

Dessa forma, não é o Estado do Paraná legitimado passivamente para o feito, pois na desapropriação não responderá pela indenização da posse e tampouco é ele atingido pelo ato desapropriatório.

Não é o Estado membro, pois, parte legítima para o feito.

Eventual discussão de validade dos títulos de propriedade concedidos pelo Estado do Paraná, como se verá no próximo item, deve dar-se em ação específica, onde somente então estará legitimado o Estado.

Dessa forma, preliminarmente, se requer o reconhecimento da ilegitimidade passiva do Estado do Paraná nessa lide desapropriatória."

A desapropriação constitui uma forma originária de aquisição da propriedade. A obrigação do expropriante, visto que já imitido na posse, consiste em depositar o valor da indenização, e deixar que as partes interessadas, sendo o caso, discutam a titularidade do bem nas vias próprias.

A ação de desapropriação deve ser endereçada contra quem tem título de propriedade registrado no Ofício Imobiliário.

A postulação do INCRA, no início da lide, reconheceu nos expropriados os verdadeiros titulares dos bens objeto da ação.

O acórdão recorrido emitiu pronunciamento de que o Estado do Paraná é parte legítima para integrar a lide, pois a ação diz respeito a terras devolutas, cuja transferência decorreu de ato por ele praticado. Assim, a decisão que julgasse a validade dessa transferência afetaria a esfera jurídica do cedente, não havendo como apreciar a questão do domínio sem que esse ente público integrasse a lide na qualidade de litisconsorte passivo necessário.

Em que pese o saber jurídico exposto no voto condutor do aresto de segundo grau, entendo que a melhor exegese a ser aplicada ao caso concreto é a de que o Estado do Paraná não possui legitimidade para figurar no pólo passivo de ação de desapropriação, tendo em vista que não responderá pela indenização da posse, tampouco será atingido pelo ato expropriatório.

Ainda que se pudesse admitir eventual discussão acerca do domínio em sede de ação desapropriatória, não haveria guarida para a permanência do ente federativo na lide, pois não é titular de qualquer direito discutido nos autos.

Fica prejudicada a análise dos demais preceitos normativos invocados como malferidos no recurso especial em face do acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva do recorrente. Igualmente, no que diz respeito à alínea "c", cuja divergência pretoriana apontada diz respeito à necessidade do manejo de ação específica para a anulação de título translativo de propriedade.

Assim exposto, conheço parcialmente e, nesta parte, DOU PROVIMENTO ao presente recurso especial.

É o voto.


CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA
Número Registro: 2006⁄0049453-8 REsp 826048 ⁄ PR

Números Origem: 200204010465063 9810142471

PAUTA: 08⁄08⁄2006 JULGADO: 17⁄08⁄2006

Relator
Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DELGADO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOÃO FRANCISCO SOBRINHO

Secretária
Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : CÉSAR AUGUSTO BINDER E OUTROS
RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTROS
INTERES. : BENEDITO SEBASTIÃO ALVES E OUTROS
ADVOGADO : LUIZ ROBERTO ROMANO

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Interesse Social (Lei nº 4.132⁄62)

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso especial e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Teori Albino Zavascki e Denise Arruda votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Luiz Fux.


Brasília, 17 de agosto de 2006



MARIA DO SOCORRO MELO
Secretária

Documento: 641841 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 11/09/2006

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

DESAPROPRIAÇÕES PARANÁ: Não se discute questão de domínio em ação de desapropriação



Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudência


"...não se admite discussão, em sede de ação desapropriatória, em torno do domínio, sendo necessária a utilização de ação específica para anulação de título translativo de propriedade..."


EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 753.096 - PR (2005⁄0085181-5)

RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON
EMBARGANTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTRO(S)
EMBARGADO : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : FLÁVIO LUIZ FONSECA NUNES RIBEIRO E OUTRO(S)
INTERES. : DORVALINO LOURENA DOS SANTOS
ADVOGADO : SILVIA HELENICE WAGNER DE SOUZA
EMENTA

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE – EFEITO INFRINGENTE – DISCUSSÃO DE MATÉRIA A SER EXAMINADA PELO TRIBUNAL A QUO – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

1. Inexistentes quaisquer das hipóteses do art. 535 do CPC, não merecem acolhida os embargos de declaração opostos com nítido caráter infringente.

2. Não constitui omissão a falta de pronunciamento acerca de matéria cujo exame compete à instância ordinária, sob pena de supressão de instância.

3. Embargos de declaração rejeitados.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 06 de novembro de 2007 (Data do Julgamento)


MINISTRA ELIANA CALMON
Relatora


EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 753.096 - PR (2005⁄0085181-5)

EMBARGANTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTRO(S)
EMBARGADO : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : FLÁVIO LUIZ FONSECA NUNES RIBEIRO E OUTRO(S)
INTERES. : DORVALINO LOURENA DOS SANTOS
ADVOGADO : SILVIA HELENICE WAGNER DE SOUZA

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de embargos de declaração opostos em face de acórdão assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL – ÁREA SITUADA NA FAIXA DE FRONTEIRA – DECRETAÇÃO DE NULIDADE DO TÍTULO DO EXPROPRIADO, OUTORGADO PELO ESTADO DO PARANÁ – VIOLAÇÃO AO ART. 34 DO DECRETO-LEI 3.365⁄41 – JULGAMENTO EXTRA PETITA – SÚMULA 7⁄STJ – PREJUDICADA A ANÁLISE DE OFENSA À LEI 9.871⁄99 E AO DECRETO-LEI 1.414⁄75.

1. Questão relativa ao julgamento extra petita que esbarra no óbice da Súmula 7⁄STJ, uma vez que questiona o recorrente as premissas fáticas abstraídas pelo acórdão recorrido.

2. Segundo a jurisprudência firmada nesta Corte, não se admite discussão, em sede de ação desapropriatória, em torno do domínio, sendo necessária a utilização de ação específica para anulação de título translativo de propriedade. Prejudicada a análise de ofensa a dispositivos da Lei 9.871⁄99 e do Decreto-lei 1.414⁄75.

3. Recurso especial provido em parte.
(fl. 267)

O embargante aponta omissão, obscuridade e contradição, dizendo que se omitiu o acórdão em apreciar as especificidades da situação fática deduzida na lide, contrariando o quanto ressalvado pelo decisum do TRF da 4ª Região.

Sustenta também que o julgado, ao fazer incidir o art. 34 do DL 3.365⁄41, olvidou-se do reconhecimento da nulidade do título como questão prejudicial ao exame da própria desapropriação, mormente no presente caso, no qual o domínio é impugnado desde a inicial. Diz que a aplicação do referido dispositivo pressupõe dúvida posterior, não a que se insere como fundamento da ação.

Refere ainda que não houve atenção aos princípios do contraditório, da instrumentalidade das formas e da efetividade jurisdicional (art. 5º, LV e LXXVIII, da CF⁄88).

Argumenta que uma vez reconhecida a praticidade da solução adotada pela Corte a quo, não se pode, sob argumento de se encontrar óbice processual, desconstituí-la.

Por fim, indica omissão na medida em que não se afastou o pagamento de qualquer indenização enquanto pendente a dúvida dominial.

É o relatório.

EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 753.096 - PR (2005⁄0085181-5)

RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON
EMBARGANTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTRO(S)
EMBARGADO : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : FLÁVIO LUIZ FONSECA NUNES RIBEIRO E OUTRO(S)
INTERES. : DORVALINO LOURENA DOS SANTOS
ADVOGADO : SILVIA HELENICE WAGNER DE SOUZA

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): Não se vislumbra quaisquer das hipóteses do art. 535 do CPC, ficando patente a busca do efeito infringente por quem não se conformou com o resultado do julgamento.

Relativamente ao último ponto do recurso, ressalto que a questão do depósito deve ser resolvida não pelo STJ nessa oportunidade, mas pela instância ordinária, sob pena de se perpetrar supressão de instância. Não à toa é que, no acórdão embargado, determinou-se o retorno dos autos para reapreciação do mérito da demanda.

Com essas considerações, rejeito os embargos de declaração.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
EDcl no
Número Registro: 2005⁄0085181-5 REsp 753096 ⁄ PR

Número Origem: 199970020038973

PAUTA: 06⁄11⁄2007 JULGADO: 06⁄11⁄2007

Relatora
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS

Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : FLÁVIO LUIZ FONSECA NUNES RIBEIRO E OUTRO(S)
RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTRO(S)
INTERES. : DORVALINO LOURENA DOS SANTOS
ADVOGADO : SILVIA HELENICE WAGNER DE SOUZA

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Interesse Social (Lei nº 4.132⁄62)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

EMBARGANTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : LÚCIA HELENA BERTASO GOLDANI E OUTRO(S)
EMBARGADO : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : FLÁVIO LUIZ FONSECA NUNES RIBEIRO E OUTRO(S)
INTERES. : DORVALINO LOURENA DOS SANTOS
ADVOGADO : SILVIA HELENICE WAGNER DE SOUZA

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."

Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília, 06 de novembro de 2007



VALÉRIA ALVIM DUSI
Secretária

Documento: 734650 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 20/11/2007

terça-feira, 8 de setembro de 2009

STJ - Anula Indenização por Desapropriação de Terras da União na Fronteira oeste do Paraná


Extraído de: Superior Tribunal de Justiça - 08 de Agosto de 2009
Processos Relacionados : REsp 867016


FONTE: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL Nº 867.016

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou a ação que condenou a União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em indenização por desapropriar terras na fronteira oeste do Paraná. O título de propriedade havia sido conferido pelo estado do Paraná na década de 50, e o Incra realizou a desapropriação na década de 70, a fim de evitar o seguimento de conflitos violentos na região. Mas o STJ reconheceu que a União não poderia desapropriar seus próprios bens, anulando a indenização.

O caso tem origem na década de 50


Os títulos foram concedidos informa a sentença original não aos que já ocupavam as terras, mas a pessoas chegadas ao poder, laranjas e fantasmas que ficaram conhecidos como lavradores do asfalto.


No caso analisado, os expropriados obtiveram na ação original o pagamento da indenização. Após negativa a recurso do Incra, ficou determinado que fossem sacados os depósitos até então em juízo referentes à indenização e afastada a dúvida sobre a propriedade das terras. Essa decisão transitou em julgado isto é, tornou-se irrecorrível em 1999. No entanto, o Incra e a União entenderam que a decisão violava disposição literal da lei, ofendia a coisa julgada e fundava-se em erro de fato, o que autorizava a ação rescisória. A ação foi desprovida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e recurso especial da União e do Incra contra essa decisão levou o caso ao STJ.



EIS A ÍNTEGRA DA DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.


Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudênci
a

RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : UNIÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDEBRANDO FREITAS CAYRES
ADVOGADO : ADILSON AMARO ALVES
EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V, CPC. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP 476.665⁄SP). AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DE TERCEIRO. ART. 287, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA VIA ELEITA. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. O Recurso Especial interposto contra acórdão proferido em sede de ação rescisória pode veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei


2. A Corte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, decidiu que:"(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - RESP 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20.06.2005). Precedentes jurisprudenciais do STJ: AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006 e RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006.


3. A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstituí-lo.


4. Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


5. A doutrina especializada, ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado", deixa assente que o interesse deste, ensejador da legitimação para propositura da rescisória, não pode ser meramente de fato, vez que, por opção legislativa os interesses meramente econômicos ou morais de terceiros não são resguardados pela norma inserta no art. 487 do CPC. É o que se infere, por exemplo, da lição de Alexandre Freitas Câmara, in verbis:

"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.


Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (in "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)


6. In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.


7. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


8. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


9. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

"Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.

É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).

Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).


10. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


11. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


12. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


13. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis:
CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


14. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


15. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


16. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


17. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis:

"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)

Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


18. No mesmo sentido:
"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.
- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.
- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)

TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.

I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.

II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.

III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)


19. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


20. Precedentes: REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ. 25.08.2008; REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ. 20.08.2008; REsp 933.901⁄PR, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, DJ. 25.06.2008; REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ. 19.06.2008.


21. O pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada - proferido o voto do Ministro Relator, após a sustentação oral dos procuradores de ambas as partes - afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., desta relatoria, DJ 27.09.2004.


22. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


23. A ofensa a princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.


24. Recursos especiais parcialmente conhecidos e providos.

ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, por unanimidade, conhecer parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, dar-lhes provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki (voto-vista), Denise Arruda, Benedito Gonçalves e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 05 de maio de 2009(Data do Julgamento)


MINISTRO LUIZ FUX
Relator


ERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA
Número Registro: 2006⁄0148815-9 REsp 867016 ⁄ PR


Números Origem: 200104010247870 9704437366

PAUTA: 04⁄11⁄2008 JULGADO: 04⁄11⁄2008

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX

Presidente da Sessão
Exma. Sra. Ministra DENISE ARRUDA

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA

Secretária
Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : UNIÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDEBRANDO FREITAS CAYRES
ADVOGADO : ADILSON AMARO ALVES

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Fins de Reforma Agrária

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr. ADILSON AMARO ALVES, pela parte RECORRIDA: HILDEBRANDO FREITAS CAYRES.

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Após o voto do Sr. Ministro Relator conhecendo parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, dando-lhes provimento, pediu vista o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki. Aguardam os Srs. Ministros Denise Arruda, Benedito Gonçalves e Francisco Falcão.

Brasília, 04 de novembro de 2008



MARIA DO SOCORRO MELO
Secretária

RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)

VOTO-VISTA
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO. GLEBA SITUADA EM FAIXA DE FRONTEIRA E PARQUE NACIONAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO ART. 555 DO CPC. PEDIDO DE VISTA DOS AUTOS. DESNECESSIDADE DE REINCLUSÃO DO PROCESSO EM PAUTA DE JULGAMENTO. PRECEDENTES. LEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO. RECONHECIMENTO. INDENIZAÇÃO DOS EXPROPRIADOS. INVIABILIDADE, NA HIPÓTESE. PRECEDENTES. RECURSOS ESPECIAIS PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA PARTE, PROVIDOS, ACOMPANHANDO O RELATOR.

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

1.Trazem os autos dois recursos especiais interpostos em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que, em preliminar, julgou pela ilegitimidade ativa da União e, no mérito, julgou improcedente a ação rescisória. O acórdão recorrido foi assim ementado:
"ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. QUESTÃO DE ORDEM APRESENTADA PELO MPF. REJEIÇÃO DE AMBOS OS FUNDAMENTOS. AÇÃO RESCISÓRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO FEDERAL. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. OFENSA À COISA JULGADA. ERRO DE FATO. INOCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO. CUSTAS E HONORÁRIOS.

I. Rejeitada questão de ordem apresentada pelo Ministério Público Federal, tanto quanto à alegação de que não teria sido examinada, pelo Relator, a preliminar de ilegitimidade da União, quanto em relação ao segundo fundamento, no sentido de reincluisão dos autos em pauta.

II. Reconhecida a ilegitimidade ativa da União Federal.

III. A adoção, pelo acórdão rescindendo, de uma das interpretações cabíveis à espécie, não significa violação à literal disposição de lei, mas, ao contrário, coaduna-se com os dispositivos legais apontados como violados.

IV. Improcedem as alegações de ofensa à coisa julgada e de decisão baseada em erro de fato, se as mesmas não restaram demonstradas.

V. Ação rescisória julgada improcedente, com condenação nas custas e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa."
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados. Em seu recurso especial (fls. 529⁄536), a União aponta violação aos seguintes dispositivos: (a) art. 535 do CPC, pois, mesmo com a oposição dos embargos de declaração, o Tribunal de origem não se manifestou quanto às matérias ali indicadas; (b) art. 485, V, do CPC, porque o acórdão recorrido ofendeu os (I) arts. 487, II, do CPC, e 5º da Lei 9.469⁄97, na medida em que possui legitimidade ativa para a causa; (II) arts. 145, II, do CC⁄16 e 20, § 2º, da CF⁄88, porquanto é impossível a desapropriação de área situada no Parque Nacional do Iguaçu, dentro dos limites de faixa de fronteira; (III) art. 5º, caput e XXIV, da CF⁄88, já que "o valor a que chegou a decisão rescindenda está totalmente dissociado da realidade, tendo havido super avaliação do imóvel desapropriado, conclusão que facilmente é possível se chegar mediante análise do preço atribuído ao hectare pelo perito, não precisando para isso ser nenhum expert, até porque para chegar ao valor da terra nua, foi realizada pesquisa de mercado, sem levar em conta que se tratava de área situada dentro do Parque Nacional de Iguaçu, que nunca poderia ser explorada, chegando a preço vinte vezes superior ao de compra" (fl. 535).

O INCRA, em seu recurso (fls. 546⁄577), indica ofensa aos seguintes dispositivos: (a) art. 535 do CPC, pois, mesmo com a oposição dos embargos de declaração, o Tribunal não se manifestou a respeito das matérias ali apontadas; (b) arts. 555, § 2º, do CPC, e 130 do RITRF da 4ª Região, ao argumento de que é nulo o acórdão recorrido, tendo em vista que não houve reinclusão da apelação em pauta de julgamento após pedido de vista; (c) art. 47 do CPC, já que a União tem legitimidade ativa para a causa; (d) arts. 1º e 2º do Decreto-lei 1.942⁄82, porque (I) tal diploma não pode ser aplicado retroativamente; (II) não configurados os requisitos para a posse agrária; (e) arts. 472 do CPC e 1º e 2º do Decreto-lei 2.073⁄40, sob o fundamento de que a área discutida é de domínio da União, sendo, portanto, inviável o pagamento de indenização aos recorridos; (f) art. 15-A do Decreto-lei 3.365⁄41, na medida em que não são devidos os juros compensatórios àquele que não detinha a posse do imóvel, além do que tal bem não pode ser explorado economicamente por estar situado no perímetro do Parque Nacional do Iguaçu.
O relator, Min. Luiz Fux, deu provimento aos recursos especiais, em voto assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V, CPC. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP 476.665⁄SP). AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DE TERCEIRO. ART. 287, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA VIA ELEITA. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. O Recurso Especial interposto contra acórdão proferido em sede de ação rescisória pode veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei


2. A Corte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, decidiu que:"(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - RESP 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20.06.2005). Precedentes jurisprudenciais do STJ: AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006 e RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006.


3. A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstituí-lo.


4. Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


5. A doutrina especializada, ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado", deixa assente que o interesse deste, ensejador da legitimação para propositura da rescisória, não pode ser meramente de fato, vez que, por opção legislativa os interesses meramente econômicos ou morais de terceiros não são resguardados pela norma inserta no art. 487 do CPC. É o que se infere, por exemplo, da lição de Alexandre Freitas Câmara, in verbis:
"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.
Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (in "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)


6. In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.


7. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


8. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


9. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

"Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.
É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).
Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).


10. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


11. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


12. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


13. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis:

CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


14. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


15. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertence, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


16. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


17. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis:


"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)

Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


18. No mesmo sentido:
"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)


TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)
19. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


20. Precedentes: REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ. 25.08.2008; REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ. 20.08.2008; REsp 933.901⁄PR, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, DJ. 25.06.2008; REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ. 19.06.2008.


21. O pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada - proferido o voto do Ministro Relator, após a sustentação oral dos procuradores de ambas as partes - afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., desta relatoria, DJ 27.09.2004.


22. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


23. A ofensa a princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.


24. Recursos especiais parcialmente conhecidos e providos."
Pedi vista.

2.Acompanho o relator quanto (a) ao não conhecimento dos recurso especial em relação à ofensa aos dispositivos constitucionais (arts. 5º, caput e XXIV, e 20, § 2º), já que a competência do STJ, nos termos do art. 105, III, da Constituição, restringe-se à uniformização da aplicação da lei federal infraconstitucional; (b) à inexistência de violação ao art. 535 do CPC; (c) à negativa de reconhecimento da ofensa ao art. 555 do CPC, tendo em vista a orientação jurisprudencial manifestada nos seguintes julgados: EDcl no REsp 445.910⁄MG, 1ª T., Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 16.04.2007; HC


25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ de 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474.475⁄SP, 1ª T., Min. Luiz Fux, DJ de 27.09.2004.


3.Do mesmo modo, acompanho quanto ao reconhecimento da legitimidade ativa da União na hipótese, já que, nos termos do art. 487 do CPC, a ação rescisória pode ser proposta não apenas por quem foi parte no processo originário, mas também pelo terceiro juridicamente interessado. No caso, o interesse da União é evidente, já que, conforme bem destacado pelo relator, "o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título a non domino pelo Estado do Paraná".


4.Quanto ao mais, considerando a orientação firmada pela 1ª Turma (v.g., REsp 953.791⁄PR, Min. Denise Arruda, DJe de 01.10.2008; REsp 842.056⁄PR, Min. Luiz Fux, DJe de 19.06.2008; ) acerca do descabimento da indenização na hipótese, também acompanho o relator.


5.Diante do exposto, conheço parcialmente de ambos os recursos especiais para, nessa parte, dar-lhes provimento, acompanhando o relator. É o voto.



CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA
Número Registro: 2006⁄0148815-9 REsp 867016 ⁄ PR


Números Origem: 200104010247870 9704437366

PAUTA: 05⁄05⁄2009 JULGADO: 05⁄05⁄2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX

Presidente da Sessão
Exma. Sra. Ministra DENISE ARRUDA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. IVALDO OLÍMPIO DE LIMA

Secretária

Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : UNIÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDEBRANDO FREITAS CAYRES
ADVOGADO : ADILSON AMARO ALVES

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Fins de Reforma Agrária

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, a Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, deu-lhes provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki (voto-vista), Denise Arruda, Benedito Gonçalves e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.


Brasília, 05 de maio de 2009



MARIA DO SOCORRO MELO
Secretária


RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)


RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Trata-se de recursos especiais interpostos pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA e pela UNIÃO com fulcro no art. 105, III, "a", do permissivo constitucional, em face do acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:
ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. QUESTÃO DE ORDEM APRESENTADA PELO MPF. REJEIÇÃO DE AMBOS OS FUNDAMENTOS. AÇÃO RESCISÓRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO FEDERAL. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. OFENSA À COISA JULGADA. ERRO DE FATO. INOCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO. CUSTAS E HONORÁRIOS.


I. Rejeitada questão de ordem apresentada pelo Ministério Público Federal, tanto quanto à alegação de que não teria sido examinada, pelo Relator, a preliminar de ilegitimidade da União, quanto em relação ao segundo fundamento, no sentido de reincluisão dos autos em pauta.


II. Reconhecida a ilegitimidade ativa da União Federal.


III. A adoção, pelo acórdão rescindendo, de uma das interpretações cabíveis à espécie, não significa violação à literal disposição de lei, mas, ao contrário, coaduna-se com os dispositivos legais apontados como violados.


IV. Improcedem as alegações de ofensa à coisa julgada e de decisão baseada em erro de fato, se as mesmas não restaram demonstradas.


V. Ação rescisória julgada improcedente, com condenação nas custas e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Foram opostos embargos de declaração, que restaram rejeitados nos seguintes termos:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRADIÇÃO. IMPROPRIEDADE DO ARGUMENTO. VÍCIOS INEXISTENTES. REJEIÇÃO.


I. Só resta caracterizada a contradição, em sede de embargos declaratórios, quando demonstrada eventual incoerência entre o julgado e seus próprios termos, mostrando-se de todo impróprio o argumento de contradição entre o acórdão e outro julgado.


II. Nos exatos termos do artigo 535 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são cabíveis, tão-somente, para sanar obscuridade ou contradição, ou, ainda, para suprir omissão acerca de tema sobre o qual o Tribunal deveria ter se manifestado - hipóteses não ocorrentes na espécie.

Noticiam os autos que a União Federal e o INCRA ajuizaram a presente ação rescisória com fulcro nos arts. 485, incs. IV, V e IX, e 487, incs. I e II, do Código de Processo Civil, por violação à literal disposição de lei, ofensa à coisa julgada e em decisão fundada em erro de fato, visando à desconstituição do julgado proferido pela 3ª Turma do TRF da 4ª Região, que negou provimento ao recurso do INCRA e deu parcial provimento ao recurso do Expropriado Hildebrando Freitas Cayres. Em síntese, o acórdão afastou a alegação de dúvidas quanto à propriedade e manteve o pagamento de indenização pela desapropriação de imóvel pertencente à antiga Gleba Silva Jardim, revogando a determinação de que os valores da indenização permanecessem em depósito, à ordem do juízo, até que se esclarecesse a questão do domínio em ação própria.

O acórdão transitou em julgado em 10⁄05⁄1999, conforme certidão de fl. 183.

Os Autores postularam a tutela antecipada por entenderem existir prova inequívoca de que o acórdão rescindendo considerou preço superavaliado como justa indenização da desapropriação, bem como ser verossimilhante a alegação de que sua pretensão coaduna-se com o disposto no art. 5º, inc. XXIV, da CF⁄88, fazendo-se presente, de resto, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. No mérito, pediram que a ação fosse julgada procedente a fim de rescindir o julgado, para, em nova apreciação da lide, sucessivamente: a) julgar-se improcedente a ação originária; b) decretar-se a nulidade do processo, a partir da falta de citação da esposa do expropriado para integrar o pólo passivo na relação processual; c) decretar-se a nulidade da ação originária a partir do laudo pericial, inclusive, determinando-se a realização de nova perícia no Juízo de origem, ou, alternativamente, considerar-se como indenização justa o mesmo valor pago pelo Expropriado, na compra do imóvel, atualizado, sem a aplicação de juros compensatórios; d) decretar-se a nulidade da ação originária a partir do laudo pericial, inclusive, pela falta da planta e do levantamento topográfico da área; e) fixar a taxa dos juros compensatórios em 6% ao ano; e, cumulativamente, f) determinar-se o reexame necessário, para se analisar, de ofício, o pressuposto lógico e jurídico da desapropriação; g) condenar-se a parte contrária nos encargos de sucumbência.

Subindo os autos, foi inicialmente indeferido o provimento antecipado do pedido, com base nas seguintes razões:

"(...) Não reconheço a existência de prova inequívoca em favor do alegado pelos demandantes, de vez que não há demonstração de ser supervalorada a indenização. Assinale-se, a propósito, que mais de duas terças partes do valor total reclamado pelos expropriados correspondem a juros compensatórios, ficando demonstrado, portanto, que a causa maior do agravamento da indenização é a falta do pagamento de sua importância principal.

Tampouco admito, ao menos em sede de juízo prefacial, a inobservância, pelo acórdão rescindendo, do disposto no art. 5º, inc. XXIV, da CR⁄88.

Por fim, no que diz respeito ao 'periculum in mora', certamente aflige muito mais aos expropriados do que ao Poder Público" (fl. 248).

O INCRA interpôs agravo regimental, visando à reconsideração da decisão e o deferimento da tutela de urgência postulada na inicial ou, ainda, à submissão do recurso à apreciação da 2ª Seção.

A decisão foi mantida e a 2ª Seção, por voto de desempate, deu provimento ao agravo regimental, nos termos do voto condutor.

O Expropriado ofereceu contestação e, em função dos documentos juntados, deu-se vista aos Autores, que se manifestaram.

Juntada petição do Réu, foram apresentadas alegações finais pelo INCRA, pela União Federal e por Hildebrando Freitas Cayres.

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento da rescisória, por ofensa à coisa julgada e⁄ou violação aos dispositivos constitucionais referidos.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento à ação rescisória, nos termos da ementa supra destacada.

A UNIÃO interpôs seu recurso especial apontando violação aos arts. 485, V e 535, do CPC, sob os seguintes fundamentos:

a) o acórdão recorrido não enfrentou todas as questões postas na ação rescisória, restando omisso;

b) ao considerar a União parte ilegítima para a Ação Rescisória, o acórdão recorrido acabou por violar literal disposição de lei e negar vigência aos arts. 487, II, do CPC e ao art. 5º, da Lei nº 9.469⁄97;

c) a legitimidade da União para o ajuizamento da Ação Rescisória encontra fundamento ao tratar-se a área objeto de desapropriação de bem da União, por localizar-se em terras de fronteira no Estado do Paraná;

d) é impossível a desapropriação de área de domínio da União, de modo que o acórdão recorrido violou também o art. 145, II, do Código Civil, bem como os arts. 20, § 2º e 5º, XXIV, da Constituição Federal;
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA interpôs seu recurso especial apontando violação aos seguintes artigos: I) em virtude do domínio da União sobre o imóvel, ao art. 145, II, do CC, ao art. 131, do CPC, art. 20, § 2º, da CF⁄88; II) por ausência dos pressupostos processuais, ao art. 10, § 1º, inciso I, art. 47, caput e parágrafo único, art. 131, 214, 267, caput, inciso IV e § 3º, art. 282, II e VII, art. 284 e 285, todos do CPC, e 5º, caput e incisos I e LIV da Constituição Federal; III) pela violação dos princípios constitucionais da isonomia e o da justa indenização, aos arts. 131, do CPC, art. 5º, caput e inciso XXIV da CF; IV) quanto à planta da área desapropriada, aos arts. 176, II § 3º, da Lei 6.015⁄73; 282, inciso VI, 283 e 475, inciso II, do CPC; art. 5º, LIV e XXXV, da Constituição Federal; V) quanto aos juros compensatórios, na violação aos arts. 3º, da MP 1577⁄97 e arts. 462, 475, II, do CPC, art. 5º, II, da CF; VI) quanto à coisa julgada e carência de ação, por violação aos arts. 131, 267, incisos V e VI, e § 3º, 458, caput e incisos I, II e III; 472 e 475, caput, e inciso II; art. 515, do CPC e art. 5º, incisos LIV e XXXV, da Constituição Federal. Aduz, em síntese:

a) houve negativa de prestação jurisdicional, ante o não enfrentamento das matérias suscitadas nos embargos de declaração;

b) nulidade do acórdão recorrido ante a ausência de reinclusão do processo em pauta após pedido de vista, que excedeu o prazo previsto no art. 555, § 2º, do CPC e do art. 130, do RITRF⁄4ª Região, sendo levado em mesa após 01 (um) ano do pedido de vista;

c) nulidade do processo desapropriatório por falta de citação do cônjuge do expropriado;

d) violação ao art. 47 do CPC, pela obrigatória participação da União no feito como litisconsorte ativo, tendo em vista que as terras desapropriadas encontram-se em faixa de fronteira de domínio da União;

e) a AC 9621⁄PR reconheceu a propriedade da União das terras situadas no perímetro de julgamento;

f) não pode em momento algum haver titulação válida do Estado do Paraná, porquanto não se tratam de terras devolutas, cuja indenização e levantamento dos valores representa a sangria dos cofres públicos;

g) violação ao art. 472, do CPC, porque o acórdão rescindendo não poderia decidir acerca da legitimidade do domínio sem que a União Federal integrasse a lide;

h) os juros compensatórios, caso existente, devem limitar ao percentual de 6% ao ano.
O expropriado apresentou contra-razões às fls. 581⁄642, aduz o recorrido, em síntese:

a) que ação originária encontrava em fase de pagamento pela via de precatório requisitório, sob o número 210⁄2000;

b) que após formalizado o precatório requisitório, o Ministério Público Federal ofertou parecer opondo-se ao pagamento, que foi de pronto acatado pelo juízo de primeira instância;

c) tal decisão foi danosa ao recorrido, pois o precatório requisitório não é um procedimento judicial, mas sim de ordem administrativa e, desse modo, não havia como se renovar discussão sobre a liquidação ou sobre o mérito da ação de desapropriação propriamente dita, não havendo norma constitucional ou infra-constitucional que pudesse dar amparo à manifestação do Ministério Público Federal;

d) as terras do recorrente nunca foram devolutas e a sua titulação é absolutamente certa e conforme as disposições legais que regem a matéria de transmissão de propriedade, não há qualquer medida judicial que desconstituiu o seu título de legitimidade;

e) as terras dos autos não integravam o patrimônio da União, eis que já estavam desmembradas da antiga Gleba Silva Jardim;

f) a legitimidade do título do expropriado foi expressamente reconhecida através de sucessivos pronunciamentos nos autos originários, tanto por parte do INCRA, coo por parte da UNIÃO;

g) o INCRA realizou acordos com todos os demais proprietários vizinhos das terras desapropriadas da referida ação, quer pagando em dinheiro, quer fornecendo outras terras;

h) o título de domínio do expropriado não tem origem em expedição de título de domínio indevidamente feita pelo Estado do Paraná, nem se filia à transcrição de número 1.394, do Livro nº 3, do mesmo Cartório de Registro de Imóveis de Foz do Iguaçu-PR, sendo, pois, a sua transcrição absolutamente legítima;

i) na Colônia Tucuruvi é que houve a tal superposição dos títulos, emitidos ilegalmente pelo Estado do Paraná, sendo absolutamente certo que a A.Civ. 9621⁄63 não se refere às terras da Transcrição nº 1.496 CRI de Foz do Iguaçu, como reconhecido, formalmente, pelo INCRA, por seus Ilustres Procuradores e pela União;

j) nunca houve na gleba desapropriada qualquer superposição de títulos, assim como nunca houve qualquer conflito, quer armado, quer judicial, pela posse ou pela propriedade das terras;

l) a Colônia Tucuruvi não pode ser confundida com a Gleba Silva Jardim, sendo absolutamente certo que sobre aquela área que incidiram várias ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público Federal, objetivando a declaração de nulidade dos títulos de propriedade outorgados, indevidamente, pelo Estado do Paraná. Então, não é possível estabelecer qualquer identidade entre as referidas terras e as suas respectivas titulações;

m) as terras objeto da desapropriação não estão situadas na faixa de fronteira, já que ali não se trata de linha de fronteira terrestre, mas fronteira por água.
Parecer da d. Subprocuradoria Geral da República pelo provimento dos recursos especiais, assim ementado:

"Recurso Especial. Desapropriação. Terras situadas em faixa de fronteira. Recurso especial da União. Conhecimento e provimento. Embargos de declaração. Omissão existente. Nulidade do acórdão recorrido. A motivação das decisões judiciais reclama do órgão julgador, sob pena de nulidade, explicitação fundamentada quanto aos temas suscitados, mesmo que o seja em embargos declaratórios. Precedentes do STJ. Violação aos artigos 487, inciso II, do CPC e 5º, da Lei n.º 9.469⁄97. Ocorrência. Legitimidade ativa da União. Interesse jurídico demonstrado. Possibilidade de intervenção em ação na qual é parte Autarquia Federal. Recurso especial do INCRA. Conhecimento e provimento. Embargos de declaração. Omissão existente. Nulidade do acórdão recorrido. A motivação das decisões judiciais reclama do órgão julgador, sob pena de nulidade, explicitação fundamentada quanto aos temas suscitados, mesmo que o seja em embargos declaratórios. Precedentes do STJ. Questão de ordem suscitada pelo Ministério Público Federal. Nulidade do acórdão regional por ausência de inclusão obrigatório do feito em pauta, estando ausente a necessária intimação das partes. Violação ao § 2º do artigo 555 do CPC c⁄c artigo 130 do Regimento Interno do TRF⁄4ª Região. Legitimidade da União para figurar no pólo ativo da ação rescisória. Litisconsórcio ativo necessário. No mérito, impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto-lei nº 1942⁄82. Dominialidade da União reconhecida na AC nº 9621⁄PR, cujo contexto engloba as terras objeto da ação desapropriatória originária. Parecer pelo conhecimento e provimento dos recurso especiais da União e do INCRA".

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V, CPC. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP 476.665⁄SP). AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DE TERCEIRO. ART. 287, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA VIA ELEITA. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. O Recurso Especial interposto contra acórdão proferido em sede de ação rescisória pode veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei


2. A Corte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, decidiu que:"(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - RESP 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20.06.2005). Precedentes jurisprudenciais do STJ: AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006 e RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006.


3. A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstituí-lo.


4. Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


5. A doutrina especializada, ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado", deixa assente que o interesse deste, ensejador da legitimação para propositura da rescisória, não pode ser meramente de fato, vez que, por opção legislativa os interesses meramente econômicos ou morais de terceiros não são resguardados pela norma inserta no art. 487 do CPC. É o que se infere, por exemplo, da lição de Alexandre Freitas Câmara, in verbis:

"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.

Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (in "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)


6. In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.


7. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


8. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


9. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

"Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.

É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).

Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).

10. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


11. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


12. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.
13. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis:
CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.
§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


14. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


15. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


16. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


17. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis:


"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)

Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


18. No mesmo sentido:
"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.
- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.
- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.
- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)

TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)


19. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


20. Precedentes: REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ. 25.08.2008; REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ. 20.08.2008; REsp 933.901⁄PR, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, DJ. 25.06.2008; REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ. 19.06.2008.


21. O pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada - proferido o voto do Ministro Relator, após a sustentação oral dos procuradores de ambas as partes - afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., desta relatoria, DJ 27.09.2004.


22. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


23. A ofensa a princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.


24. Recursos especiais parcialmente conhecidos e providos.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator):

a) Violação a dispositivo constitucional
Prima facie, a irresignação no que tange à ofensa de princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.
Com efeito, descabe ao STJ examinar a questão, porquanto reverter o julgado significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao colendo STF, e a competência traçada para este Tribunal, em sede de recurso especial, restringe-se unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional.

Nessa esteira, os precedentes de ambas as Turmas de Direito Público do STJ:

"AGRAVO REGIMENTAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PLANO DE SEGURIDADE SOCIAL DO SERVIDOR PÚBLICO. MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. MEDIDA PROVISÓRIA N. 560⁄94. REEDIÇÕES. MATÉRIA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCABÍVEL O RECURSO ESPECIAL. PRECEDENTES. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 168 DO CTN. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA.


No acórdão recorrido, embora tenha sido mencionada legislação federal, decidiu-se a controvérsia com fundamentos essencialmente constitucionais, relativos aos princípios da reserva legal e da anterioridade (artigos 150, I e 195, § 6º, ambos da Constituição Federal). Incomportável, portanto, o exame do tema no âmbito do recurso especial.
(...)

Agravo regimental a que se nega provimento." (AGA 440.261⁄DF, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 04⁄08⁄2003)

"TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE SERVIDOR PÚBLICO ATIVO. MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA. INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 560⁄94 E SUAS POSTERIORES REEDIÇÕES. MATÉRIA DE ÍNDOLE EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA.
(...)

- A matéria referente à validade do aumento de alíquota da contribuição social incidente sobre os vencimentos dos servidores públicos federais, instituído pela Medida Provisória nº 560⁄94 e suas posteriores reedições, envolve discussão de natureza constitucional, não podendo ser examinada em sede de recurso especial.

- Agravo regimental improvido." (AGRESP 417.059⁄RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 21⁄10⁄2002)


b) Violação ao art. 535, do CPC
Ademais, não restou configurada a violação do art. 535 do CPC, uma vez que o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronunciou-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão, como de fato ocorreu na hipótese dos autos. Neste sentido, os seguintes precedentes da Corte:

"AÇÃO DE DEPÓSITO. BENS FUNGÍVEIS. ARMAZÉM GERAL. GUARDA E CONSERVAÇÃO. ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO. PRISÃO CIVIL. CABIMENTO. ORIENTAÇÃO DA TURMA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA⁄STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PROCESSO EXTINTO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. APLICAÇÃO DO § 4º DO ART. 20, CPC. EQÜIDADE. RECURSO DO BANCO PROVIDO. RECURSO DO RÉU DESACOLHIDO.
(...)


III - Não padece de fundamentação o acórdão que examina suficientemente todos os pontos suscitados pela parte interessada em seu recurso. E não viola o art. 535-II o aresto que rejeita os embargos de declaração quando a matéria tida como omissa já foi objeto de exame no acórdão embargado.
(...)" (REsp 396.699⁄RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 15⁄04⁄2002)


c) Nova inclusão em pauta para julgamento do voto-vista
Conforme noticiam os autos, o julgamento da ação rescisória no tribunal a quo foi iniciado na sessão de 13.09.2004 que, após a sustentação oral por parte do INCRA e a prolatação de três votos, houve pedido de vista. O feito foi apresentado em mesa - sem publicação de pauta - na sessão de julgamento no mês de setembro de 2005, ou seja, após o decurso de 01 (um) ano.


Deveras, a jurisprudência da Corte se firmou no sentido de que o adiamento do julgamento do recurso não implica a necessidade de nova publicação da pauta. Ademais, não há que se falar em cerceamento de defesa, uma vez que a parte recorrente já havida realizado sua sustentação oral.
Nesse sentido, os seguintes arestos:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NULIDADE DO ACÓRDÃO. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO.


1. Ação Popular movida contra o Município de Bady Bassit; em que se pleiteia a suspensão dos efeitos dos atos administrativos praticados pela Municipalidade, com base na lei local nº 1.310⁄97, consubstanciados na expedição de alvará, autorizando a construção de um Motel em área destinada, originariamente, a uso residencial.


2. O presente recurso especial foi incluído na pauta do dia 20⁄05⁄2003, cuja publicação no Diário Oficial deu-se em 14⁄05⁄2003.
Iniciado o julgamento do feito no dia 20⁄05⁄2003, foi ele adiado e não retirado da pauta, como aduzem os embargantes, sendo que na sessão do dia 16⁄12⁄2003, o mesmo foi julgado.


3. O adiamento do julgamento do recurso não implica a necessidade de nova publicação da pauta. (Precedentes da Corte: HC34793, Rel.
Min.Felix Fischer, DJ de 17⁄06⁄2004;RESP 268.659⁄RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 15⁄04⁄2002;REsp 95.082, Rel. Min. Ruy Rosado, DJ de 14⁄10⁄96) 4. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no REsp 474475⁄SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02.09.2004, DJ 27.09.2004 p. 213)


PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INOVAÇÃO DA LIDE.
INVIABILIDADE. INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DO ART. 535 DO CPC. REDISCUSSÃO DE QUESTÕES DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE.


1. Havendo pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada e proferido o voto do Ministro Relator, afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., Min. Luiz Fux DJ 27.09.2004.


2. Revelam-se improcedentes os embargos declaratórios em que as questões levantadas traduzem inconformismo com o teor da decisão embargada, pretendendo rediscutir matérias já decididas, sem demonstrar omissão, contradição ou obscuridade (art. 535 do CPC).


3. Não é possível, em sede de embargos de declaração, inovar a lide, invocando questões até então não suscitadas. Precedentes: EDcl no Resp n.º 72.204⁄RJ, 1ª Seção, Min. João Otávio de Noronha, DJ de 14.11.2005; EDcl no REsp n.º 457.714⁄SP, 3ª Turma, Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 10.10.2005; EDcl no AgRg no REsp n.º 604.741⁄CE, 5ª Turma, Min. Laurita Vaz, DJ de 01.02.2006; EDcl nos EDcl no AgRg no Ag n.º 650.348⁄SP, 6ª Turma, Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 05.12.2005.
4. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no REsp 445.910⁄MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27.03.2007, DJ 16.04.2007 p. 167)


"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ADIAMENTO DO JULGAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE NOVA PUBLICAÇÃO.


O simples adiamento do julgamento do recurso, sem retirada de pauta, dispensa – em princípio – a publicação de nova intimação das partes. (Precedentes). Writ denegado." (HC34793, Rel. Min.Felix Fischer, DJ de 17⁄06⁄2004)

"CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO RESCISÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE. NULIDADE DO ACÓRDÃO NÃO CONFIGURADA. ADIAMENTO AUTOMÁTICO DA PAUTA. DESNECESSIDADE DE NOVA PUBLICAÇÃO. RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE POR CULPA DE PREPOSTO NA CONDUÇÃO DO ÔNIBUS. REEXAME DA PROVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7-STJ.
I. Possível o julgamento do processo em sessão posterior àquela inicialmente designada, porquanto o adiamento se dá automaticamente, sem necessidade de nova publicação.
II. Nulidades não configuradas.
III. Reconhecimento de culpa do preposto da empresa de transporte coletivo, a afastar a alegação da autora de que sua condenação se baseara exclusivamente na atribuição de responsabilidade objetiva.
IV. Descabimento da rescisória para revisão da matéria de prova, o mesmo acontecendo, ao teor da Súmula n. 7 do STJ, quanto à admissibilidade do especial.
Recurso não conhecido." (RESP 268.659⁄RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 15⁄04⁄2002)

"INTIMAÇÃO. PAUTA DE JULGAMENTO. ADIAMENTO.

1. O RECURSO, CUJO JULGAMENTO FOI ADIADO, PODE SER JULGADO EM SESSÃO PROXIMA, INDEPENDENTEMENTE DE NOVA PUBLICAÇÃO DE EDITAL.

2. O REGISTRO CONSTANTE DO EDITAL AFIXADO NA PORTA DA SESSÃO: "MOTIVO ADIADO POR INDICAÇÃO DO PRESIDENTE", SIGNIFICA QUE ELE VINHA ADIADO DE SESSÃO ANTERIOR, E SERIA JULGADO, E NÃO QUE SERIA NOVAMENTE ADIADO. MÉRITO DEPENDENTE DE MATÉRIA DE PROVA.
RECURSO NÃO CONHECIDO." (REsp 95.082, Rel. Min. Ruy Rosado, DJ de 14⁄10⁄96)

d) Legitimidade ativa da União
A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstitui-lo.
Parte, para efeito de propositura da ação rescisória, é aquela que formulou pedido e aquela em face de quem o pedido foi formulado. Assim, tanto o autor quanto o réu, originários, podem manejar a rescisória, ainda que o processo tenha corrido à revelia do demandado.
Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.
Assim, o interesse da União está resguardado pela norma inserta no art. 487 do CPC, que ao relacionar os legitimados à figurar no pólo ativo da referida ação dispõe:

"Art. 487. Tem legitimidade para propor a ação:

I - quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular;

II - o terceiro juridicamente interessado;

III - o Ministério Público:


a) se não foi ouvido no processo, em que lhe era obrigatória a intervenção;

b) quando a sentença é o efeito de colusão das partes, a fim de fraudar a lei."

Ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado" a doutrina especializada assim dispõe, verbis:

"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.
Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (Alexandre Freitas Câmara, In "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)

No mesmo sentido, ensina o ilustre processualista José Carlos Barbosa Moreira:

"Não basta o simples interesse de fato. O credor, por exemplo, não se legitima segundo o artigo 487, n.º II, à rescisória da sentença que tenha condenado o devedor em ação proposta por outro credor: ainda que o desfalque patrimonial resultante diminua ou até elimine a possibilidade concreta de satisfação do crédito, este, de iure, subsiste incólume." (in "Comentários ao Código de Processo Civil", vol. V, 12.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 170)


e) Mérito da ação rescisória
Quanto ao mérito, conforme relatado, a União Federal e o INCRA ajuizaram a presente ação rescisória com fulcro nos arts. 485, incs. IV, V e IX, e 487, incs. I e II, do Código de Processo Civil, por violação à literal disposição de lei, ofensa à coisa julgada e em decisão fundada em erro de fato, visando à desconstituição do julgado proferido pela 3ª Turma desta Corte, que negou provimento ao recurso do INCRA e deu parcial provimento ao recurso do Expropriado Hildebrando Freitas Cayres. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento à ação rescisória, nos termos da ementa supra destacada.

ACorte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, entendeu pela possibilidade de o Recurso Especial veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei, consoante se infere de trecho do voto condutor, proferido no RESP 476.665⁄SP, verbis: "(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - REsp 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20⁄6⁄2005).

No mesmo sentido confiram-se, à guisa de exemplo, julgados desta Corte, assim ementados:
"AGRAVO REGIMENTAL. AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS CAPAZES DE INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL. DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DAS VIAS RECURSAIS. SÚMULA 514⁄STF. MOMENTO DA FLUÊNCIA DOS JUROS MORATÓRIOS. QUESTÃO DE DIREITO.

- Não merece provimento recurso carente de argumentos capazes de desconstituir a decisão agravada.

- O Recurso Especial pode vir calcado nos mesmos dispositivos que ensejaram a Ação Rescisória por violação literal a disposição de Lei. Assim decidiu, no REsp 476.665⁄PÁDUA, a Corte Especial do STJ, revendo posição anterior. (grifo nosso)

- "Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os recursos" (Súmula 514⁄STF).
- A discussão acerca do momento inicial da fluência dos juros de mora envolve questão de direito e não de prova." (AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ALEGAÇÃO GENÉRICA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284⁄STF. CONHECIMENTO DO RECURSO NO QUE CONCERNE À APONTADA OFENSA AO ART. 485, V, DO CPC. APLICAÇÃO DA SÚMULA 7⁄STJ NO QUE CONCERNE À ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 485, IX, § § 1º E 2º, DO CPC. AFASTADA A SÚMULA 126⁄STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO DA LEI N. 4.870⁄65. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. PREÇOS DO SETOR SUCRO-ALCOOLEIRO. FIXAÇÃO EM DESACORDO COM O ESTABELECIDO NA LEI N. 4.870⁄65. CABIMENTO DE INDENIZAÇÃO.

In casu, cingiu-se a recorrente a formular a alegação genérica de violação do artigo 535, II, do Código de Processo Civil, sem apontar qualquer omissão no acórdão recorrido. Incidência da Súmula 284⁄STF, segundo a qual "é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

"Não se olvida que a violação de lei, para dar azo à rescisória, deve se referir à letra da lei. O art. 485, V, da lei de regência se refere à letra da lei, tanto quanto o art. 105, III, 'a', da Constituição. Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - REsp 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20⁄6⁄2005). Colocada essa premissa, ficam afastadas as alegações da recorrida de que a matéria agitada nas razões de recurso é inédita, bem como de que se operou a preclusão consumativa. (grifo nosso)

Em relação ao artigo 485, IX, § § 1º e 2º, do CPC (erro de fato), verificar se na hipótese restou comprovado ou não o prejuízo que se busca indenizar demandaria o reexame de matéria probatória, uma vez que seria necessária a análise da perícia acostada aos autos. Incide na espécie, dessa forma, a Súmula 07⁄STJ, o que determina o não-conhecimento do recurso especial quanto à alegada ofensa ao artigo art. 485, IX, § § 1º e 2º, do CPC.

O egrégio Tribunal a quo decidiu a questão no âmbito infraconstitucional, notadamente à luz do artigo 485, V e IX, do CPC e da Lei n. 4.870⁄65. Deve prevalecer o entendimento segundo o qual a análise da aplicação de uma lei federal não é incompatível com o exame de questões constitucionais subjacentes ou adjacentes. A competência somente seria deslocada para a Máxima Corte se a v. decisão recorrida tivesse julgado o feito única e exclusivamente sob o prisma constitucional, o que se não deu no caso ora em exame. Mais a mais, na espécie não tem aplicação a Súmula 126 desta Corte, pois a recorrente interpôs recurso extraordinário.

A verificação acerca da apontada violação à literal dispositivo de lei, a autorizar a rescisão do acórdão rescindendo (art. 485, V, do CPC), não implica revisão de matéria de prova. Com efeito, a conclusão sobre o cabimento ou não de indenização ao setor sucro-alcooleiro envolve o exame da legislação aplicável à espécie.

Ausência de prequestionamento dos artigos 9º e 10º da Lei n. 8.492⁄92; 89 da Lei n. 5.764⁄71; 35 do Decreto-lei n. 2.284⁄86; 1º, 2º, 6º e 7º do Decreto-lei n. 2.335⁄87; 8º da MP n. 32⁄89; e 8º da Lei n. 7.730⁄89. No que se refere aos artigos 9º, 10 e 11 da Lei n. 4.870⁄65, bem como do Decreto-lei n. 2.283⁄86, o recurso deve ser conhecido, diante do prequestionamento explícito dos dispositivos legais tidos por malferidos.

Consoante salientado por este Relator quando do julgamento do REsp 79.937⁄DF (Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 10.9.2001), da simples leitura dos artigos 9º, 10 e 11 da Lei n. 4.870⁄65, que devem ser interpretados de forma sistemática, depreende-se que o IAA, entidade estatal, com o escopo de harmonizar a distribuição de bens relevantes nacionalmente como o açúcar e o álcool, devia fixar os preços a serem cobrados pelas usinas, mas, logicamente, tais preços não podiam ser fixados abaixo do levantamento de custos realizado.

A Constituição Federal de 1967 já positivava o princípio do equilíbrio econômico-financeiro do contrato no art. 167, II, de acordo com o qual as tarifas deveriam assegurar dita equação. Na Constituição de 1988, o art. 175, parágrafo único, III, também faz referência à política tarifária, a ser disciplinada em lei. E imbuído do mesmo espírito é o art. 37, § 6°, da Carta, que dispõe sobre responsabilidade civil do Estado, uma vez que a ninguém é dado suportar sozinho o peso de uma medida que a todos aproveite.

É cediço que os preços dos combustíveis estão sujeitos a uma disciplina própria, o que acarretou a própria edição da Lei n. 4.780⁄65 e a criação do IAA. Ao poder público, todavia, não assiste impor ônus demasiado ao fornecedor de cana-de-açúcar em prol da coletividade. In casu, competia ao Estado, como consta na parte final do § 1º, do artigo 14, da referida Lei, “assegurar os interesses do fornecedor de cana, garantir o abastecimento do mercado interno e evitar o abuso do poder econômico e o eventual aumento arbitrário dos lucros”. A competência para a fixação dos preços em nada altera essa necessidade.

Impõe-se, portanto, a reparação do dano, nos termos do artigo 37, § 6º, da CF, pois a Administração, ao fixar o preço do açúcar e do álcool abaixo dos custos – que mandara apurar, por meio da Fundação Getúlio Vargas -, inviabilizou a atividade sucro-alcooleira.

Sobre a questão dos períodos de congelamento de preços, mantém-se o entendimento de que o Governo deveria obedecer os critérios estabelecidos na Lei n. 4.870⁄65.

Preliminares de incidência da Súmula 284⁄STF quanto à apontada ofensa ao artigo 535, do CPC, aplicação da Súmula 7⁄STJ em relação à alegada violação do artigo 485, IX, § § 1º e 2º, do CPC, e ausência de prequestionamento da Lei n. 5.764⁄71 acolhidas. Recurso especial conhecido em parte e improvido." (RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006)

Por essas razões, e tendo em vista o prequestionamento dos dispositivos tidos por violados, conheço do recurso especial e passo à análise da controvérsia acerca da desapropriação em terras de fronteira.
O caso sub examine merece uma retroação histórica sobre os fatos e suas conclusões bem lançadas na sentença de primeiro grau, verbis:

"A problemática das terras no Estado do Paraná iniciou-se quando, na década de 1950, o Governo, nas mãos do então Governador, o Sr. Moyses Lupion, titulou extensas áreas de "terras devo lutas" no Oeste do Estado, cujas terras estavam situadas na chamada "faixa de fronteira". Ocorreu, porém, que as pessoas que foram tituladas pelo Estado do Paraná não foram as mesmas pessoas que há muitos anos já ocupavam aquelas terras, seja na condição de proprietários seja na condição de posseiros, pessoas essas que, com seu trabalho e suor, cultivavam-nas e as tomaram produtivas. (Narram levantamentos feitos pelo INCRA e pelo MPF que o Governador, com as titulações, teria buscado beneficiar pessoas "chegadas" ao poder, as quais não tinham qualquer afinidade com a agricultura, por isso mesmo que ficaram conhecidas como "agricultores de asfalto").

O fato é que, de posse dos títulos de propriedade, os titulados pelo Estado do Paraná, ao verificarem que as terras que adquiriram estavam ocupadas por terceiros e também que o preço delas subia a cada dia que passava (não só por sua extrema fertilidade, que propiciava grandes níveis de produção, como também pelo fato da abertura e do asfaltamento das estradas, que facilitava o acesso e o escoamento da produção), passaram a tentar obter a posse fisica das mesmas, às vezes por meios legais (ações judiciais etc.), mas na maior parte das vezes fazendo uso da força, contratando, até mesmo, 'jagunços" para o "serviço".

Diante desse quadro, é fácil concluir que a violência encontrou terreno fértil para explodir, como de fato ocorreu. Tanto que até foi preciso, em alguns casos, a intervenção do Exército.

Confira-se, nesse sentido, matéria veiculada no dia 14 de julho de 2001, no jornal "Gazeta do Povo", de Curitiba⁄PR, denominada "A história de grilagem no Oeste", subtítulo da matéria principal ("INCRA revisará 30 mil títulos de propriedades rurais no Paraná", que alertava os seus leitores acerca do final do prazo para a ratificação dos títulos expedidos pelo Estado do Paraná na região Oeste do Estado), in verbis:

"Conforme o Livro Branco de Grilagem de Terras no Brasil, na década de 50 as terras do Oeste do Paraná, na fronteira com Argentina e Paraguai, foram ocupadas por imigrantes de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

As terras. chamadas devolutas. foram tituladas a afetos do governo. 'laranjas' e até fantasmas. Esses títulos foram expedidos independentemente de as terras estarem ocupadas. foi quando nasceram os conflitos. As pessoas eram expulsas por jagunços e até mesmo pela polícia. Segundo o livro elaborado pelo INCRA, o Poder Judiciário foi conivente com a aparente legalidade dos títulos.

Em 1957, a maior parte das terras do Oeste pertencia à União e não podia ser titulada pelo Estado. Foi nesta época que surgiu a cumplicidade entre o Poder Executivo e os cartórios, que autenticaram falsas procurações.

Dados históricos dão conta que 40 mil hectares do imóvel Rio Quarto, em Céu Azul, no Oeste, foram grilados, beneficiando um diretor do Departamento de Terras do Estado. Estima-se que o governo tenha titulado outra área de 50 mil hectares, a Gleba Chopinzinho, em nome de 119 fantasmas do município de mesmo nome." (Grifei).

Em outro subtópico da mesma matéria, assim está relatada a situação vivida por causa da titulação promovida pelo Governador Moyses Lupion:

"Tanto o Diretor Executivo do INCRA, Valdir Dorini, como o fundador do instituto, o paranaense Reinhold Stephanes, reconhecem que a situação gera polêmica porque envolve uma história de conflito agrário. que resultou em morte e injustiças (veja histórico). 'A época de maior conflito. entre 1955 e 1960. foi em Francisco Beltrão. quando houve intervenção federal com a presença do Exército' disse Stephanes. Foi nessa época. durante o governo de Moisés Lupião (sic), que ocorreu boa parte dos conflitos." (Grifei).

Nessa mesma direção, escreveu o então Prefeito do Município de Palotina, Sr. João Bortolozzo, ao Secretário Executivo da Comissão Especial da Faixa de Fronteira, em 23 de agosto de 1971, cujo relatório integra os autos da Reclamação n. 1.074⁄PR, em trâmite no Supremo Tribunal Federal:

"Caminhava, portanto, o Município de Palotina a passos largos em direção ao seu futuro de prosperidade e grandeza, quando alça-se ao comando político do Estado a figura celebérrima do Moyses Lupion, acompanhado de uma coorte faminta de lucros fáceis. E lá se foi a tranqüilidade de nossos habitantes.

Pretendendo apossar-se daquelas terras fertilíssimas, mas, tendo contra sua pretensão as transcrições imobiliárias que escudavam o direito dos sucessores da 'BRA VIACO' e de Ruy de Castro, Lupion simplesmente rebatizou a gleba Piquiry, passando a denominá-Ia por colônias Rio Azul, Piquerobí e Pindorama, designações com as quais titulou-a toda, não em favor dos que a trabalhavam e a faziam produzir, mas em favor de seus apaniguados, os chamados' lavradores de asfalto'.

E, pasme V. Exa., esses títulos de Lupion, em flagrante duplicidade registrária, foram 'normalmente' transcritos no Registro de Imóveis. Ademais o D.G.T.C. (Departamento de Terras) em tempo algum fez qualquer medição ou demarcação na propriedade de Ruy de Castro ou na parte restante, ainda de propriedade da 'BRA VIACO'. Acrescente-se a isso que na área de Palotina jamais qualquer titulado teve posse, nem ali plantou um único pé de couve.

Claro está que esses registros dúplices geraram situações complexas, as quais desencadearam conflitos de graves proporções entre os sucessores de Ruy de Castro e titulados pelo Estado, estes acobertados ostensiva e acintosamente pela Polícia de Lupion. E, como não poderia deixar de ser, o sangue correu fartamente, a ponto de a 53 Cia. de Fronteiras, do Exército Nacional, haver destacado um grupo para Palotina a fim de coibir os desmandos praticados pelos sicários do Governo Estadual."

Conquanto a(s) área(s) deste processo não coincida(m) com as mencionadas nas citações anteriores, estas bem ilustram o que o então Governador do Estado do Paraná fez em toda a Região Oeste do Estado, em cuja região está integrada a(s) já mencionada (s) área (s).

Diante dessa situação de insegurança e violência generalizadas, o Governo Federal, por meio do INCRA, teve que agir para que a paz e o progresso voltassem à região.

Mas, por que desapropriar aquelas terras, quando o INCRA já tinha conhecimento das titulações irregulares promovidas pelo Estado do Paraná na "faixa de fronteira"? Por que propôs ações expropriatórias, em vez de ações voltadas à defesa do patrimônio da União (ações anulatórias dos títulos espúrios ou mesmo ações discriminatórias)?

É o próprio expropriante quem responde esses questionamentos, na sua manifestação datada de 03 de março de 1986, constante nos autos n. 1999.70.02.003744-0, em trâmite nesta Vara Federal:

"A violência tornou-se a palavra de ordem e muitos foram os que ali deixaram suas vidas.

Foi diante de tal quadro que a Autarquia passou a intervir na região, procurando, dentre as alternativas jurídicas que se apresentavam, qual aquela que num menor espaço de tempo, viesse a satisfazer o interesse social e devolver à região a paz de há muito almejada, rearticulando o processo produtivo, e, sobretudo a Justiça Social.

Duas foram as alternativas jurídicas: a primeira, seria ingressarmos com diversas ações anulatórias daqueles títulos concedido a non domino pelo Estado na faixa de fronteira de domínio da União, ou, como segunda alternativa, a desapropriação por interesse social de todas as glebas tituladas irregularmente.

A primeira alternativa, embora juridicamente correta, na prática, no entanto, era inviável. Muitos daqueles títulos já haviam sido desdobrados e o número de proprietários agora somava-se a milhares de pessoas e uma ação judicial dessa natureza, por si só já é morosa, acrescido do fato do assoberbamento de serviço que acarretaria ao judiciário, cuja precariedade de material, pessoal e mesmo o próprio volume de ações que seriam cometidas aos magistrados - que hoje já atingem o limite do incomensurável - inviabilizaria essa primeira alternativa.

Por outro lado, havia toda uma pressão social de natureza política e econômica a reclamar soluções urgentes, isto porque a regularização fundiária dessas glebas, titulando aqueles que efetivamente se encontravam na posse dos lotes nelas inseridos, representava, não só um aumento do mercado consumidor, bem ainda, possibilitaria um aumento da produtividade da terra a fim de satisfazer as necessidades do mercado interno e a captação de divisas através da exportação (...) para o mercado internacional, promovendo, por outro lado, ajá decantada Justiça Social.

Optou-se, assim, pela segunda alternativa - a desapropriação por interesse social - por ser esta a medida jurídica que mais de perto atende aos anseios dos agricultores, o que, uma vez imitido na posse e transcrita a área em _ nome do INCRA possibilitaria ao órgão titular os que na posse da terra estão possibilitando-os a obter crédito bancário para o crescimento de suas lavouras, desenvolvendo, por outro lado, outras atividades afins (comércio, indústria, etc.), em toda região." (Mantida a redação original).

Conforme se constata da manifestação do expropriante, a escolha da ação de desapropriação. em lugar das outras ações. deu-se em razão da necessidade e urgência do caso concreto, vale dizer, para fazer cessar os conflitos e o derramamento de sangue, necessitava o !NCRA imitir-se imediatamente na posse dos imóveis titulados ilegalmente pelo Estado do Paraná, o que só seria possível por meio de ação onde houvesse previsão de liminar imissão na posse, ou seja: a expropriatória. Não é demais lembrar, também, que a ação expropriatória, ajuizada sob a égide do Decreto-lei n. 554, de 25.04.69, trazia ainda outra vantagem, pois permitia a transcrição, ab initio, do bem expropriado em nome do expropriante (arts. 6° e 7°), possibilitando ao !NCRA titular, desde logo, os imóveis em nome das pessoas que verdadeiramente os tomavam úteis e produtivos (quais sejam, aquelas pessoas que detinham a posse fisica das terras em litígio e as cultivavam).

Importante lembrar que esse "procedimento" adotado pelo !NCRA já é do conhecimento do TRF da 4a Região, conforme se vê nas notas taquigráficas constantes do julgamento dos Embargos de Declaração na AC n. 96.04.58585-1:

"Juíza Sílvia Goraieb (Presidente):
Até hoje não entendi como o !NCRA desapropriou essas áreas, sabendo que eram da União.

Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira (Repres. do Min. Público): O !NCRA afirma que essa era a forma mais ágil de regularizar a situação do conflito.

Juiz José Germano da Silva (Relator):
Estava morrendo gente em 1974. O Governo tinha de tomar uma providência.

Certo ou errado, o fato é que o INCRA foi bem sucedido no seu intento. Com as desapropriações e a outorga de títulos às pessoas que realmente ocupavam e produziam naquelas terras, a paz voltou à região, tanto que os imóveis, que haviam sofrido razoável desvalorização em razão do conflito, com o fim desse, novamente voltaram a valorizar-se.

Aqui estão, pois, as peculiaridades das ações expropriatórias levadas a efeito pelo INCRA na Região Oeste do Estado do Paraná na década de 1970: o INCRA, mesmo ciente de que as "terras devo lutas" alienadas pelo Estado do Paraná na "faixa de fronteira" integravam o patrimônio da União, "optou" por desapropriá-las porque essa era a única medida judicial, dadas as suas características (possibilidade de liminar imissão na posse e transferência do bem para o expropriante), que poderia rapidamente pôr fim à violência que se instaurara na região, o que não sucedia com as outras medidas à sua disposição - ação discriminatória, ação de anulação de títulos dominiais etc. -, por serem de tramitação mais morosa, apesar de serem processualmente mais adequadas, como bem reconheceu o próprio expropriante. Daí é que, em razão desses caracteres particulares, entendo que tais desapropriações devem ser tratadas de forma diferenciada".

A desapropriação consiste no procedimento através do qual o Poder Público incorpora para o seu patrimônio, compulsoriamente, a propriedade do particular, fundado em um interesse público.
A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira, pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.
Destarte, ninguém pode transferir o que não tem, tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).
Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.
É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).
Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência.

(Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).

O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual.
Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.
Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que:

A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação.
(Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310).

Finalmente, acerca da novel política de nulidades do Código Civil, merecem transcrição os ensinamentos da abalizada doutrina, verbis:

A invalidade é gênero, no qual se distinguem duas espécies: a nulidade e a anulabilidade. Entre os vários critérios de distinção, o mais destacado é a causa de cada um: enquanto na invalidade há uma afronta mais grave, por conta de um motivo de interesse público, a anulabilidade resulta de uma desconformidade menos grave, tutelando-se um interesse particular (v. comentários ao art. 171). Aduz-se, também, caracterizando a nulidade, a legitimidade mais ampla para invocá-la, podendo ser pronunciada mesmo de ofício pelo juiz (art. 168) e a insuscetibilidade de confirmação ou convalescimento pelo tempo (art. 169), além do polêmico critério distintivo da retroatividade dos efeitos de sua declaração (v. comentários ao art. 182).

Para maioria da doutrina, a classificação entre nulidade absoluta e nulidade relativa, abandonada pelo CC1916, equivale à atual distinção entre nulidade a anulabilidade (nesse sentido: Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, p. 633; Silvio Rodrigues, Direito Civil, p. 292; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso, pp. 399 e ss.). Em contraposição, alguns autores, como Francisco Amaral (Direito Civil, p. 526), Antônio Junqueira de Azevedo (Negócio Jurídico e Declaração Negocial, p. 112) e Leonardo Mattietto ("Invalidade", p. 321), salientam serem ambas subspécies de nulidade (justificadas por interesse público) distintas apenas na legitimidade para sua argüição. A jurisprudência, contudo, continua a usar os termos "nulidade absoluta" e "nulidade relativa" como equivalentes à nulidade e à anulabilidade (STJ, 4ª T., Resp. 246.824, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julg. 21.03.2002, publ. DJ. 29.04.2002).

Enfim, a hipótese de nulidade é fixada no interesse de toda a coletividade, tendo alcance geral e eficácia erga omnes. O negócio nulo fica privado de produzir efeitos jurídicos por ter sido realizado em ofensa grave aos princípios de ordem pública.

O sistema jurídico aplica uma sanção aos negócios praticados em violação à norma jurídica congente, sepultando-os em sua origem. Neste sentido, a jurisprudência acolhe a nulidade como sanção, e não como vício (STJ, 5ª T., Resp. 149.906, Rel. Min. Felix Fischer, julg. 20.02.1997, publ. DJ. 24.03.1997).

Na lição de Clóvis Bevilaqua, "esta reação é mais enérgica, a nulidade é de pleno direito, e o ato é nulo quando ofende princípios básicos da ordem jurídica, garantidores dos mais valiosos interesses da coletividade. É mais atenuada a reação, a nulidade é sanável e este é apenas anulável quando os preceitos violados se destinam, mais particularmente, a proteger interesses individuais (Código Civil, p. 331).

Leonardo Mattietto destaca, no entanto, a imprecisão técnica na utilização da expressão nulidade de pleno direito, uma vez que a nulidade, em nosso sistema, depende sempre de declaração judicial ("Invalidade", p. 320).

O exame da matéria submete-se ao princípio da conservação dos atos e negócios jurídicos, segundo o qual, na palavras de Antônio Junqueira de Azevedo, "tanto o legislador quanto o intérprete, o primeiro, na criação das normas jurídicas sobre os diversos negócios, e o segundo, na aplicação dessas normas, devem procurar conservar, em qualquer um dos três planos - existência, validade e eficácia -, o máximo possível do negócio realizado pelo agente.

(Negócio Jurídico - Existência, p. 64). ) (Gustavo Tepedino, et. al. Código Civil Interpretado Conforme a Constituição, vol. I, Renovar, p.309⁄310).

No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Beviláqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, 5. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


Destarte, a adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu,a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.

Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99, verbis:

CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.

A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria, o que encerra figura assemelhada à confusão.

Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.

In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado do
Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências as entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelos juízos de primeira instância.

Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis.

TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.

I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.

II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.

III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".

Nesse sentido, merece destaque as fundamentações proferidas pelo então Ministro Aliomar Baleeiro, verbis:

" É histórico que, no Brasil, de início, todas as terras foram públicas, em virtude da posse que Pedro Álvares Cabral tomou da descoberta em nome e para o domínio do rei de Portugal. A conquista dilatou para o poente a posse histórica inicial até os confins do oeste. De começo, o território colonial foi uma vasta fazenda da Corôa Portuguesa - parte da "minha real Fazenda", - como escreviam em leis e alvarás os monarcas lusos, referindo-se à universalidade dos bens públicos.

Essas terras passaram ao domínio nacional com a independência e, por força do art. 64, da Constituição Federal de 1.891, vieram a pertencer aos Estados-Membros de sua situação.

É certo que, desde de a primeira metade do século XVI, começou o processo de desmembramento pelas sesmarias e datas, a partir do litoral atlântico, até atingir o oeste remoto.

Mas a validade de cada desmembramento depende do título expedido por uma autoridade pública competente.

Depois de uma legislação fragmentária e extravagante, a Assembléia Geral do Império do Brasil dispôs sobre essa matéria de terras devolutas na Lei n.º 601, de 18.09.1850, que proibiu a cessão gratuita e veio a ser regulamentada pelo Dec. n.º 1.318, de 1.854. Ora, essa primeira lei nacional de terras determinou que ficasse reservada uma faixa ao longo das fronteiras, numa largura de 10 léguas, para sua proteção militar e colonização. De então pro diante, essa faixa nuca deixou de pertencer à União, porque não foi atingida pelo art. 64, da C.F. de 1.891, desde que esse dispositivo ressaltou expressamente para o domínio nacional a porção de território indispensável à defesa das fronteiras, etc. Não revogou, mas confirmou a lei de 1.850, que estabelecia a largura daquela porção de terras nos limites com o território estrangeiro. Logo nos primeiros anos da República, tentaram os Estados dilatar o sentido do art. 64, da C.F de 1891, pretendendo até que no conceito de terras devolutas entravam os terrenos ribeirinhos e os de marinha. Mas isso não prevaleceu, desde a reação do Senado, em 1.892, rejeitando um projeto nesse sentido, até o veto de Prudente Morais a outro semelhante, em 1896.

A C.F. de 1.946, em cuja vigência Mato Grosso vendeu as terras aos Réus, inclui no rol de bens da União, as ilhas fluviais nas zonas limítrofes, com outros países e a porção de terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, etc.

É incontestável nem foi constatado pelos réus que a área comprada por estes, em 1.955, constitui parte duma ilha fluvial na zona limítrofe com outro país. Além disso, estava na faixa de fronteira desde a delimitação da lei de 1.850 até os diplomas em vigor ao tempo da venda celebrada por Mato Grosso.

O art. 5º do Dec. Lei n.º 9.760, de 05.09.46, que regula de modo geral os bens da União, conceitua no art. 5º, as terras devolutas na faixa de fronteira, e em nenhuma das suas categorias poderá ser enquadrado aquele polígono que o Estado vendeu aos réus sem ter o domínio dele.
(...)

O Supremo Tribunal Federal, reiteradas vezes, depois do Decreto Lei n.º 9.760, tem firmado o domínio da União sobre as terras de fronteiras, repelindo as investidas e venda do Paraná, inclusive em ação deste contra aquela (...).

Porque o domínio da União na área dos confins é a continuação daquel'outro resultante da posse histórica de 1.500 e da conquista posterior, e porque essa faixa não se compreende nas terras devolutas transmitidas pela C.F. de 1.891 aos Estados membros, está livre de provar seu domínio. Este é pleno iure. O particular é que terá o ônus de provar que sua área foi desmembrada legitimamente do patrimônio público em algum tempo por um título idôneo ou por algumas das formas de aquisição toleradas pelo Dec. Lei n.º 9.760 de 1.946 imamovial (sic) ou praescriptio longis simi temporis consumada ante do C.C (...)". (STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)

No mesmo sentido, os seguintes precedentes daquele Pretório Excelso:

"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)
Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. é verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)

À guisa de exemplo, recentes precedentes desta E. Corte:

TERRAS DEVOLUTAS SITUADAS NA "FAIXA DE FRONTEIRA". TRANSFERÊNCIA A NON DOMINO PELO ESTADO DO PARANÁ. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO COM FINALIDADE REIVINDICATÓRIA. CONFLITOS FUNDIÁRIOS. PARTICULARIDADES QUE VIABILIZARAM A AÇÃO. LEGITIMIDADE DO ESTADO DO PARANÁ. SENTENÇA EXTRA PETITA E FALTA DE INTERESSE. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. SÚMULA 284⁄STF.

I - Quanto ao recurso do Espólio de José de Moura Torres, interposto com base unicamente em divergência jurisprudencial, verifica-se que o recorrente não apontou qual o dispositivo legal que teria sofrido interpretação divergente. Incidência da súmula 284⁄STF. Precedentes: REsp 468944⁄RS, Rel.Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ 12.05.2003 e AgRg no REsp 994910 ⁄MG, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJ 23.04.2008 e REsp 907.966⁄RO, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI , DJ 09.04.2007 p. 244.

II - Tendo o Estado transferido terras a non domino situadas na "faixa de fronteira" de domínio da União, para particulares, os quais por sua vez estão sendo desapropriados pelo INCRA, a solução da controvérsia, em tese, poderá afetar sua esfera jurídica, remanescendo patente a legitimidade do Estado do Paraná.

III - A ação utilizada pelo INCRA para outorga de títulos das pessoas que realmente ocupavam e produziam nas terras em conflito foi a mais apropriada nas circunstâncias apresentadas. Mesmo ciente de que as "terras devolutas" alienadas pelo Estado do Paraná na "faixa de fronteira" integravam o patrimônio da União, agiu acertadamente o INCRA ao optar pela desapropriatória ao invés de outras medidas reivindicatórias, não havendo se falar em inadequação. Inexistente a violação ao artigo 267, VI, do CPC.

IV - No que concerne à pretensa existência de decisão extra petita, como o próprio recorrente afirma, o Instituto recorrido, em sua peça exordial, pugna pela imissão na posse das áreas, impugnando o domínio ilegítimo dos expropriados. O fato de se aludir à eventual obtenção de tal declaração em ação própria não veda o julgador a apresentar desde logo tal declaração, máxime, como in casu ocorreu, quando vislumbrar que o exame do domínio é precedente à desapropriação.

V - A ratificação de títulos concedidos em área de fronteira descrita na Lei nº 9.871⁄1999 está direcionada ao detentor da posse, sendo certo que os procedimentos ulteriores a cargo do INCRA para declarar a nulidade das terras no âmbito administrativo não vedam a opção pela via judicial, tendo em vista as peculiaridades das questões envolvidas.

VI - Recurso especial do ESPÓLIO DE JOSÉ DE MOURA TORRES não conhecido. Recurso especial do ESTADO DO PARANÁ improvido.

(REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12.08.2008, DJe 25.08.2008)


ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL AJUIZADA PELO INCRA. ÁREA SITUADA EM FAIXA DE FRONTEIRA.
ESTADO DO PARANÁ. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284⁄STF. ANÁLISE DA LEGITIMIDADE DOS TÍTULOS NA AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. PROPRIEDADE DO IMÓVEL E EXISTÊNCIA DE DANO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7⁄STJ.

1. É pressuposto de admissibilidade do recurso especial a adequada indicação da questão controvertida, com informações sobre o modo como teria ocorrido a violação a dispositivos de lei federal. Súmula 284⁄STF.

2. Esta Corte, por diversas vezes, assentou o entendimento de que "in casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado do Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis" (REsp 721.768-PR, 1ª Turma, Min. Luiz Fux, DJ de 18.06.2008).

3. No mesmo sentido, são os julgados da 1ª Turma desta Corte, todos da relatoria do Min. Luiz Fux: REsp 728.795⁄PR, DJ de 19.06.2008;
REsp 825.685⁄PR, DJ de 19.06.2008; REsp 842.056⁄PR, DJ de 19.06.2008;REsp 848.965⁄PR, DJ de 19.06.2008; REsp 850.935⁄PR, DJ de 18.06.2008.

4. Incide o óbice da Súmula 7⁄STJ quanto às alegações da recorrente de que já fez prova de ser a proprietária do imóvel objeto da ação e à ocorrência de danos decorrentes da expropriação levada a efeito, pois o Tribunal de origem, ao analisar tais questões, posicionou-se no sentido de o imóvel jamais fugiu ao domínio da União e que se trata de hipótese em que não há que se falar em prejuízos aos ditos 'expropriados' que, por jamais exercerem qualquer das faculdades inerentes ao domínio das terras sob análise, nada sofreram com a retomada, pela União, da propriedade de terras que, em realidade, sempre lhe pertenceram. Nesse panorama, tendo-se que as especiais circunstâncias de fato levadas em consideração no acórdão recorrido não podem ser revistas em sede de recurso especial, não merece ser conhecida, no ponto, a pretensão recursal.

5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido.
(REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.08.2008, DJe 20.08.2008)


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.

1. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.

2. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).

3. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que: "Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.

É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).

Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).

4. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


5. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, 5. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003;


Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


6. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


7. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis: CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.
§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


8. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


9. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


10. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos

- expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


11. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis: "TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".

(...) Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


12. No mesmo sentido: "TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO.

RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964) TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO.
USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art.200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ.
09.11.1973)


13. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


14. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


15. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 933.901⁄PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.06.2008, DJe 25.06.2008)


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


2. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


3. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que: "Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.


É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).


Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).


4. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;


Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.


Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.


Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


5. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, 5. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003;

Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


6. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


7. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis: CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processos Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


8. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


9. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


10. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


11. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis: "TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".

(...) Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


12. No mesmo sentido: "TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO.

RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964) TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO.
USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ.
09.11.1973) 13. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


14. O prequestionamento é requisito essencial à apreciação do recurso especial. Ante à sua ausência, impõe-se a aplicação da Súmula 282⁄STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada".


15. Inadimissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo". (Súmula 211 do STJ).


16. É entendimento pacífico nesta Corte Superior que quando a matéria controvertida não foi apreciada pela instância originária, ainda que tenha surgido no próprio acórdão recorrido, obsta-se o conhecimento do apelo extremo.


17. Recurso especial do Ministério Público Federal não conhecido.


18. Recurso especial do INCRA provido.
(REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03.06.2008, DJe 19.06.2008)

Ex positis, conheço parcialmente dos recursos especiais e, nesta parte, DOU-LHES PROVIMENTO.
É como voto.


Documento: 833791 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 06/08/2009