sábado, 19 de setembro de 2009

DESAPROPRIAÇÃO EM FRONTEIRA PARANÁ: Determina-se o Imediato Pagamento das Indenizações


O objetivo da presente matéria, é formular as perguntas e obter as respostas mais que definitivas, terminativas; estás, perguntas e respostas formuladas e respondidas pelos Tribunais.

Superado os destaques, a decisão na sua íntegra, segue-me abaixo.


FONTE:

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4º REGIÃO.

PERGUNTAS E RESPOSTAS EXTRAÍDAS DA DECISÃO QUE SE PUBLICA A ABAIXO.



1º) “Mas, então, resta perguntar: Quando e em que sede travar-se-ia a discussão sobre a validade do título ? A resposta é simples: a União deveria ajuizar, logo após prolatada a sentença, ação dominial, em que buscaria, além do reconhecimento de sua propriedade, o desfazimento do título de propriedade e cancelamento do respectivo registro”.


2º) “... perguntar-se, agora: qual o fundamento sobre o qual repousa a recusa do INCRA em indenizar o Autor ? Certamente, não é a validade do título de propriedade, pois que pessoas portadoras dos mesmos papéis houveram-nos como ratificados como a própria autarquia reconhece explicitamente. Ao expropriado, faltar-lhe-ia o requisito da posse”.


3º) “Mas, quem demonstrou tal ausência de posse, que a propriedade em si mesma faz presumir, vez que "será deferida a posse a quem evidentemente tiver o domínio, se com base neste for ela disputada" ? Debalde retrucar que o domínio da União é que é o evidente, porque exposto em sede constitucional, porquanto se sabe que há terrenos da faixa de fronteira pertencentes a particulares; e, conforme já se viu, o próprio INCRA já reconheceu a propriedade de muitos daqueles que detentores do mesmo título”.


4º) “Anote-se, mais, porque relevante, que a discussão dominial havia de travar-se entre a União e o expropriado; o Ministério Público, evidentemente, é parte ilegítima passiva concernentemente ao tema. Assim, além de não se prestar a ação civil pública para o escopo, a relação processual na ação civil pública está flagrantemente mal formada”.


5º) “Ora, com a desapropriação, por sentença passada em julgado, a propriedade passou ao INCRA, que, irrecusavelmente, é pessoa jurídica diversa da União”.


6º) “A escolha da área para desapropriar, esta sim, situa-se em área de oportunidade e conveniência; é assunto político, e o juiz não se faz substituir ao administrador; mas o tratamento igualitário é direito subjetivo de quem se encontre em igual situação”.


7º) “Despiciendo dizer-se agora que as terras já pertenciam à União; seria admitir que o processo desapropriatório havido, chegado a termo, com trânsito em julgado da sentença respectiva, não passa de simulacro, de fingimento, nada guardando de seriedade. Fazer-se tabula rasa da sentença passada em julgado é temerariamente rir da Justiça”.


JURISPRUDÊNCIAS:

Supremo Tribunal Federal: Reclamação nº 1.169/PR

Superior Tribuna de Justiça: Recurso Especial nº 463762/PR

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2003.04.01.056175-5/PR

Publicado no D. J. U em 13/07/2005.

DA IDENTIDADE FACTUAL E JURÍDICA ENTRE AS AÇÕES:
CIVIL PÚBLICA; E DECLARATÓRIO DE NULIDADE DE TÍTULOS.


“Encontro identidade factual e jurídica entre a decisão ora em análise e aquela, também da lavra do i. Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, lançada no bojo de ação desapropriatória, que determinava a suspensão dos pagamentos das indenizações sob o fundamento de que tramitava Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal, na qual se discutia o domínio da área.”


SOBRE A LEGISLAÇÃO PRÓPRIA PARA AS DESAPROPRIAÇÕES EM FRONTEIRA NO ESTADO DO PARANÁ.

“...Nenhuma situação de beligerância pode pretextar tamanha distorção de figuras jurídicas, improvisando-se uma legislação sui generis, uma desapropriação com negativa da propriedade, um depósito de uma indenização que não se pretende pagar, autarquia desapropriando bem que pretende seja da União; enfim, toda uma série de absurdos com conseqüências igualmente absurdas, tal como a utilização de ação civil pública para discussão de domínio”


RECLAMAÇÃO Nº 1.169 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

"Em um primeiro momento, há que se considerar que desapropriação não é remédio judicial para anulação de títulos dominiais. Entender que o depósito realizado foi uma mera ficção, porquanto nada havia para indenizar, quer em relação a quem havia a posse, quer em relação a quem jamais a exerceu, é adentrar na esfera do inimaginável, trabalhando no abstrato, sem âncoras quaisquer a estabelecer mínimo nexo com o universo fático. Houve uma desapropriação, chegada a termo, com trânsito em julgado. Reclamação não é remédio processual para afastar a res judicata, principalmente quando esta se mostra definitiva, ultrapassado o prazo da rescisória. A respeito, o MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE , no julgamento da RCL 1169-PR"


"Ora, é firme o entendimento do STF no sentido de que a reclamação, não sendo sucedâneo da ação rescisória, é incabível contra decisão transitada em julgado (v.g. Rcl 365, Moreira Alves, DJ de 7.8.92 e Rcl 603, Velloso, DJ 12.2.88; Rcl /Ag Rg) 1.901-SP, rel. Ministro Celso de Mello, 3.10.2001; Rcl (AgRg) 1.108-SP, rel. Ministro Nelson Jobim, 15.2.2001. (RCL 1108)".


"Na espécie, vale frisar, as decisões reclamadas transitaram em julgado antes do ajuizamento da reclamação-este ocorrido em 11.10.99".


RECURSO ESPECIAL Nº 463762/PR SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANULAÇÃO DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE. SUSTAÇÃO LIMINAR DO LEVANTAMENTO DO PREÇO. COMPETÊNCIA FUNCIONAL.

1. O juiz da ação em que se discute a dúvida fundada sobre o domínio de bem desapropriado, cujo preço encontra-se depositado, não é competente para determinar a sustação do pagamento. A competência é do juízo da ação expropriatória.

2. Tratando-se de competência funcional, admite-se sua verificação em qualquer tempo e grau de jurisdição.

3. Recursos improvidos, determinando-se o imediato levantamento do saldo remanescente depositado na ação desapropriatória.

(RESP n. 463762/PR - Relator p/ acórdão Ministro Paulo Medina, julgamento em 21.10.2003).


Tais fundamentos, aliado ao fato de que os expropriados penam há quase 30 anos para receber os valores devidos a título de indenização, tenho por conformados os pressupostos que devem concorrer para outorga da antecipação da tutela recursal, a qual defiro.

ÍNTEGRA DA DECISÃO

Publicado no D.J.U. de 13/07/2005


AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2003.04.01.056175-5/PR
RELATOR : Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
AGRAVANTE : EUCLIDES JOSE FORMIGHIERI e outro
ADVOGADO : Jose Alberto Dietrich Filho e outro
AGRAVADO : UNIAO FEDERAL
ADVOGADO : Luís Henrique Martins dos Anjos
AGRAVADO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
ADVOGADO : Marcelo Ayres Kurtz e João Carlos Bohler


DECISÃO

Questionam os recorrentes a decisão exarada pelo i. Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, da 1ª Vara Federal de Umuarama/PR, que, na ação de nulidade dos registros imobiliários lançados nas matrículas ns. 4.229, 4.230, 6.304, 22.080; 22.267 e 33.579, todas do Cartório de Registro de Imóveis de Cascavel, originários do imóvel rural denominado Colônia Pindorama, deferiu tutela de urgência determinando a suspensão do levantamento de qualquer valor de indenização, inclusive honorários advocatícios, depositados na Ação de Desapropriação n. 95.5010647-0, em trâmite naquela 1ª Vara Federal, e cujo objeto é a expropriação dos imóveis relacionados com os registros impugnados.

Há pedido de efeito suspensivo.

Encontro identidade factual e jurídica entre a decisão ora em análise e aquela, também da lavra do i. Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, lançada no bojo de ação desapropriatória, que determinava a suspensão dos pagamentos das indenizações sob o fundamento de que tramitava Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal, na qual se discutia o domínio da área. Ao apreciar o conteúdo desta decisão, em sede de embargos de declaração, os quais foram acolhidos para dar provimento ao AI n. 2003.04.01.000302-0 e reformá-la, assim me manifestei:

A vexata quaestio das desapropriações em faixa de fronteira no Estado do Paraná houve, desde seu início, um tratamento juridicamente teratológico, que todo esforço dos procuradores da autarquia não logram justificar. Nenhuma situação de beligerância pode pretextar tamanha distorção de figuras jurídicas, improvisando-se uma legislação sui generis, uma desapropriação com negativa da propriedade, um depósito de uma indenização que não se pretende pagar, autarquia desapropriando bem que pretende seja da União; enfim, toda uma série de absurdos com conseqüências igualmente absurdas, tal como a utilização de ação civil pública para discussão de domínio.

Em um primeiro momento, há que se considerar que desapropriação não é remédio judicial para anulação de títulos dominiais. Entender que o depósito realizado foi uma mera ficção, porquanto nada havia para indenizar, quer em relação a quem havia a posse, quer em relação a quem jamais a exerceu, é adentrar na esfera do inimaginável, trabalhando no abstrato, sem âncoras quaisquer a estabelecer mínimo nexo com o universo fático. Houve uma desapropriação, chegada a termo, com trânsito em julgado. Reclamação não é remédio processual para afastar a res judicata, principalmente quando esta se mostra definitiva, ultrapassado o prazo da rescisória. A respeito, o MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE , no julgamento da RCL 1169-PR (fls. 826 destes autos), ministra:

"De acordo com as certidões de f. 1.270/1.272, as decisões reclamadas transitaram em julgado nos dias 20.5.99 (Ap.Cível 92.04.13008-3), 21.2.95 (Ap. Cível nº 92.04.22070-8) e 2.5.95 (Ap. Cível 92.04.22069).

Ora, é firme o entendimento do STF no sentido de que a reclamação, não sendo sucedâneo da ação rescisória, é incabível contra decisão transitada em julgado (v.g. Rcl 365, Moreira Alves, DJ de 7.8.92 e Rcl 603, Velloso, DJ 12.2.88; Rcl /Ag Rg) 1.901-SP, rel. Ministro Celso de Mello, 3.10.2001; Rcl (AgRg) 1.108-SP, rel. Ministro Nelson Jobim, 15.2.2001. (RCL 1108).

Na espécie, vale frisar, as decisões reclamadas transitaram em julgado antes do ajuizamento da reclamação-este ocorrido em 11.10.99 - o que torna impertinente a invocação do decidido na Rcl 509 (Pertence, DJ 4.8.00), quando o Tribunal assentou que 'ajuizada a reclamação antes do trânsito em julgado da decisão reclamada, e não suspenso liminarmente o processo principal, a eficácia de tudo quanto nele se decidir ulteriormente, incluído o eventual trânsito em julgado do provimento que se tacha de contrário à autoridade de acórdão do STF, será desconstituída pela procedência da reclamação.'

A jurisprudência que não admite a reclamação para desconstituir decisão com trânsito em julgado é de ser mantida.

Com precisão nota, a respeito, o parecer sobre o caso do d. Eduardo Ribeiro:

'Se de singular importância se preserve a autoridade dos julgados do Supremo Tribunal Federal, não sendo sem razão que ao instrumento a isso destinado se haja emprestado dignidade constitucional, não é menos exato que a coisa julgada constitui valor de especial relevo, não podendo nem mesmo a lei atingi-la. Indispensável à segurança e à paz social que, uma vez tornado imutável o julgado, pela exaustão da possibilidade de recursos, se alcance tranqüilidade quanto ao bem da vida garantido pela sentença. Não se compatibiliza com nosso sistema possa, a qualquer tempo, ser desconstituída a coisa julgada, o que importaria negar sua finalidade precípua.
Para a reclamação, admissível tanto no Supremo Tribunal como no Superior Tribunal de Justiça, não há previsão de limite temporal. Desse modo, a aceitar-se não encontre aquela limitação, décadas depois do trânsito em julgado, estaria a sentença exposta a ser retirada do mundo jurídico. Isso significaria que o exercício da função jurisdicional não traria nunca a segurança que constitui, exatamente, uma de suas razões de ser.

Jamais se poderá saber se determinado bem está incorporado ao patrimônio jurídico de alguém, pois subsistiria a permanente ameaça de ser dele retirado, por entender-se que contrariada decisão do Supremo ou do STJ.

Na vigência da Constituição de 1988 essa questão foi objeto de exame, pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a Reclamação 509. Vossa Excelência, que a relatou, chegou a afirmar que, na reclamação, 'sempre se teve por dogma que a coisa julgada é inatacável.' Em vista de observações aduzidas pelo Ministro Moreira Alves, admitiu, em seguida, uma distinção, tendo como certo que 'ajuizada a reclamação antes do trânsito em julgado da decisão reclamada ela é admissível, e não suspenso liminarmente o processo, o que se nele vier a decidir ficará desconstituído pela eventual procedência da reclamação.' Esse o entendimento estampado na ementa do acórdão.
..............................................................................................................................'.Nem cabe redargüir, como o fez o em. Procurador-Geral., que as decisões reclamadas, 'por ofenderem a coisa julgada advinda do v. acórdão prolatado por esta Suprema Corte, jamais transitaram em julgado, eis que fulminadas de nulidade absoluta...'

Não é certo, data venia, que a sentença contrária a decisão transitada em julgado - ainda que promanada do Supremo Tribunal - seja eivada de nulidade absoluta: do contrário, não seria a ofensa à coisa julgada uma das hipóteses de rescindibilidade da sentença passada em julgado, sujeita porém à ação rescisória, ao prazo bienal de decadência.

Decadência cujos efeitos - bem por isso - não é de admitir possa a reclamação desfazer a qualquer tempo."

Com tais argumentos, foi rejeitada reclamação contra os acórdãos deste Tribunal que reconheceram válida a desapropriação especificamente em relação a EUCLYDES JOSÉ FORMIGHIERI (Reclamante: Procurador Geral da República, Reclamado este Tribunal, interessado EUCLYDES JOSÉ FORMIGHIERI)

Ora, se existe uma reclamação específica, cujo mérito não chegou a ser alcançado em homenagem à coisa julgada, como pretender que decisões de mérito de reclamações outras, concernentes a outros processos, que não guardam vínculo com o expropriado Formighieri, possam embasar decisão jurídica neste processo ? Seria uma forma de tomar emprestado de processos alheios um julgamento que o Supremo Tribunal Federal não quis fazer no caso cujo exame lhe estava submetido, porque não havia pressuposto para tal. Guarda razão, portanto o agravante, quando aponta contradição no acórdão, consistente esta em tomarem-se decisões de processos alheios enquanto rejeitada aquela que específica do feito.

E, falando-se em coisa julgada, estamos diante de uma desapropriação chegada a termo, com trânsito em julgado. Segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO ("Curso de Direito Administrativo", 13ª Edição, Malheiros, p. 711, "do ponto de vista teórico, pode-se dizer que desapropriação é o procedimento através do qual o Poder Público, compulsoriamente despoja alguém de sua propriedade e a adquire, mediante indenização, fundada em interesse público."

WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO ("Curso de Direito Civil", 3º vol, 27ª Edição, Saraiva, p. 171), após incluí-la dentre as maneiras de perder-se a propriedade, firma que "realmente, pela expropriação, o titular perde a propriedade, que se transfere, por necessidade ou utilidade pública, e também por interesse social, para o patrimônio do expropriante. No interesse da coletividade, opera-se a passagem do domínio para a entidade que promova a desapropriação."

Esta passagem para o domínio da autarquia já ocorreu. Despiciendo dizer-se agora que as terras já pertenciam à União; seria admitir que o processo desapropriatório havido, chegado a termo, com trânsito em julgado da sentença respectiva, não passa de simulacro, de fingimento, nada guardando de seriedade. Fazer-se tabula rasa da sentença passada em julgado é temerariamente rir da Justiça. O que se pode dizer, na hipótese vertente, com razão, é que a desapropriação havida ficou pendente de discussão quanto à validade do título de propriedade, sobre que o expropriante, desde a exordial, ressalvou existirem dúvidas.

Mas, então, resta perguntar: Quando e em que sede travar-se-ia a discussão sobre a validade do título ? A resposta é simples: a União deveria ajuizar, logo após prolatada a sentença, ação dominial, em que buscaria, além do reconhecimento de sua propriedade, o desfazimento do título de propriedade e cancelamento do respectivo registro. Mas, passados já mais de dez anos, não o fez o órgão público. A Ação Civil Pública, evidentemente, não é ação onde se possa resolver sobre domínio, nem guarda força rescisória sobre sentença desapropriatória passada em julgado. Os títulos de propriedade que o expropriado possui não podem ser olimpicamente desconsiderados. São papéis públicos, a que se deve fé enquanto não tornados insubsistentes por decisão judicial.

De perguntar-se, agora: qual o fundamento sobre o qual repousa a recusa do INCRA em indenizar o Autor ? Certamente, não é a validade do título de propriedade, pois que pessoas portadoras dos mesmos papéis houveram-nos como ratificados como a própria autarquia reconhece explicitamente. Ao expropriado, faltar-lhe-ia o requisito da posse. Mas, quem demonstrou tal ausência de posse, que a propriedade em si mesma faz presumir, vez que "será deferida a posse a quem evidentemente tiver o domínio, se com base neste for ela disputada" ? Debalde retrucar que o domínio da União é que é o evidente, porque exposto em sede constitucional, porquanto se sabe que há terrenos da faixa de fronteira pertencentes a particulares; e, conforme já se viu, o próprio INCRA já reconheceu a propriedade de muitos daqueles que detentores do mesmo título. Assevera o INCRA que o reconhecimento de tais título seria "liberalidade". Não vejo como emprestar à Administração discricionariedade nesta área. A escolha da área para desapropriar, esta sim, situa-se em área de oportunidade e conveniência; é assunto político, e o juiz não se faz substituir ao administrador; mas o tratamento igualitário é direito subjetivo de quem se encontre em igual situação. O estabelecimento de um discrimen (ter ou não a posse, como in casu), principalmente quando a questão está pendente em juízo, não pode ser resolvida senão em processo judicial regular, pena de negar-se o contraditório, cerceada a defesa. Verificada a prescrição (art. 172 do Código Civil anterior, c. c. os arts. 2.028 e 205 do Código Civil vigente), não vejo como continuar obstaculizando o levantamento sem malferir seriamente todo o sistema jurídico brasileiro, desrespeitando a res judicata, negando validade a processo regular de desapropriação, confundindo figuras processuais absolutamente distintas, emprestando-lhes escopos que jamais guardaram; enfim, improvisando um processo sui generis, casuisticamente, enquanto o desapropriado intenta em vão levantar a indenização que lhe foi destinada sob condição de solucionamento de uma demanda que a União não quis promover. Ora, com a desapropriação, por sentença passada em julgado, a propriedade passou ao INCRA, que, irrecusavelmente, é pessoa jurídica diversa da União. A transmigração do direito de propriedade ocorreu, com a autoridade e imutabilidade que o trânsito em julgado emprestou à sentença respectiva.

Anote-se, mais, porque relevante, que a discussão dominial havia de travar-se entre a União e o expropriado; o Ministério Público, evidentemente, é parte ilegítima passiva concernentemente ao tema. Assim, além de não se prestar a ação civil pública para o escopo, a relação processual na ação civil pública está flagrantemente mal formada.

A mim não me são estranhos comentários quanto a possíveis favorecimentos políticos que teriam gerado as escrituras de que dispõe o expropriado. Todavia, como explicar a omissão do próprio INCRA e da União em relação ao assunto.

Não bastassem estes significativos argumentos, que para mim, permissa venia, servem ao propósito de desconstituir as razões que estribaram a interlocutória em análise, flagro a ocorrência de error in procedendo do Juízo a quo, ao editar decisão que neutraliza a prestação jurisdicional em outra demanda, a qual, embora também esteja sob sua jurisdição, constitui ação autônoma e independente, não podendo ter seu curso regular bloqueado por ato jurisdicional exarado por autoridade de igual hierarquia; quando muito admitir-se-ia que, ante a notícia da parte interessada acerca da existência da ação de nulificação dos títulos, o Juízo responsável pela ação de desapropriação deliberasse a respeito, sob pena de usurpação de jurisdição. Naquela Ação Civil Pública que noticiei acima, tombada sob n. 98.5010865-7, foi exarada decisão com idêntico alcance, propósito e fundamentos da ora combatida, suspendendo o levantamento de qualquer valor de indenização, inclusive honorários advocatícios, depositados à disposição do Juízo da expropriatória, a qual, contudo, foi cassada por esta Corte Regional, cujo acórdão veio a ser confirmado pelo Egrégio STJ. Na Instância Especial, como fundamento de decidir, o aresto contou exatamente com a configuração de desrespeito à competência funcional, in verbis:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ANULAÇÃO DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE. SUSTAÇÃO LIMINAR DO LEVANTAMENTO DO PREÇO. COMPETÊNCIA FUNCIONAL.

1. O juiz da ação em que se discute a dúvida fundada sobre o domínio de bem desapropriado, cujo preço encontra-se depositado, não é competente para determinar a sustação do pagamento. A competência é do juízo da ação expropriatória.

2. Tratando-se de competência funcional, admite-se sua verificação em qualquer tempo e grau de jurisdição.

3. Recursos improvidos, determinando-se o imediato levantamento do saldo remanescente depositado na ação desapropriatória.

(RESP n. 463762/PR - Relator p/ acórdão Ministro Paulo Medina, julgamento em 21.10.2003).

Tais fundamentos, aliado ao fato de que os expropriados penam há quase 30 anos para receber os valores devidos a título de indenização, tenho por conformados os pressupostos que devem concorrer para outorga da antecipação da tutela recursal, a qual defiro.

Comunique-se.

Intime-se a parte agravada para resposta.
Após, ao Ministério Público Federal.
Publique-se.
Porto Alegre, 16 de março de 2005.


Des. Fed. LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON
Relator

Nenhum comentário: