quarta-feira, 30 de setembro de 2009

DESAPROPRIAÇÕES NO PARANÁ - FOZ DO IGUAÇU





FONTE: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA




PROCESSO ORIGINÁRIO 1ª INSTÂNCIA.


AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO Nº 98.10.11659-4 (PR)
Data de autuação: 15/05/1998
Observação: AREA DE TERRA MEDINDO APROXIMADAMENTE 40.025.5200 HA, DENOMINADA COLONIA RIO QUARTO. DESMEMBRAMENTO DOS AUTOS 87.101.1613-3
Juiz: Sergio Luis Ruivo Marques
Órgão Julgador: JUÍZO SUBSTITUTO DA 01A VF E JEF CÍVEL/PREV DE FOZ DO IGUAÇU
Órgão Atual: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4A REGIÃO
Localizador: GR
Situação: MOVIMENTO
Assuntos:

1. Desapropriação por Interesse Social Comum/ Lei 4.132/62


AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
Advogado: NIRCLESIO JOSE ZABOT

RÉU: JOSE SABINO DE OLIVEIRA


PROCESSO EM 2ª INSTÂNCIA.


REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 2002.04.01.011434-5 (TRF)

Originário: DESAPROPRIAÇÃO Nº 98.10.11659-4 (PR)
Data de autuação: 06/03/2002
Relator: Juíza Federal MARCIANE BONZANINI - 3ª TURMA
Órgão Atual: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Localizador: GR
Situação: MOVIMENTO
Assuntos:

1. Desapropriação por Interesse Social para Reforma Agrária


PARTE AUTORA: JOSE SABINO DE OLIVEIRA

PARTE RE': INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA

Advogado: Marcelo Ayres Kurtz

DESAPROPRIAÇÃO Nº 98.10.11659-4 (PR)



QUESTÕES ESCLARECIDAS FORMANDO JURISPRUDÊNCIA PARA OS PROCESSOS DE DESAPROPRIAÇÃO EM FAIXA DE FRONTEIRA NO ESTADO DO PARANÁ.

TESES EM DEBATE AO FINAL ÍNTEGRA DA DECISÃO.

Nulidade do título de domínio do expropriado não significa impossibilidade jurídica de desapropriação, ligando-se ao mérito da própria ação

Possibilidade de análise em ação de desapropriação, considerando os contornos específicos do caso (violência e disputa de terras concedidas a non domino ), da validade do título de domínio do expropriado.

Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertence, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.

A dúvida relativa ao proprietário privado do imóvel (não é o caso dos autos) é irrelevante para o andamento da desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada pelo Poder Público.

A discussão quanto ao proprietário privado somente é relevante para definir quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de depositar ou apurar o seu quantum .

No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as terras a serem desapropriadas. É evidente que seus imóveis não podem ser objeto de Ação de Desapropriação, muito menos quando por ela intentada.




Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 763.542 - PR (2005/0106944-4)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN


RECORRENTE : ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR : CESAR AUGUSTO BINDER E OUTRO(S)
RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA
AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : MARCELO AYRES KURTZ E OUTRO(S)
INTERES. : JOSÉ SABINO DE OLIVEIRA
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS

DECISÃO

Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição da República, contra acórdão assim ementado:

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. ÁREA SITUADA NA FAIXA DE FRONTEIRA, CONDIÇÕES DA AÇÃO ATENDIDAS. POSSIBILIDADE DE EXAME DA VALIDADE DO TÍTULO DO EXPROPRIADO COMO QUESTÃO PRÉVIA AO DIREITO À INDENIZAÇÃO.

1. Nulidade do título de domínio do expropriado não significa impossibilidade jurídica de desapropriação, ligando-se ao mérito da própria ação. A legitimidade passiva do expropriado é afirmada a partir do título de domínio que possui. O interesse processual deve ser analisado no caso concreto, não meramente a partir da forma processual utilizada. Utilização da ação de desapropriação para regularização fundiária e para estancar situação de violência e disputa por terras.

2. Possibilidade de análise em ação de desapropriação, considerando os contornos específicos do caso (violência e disputa de terras concedidas a non domino ), da validade do título de domínio do expropriado.

3. Remessa oficial provida para anular a sentença.

O recorrente alega ter havido violação dos arts. 128 e 460 do CPC; do art. 2º, §§ 1º e 2º da Lei 9.871/1999; argumentando que:

a) "não é o Estado do Paraná legitimado passivamente para o feito, pois na desapropriação não responderá pela indenização da posse e tampouco é ele atingido pelo ato desapropriatório" (fl. 128);

b) "o presente processo não viabilizava espaço para o reconhecimento da nulidade do título de concessão de propriedade" (fl. 129); e

c) " a questão prejudicial, qual seja, a legitimidade do domínio, deve ser resolvida por meio de procedimento específico ou
ação própria, conforme, inclusive, foi pedido pela autarquia expropriante em sua
petição inicial" (fl. 132).

Contra-razões apresentadas (fls. 157-168).

O Ministério Público Federal opina pelo provimento do Recurso Especial, conforme parecer de fls. 177-182.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, cabe salientar que a tese concernente à ilegitimidade passiva do Estado do Paraná não merece prosperar, tendo em vista que o ora recorrente não apontou quais dispositivos legais deixaram de ser observados pelo acórdão impugnado. Isso porque o STJ entende ser inviável o Recurso Especial, fundado na alínea "a" do permissivo constitucional, que não especifica quais normas legais foram violadas. Incide, na espécie, por analogia, o princípio contido na Súmula 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

Passo ao mérito.

Cinge-se a controvérsia à possibilidade de discussão sobre o domínio público das terras objeto de Ação de Desapropriação, por se tratar, no essencial, de questão atinente à possibilidade jurídica do pedido (alega-se que o bem pertence ao próprio Poder Público expropriante).

É indiscutível que o art. 20 impede, em regra, o debate acerca de domínio nas Ações de Desapropriação:

Art. 20. A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.

De modo coerente, veda-se o levantamento da indenização no caso de dúvida quanto ao domínio (o que pressupõe o depósito pelo expropriante):

Art. 34. O levantamento do preço será deferido mediante prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.

Parágrafo único. Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o preço ficará em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para disputá-lo.

Ao interpretar esses dispositivos, a Segunda Turma tem entendido que seria inviável o debate relativo ao domínio das terras de fronteiras, que deve ser remetido às vias próprias (ação direta – art. 20 do DL 3.365/1941).

Ocorre que esses dispositivos legais, acima transcritos, referem-se, s.m.j., à discussão dominial entre particulares e não são aplicáveis quando a controvérsia recai sobre a possibilidade de desapropriação em si, no caso de o imóvel pertencer ao expropriante. Assim como ninguém pode comprar de outrem o que é seu, tampouco pode a Administração indenizar terceiros por aquilo que integra o domínio público.

Esclareço: se há dúvida quanto ao proprietário privado do imóvel desapropriado, se Tício ou Caio, isso é irrelevante para o andamento da desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada pelo Poder Público, já que a terra não lhe pertence.

Essa discussão quanto ao proprietário privado somente interessa na definição de quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de depositar ou apurar o quantum do depósito.

É por essa razão que o art. 20 do DL 3.365/1941 refere-se à contestação da desapropriação, que é apresentada, evidentemente, pelo expropriado ("A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta").

Não há dúvida, por conseguinte, de que o particular não pode suscitar, em sua resposta processual, o debate a respeito do domínio, pois tal matéria em nada alteraria o contexto jurídico do caso: quem quer que venha a ser considerado o dono verdadeiro, a terra continuará privada e, se o Estado dela precisa, necessário indenizar seus reais proprietários. Nada mais razoável então que debate desta natureza seja feito em outra ação, considerando-se que o procedimento da desapropriatória prestigia o interesse social na imediata imissão na posse e na célere transferência do domínio para o Poder Público. Do contrário, as desapropriações, especialmente para reforma agrária, demorariam dezenas de anos para surtir o efeito prático, tido por urgente pelo Poder Público, isto é, o assentamento dos sem-terra e a conseqüente pacificação social.

Note-se, portanto, que o art. 20 do DL 3.365/1941 é dispositivo inscrito em favor do Poder Público. É paradoxal interpretá-lo de modo a impelir a União a pagar por um imóvel que lhe pertence ou a continuar com uma ação desapropriatória a qual falte o pressuposto jurídico mais importante, vale dizer, a dominialidade alheia do bem!

No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as terras a serem desapropriadas. É evidente que o imóvel da União não pode ser objeto de Ação de Desapropriação, muito menos quando intentada por ela mesma. O debate sobre a propriedade, nessa hipótese excepcional, prejudica a existência da ação expropriatória.

Trata-se, como visto, de óbice ao próprio desenvolvimento válido do processo, cujo enfrentamento não pode ser evitado ou adiado pelo Judiciário, sob pena de condenar absurdamente a União a pagar por imóvel que lhe pertence e foi, a seguir, retitulado em favor dos particulares!

O eminente Ministro Luiz Fux, em diversos processos na Primeira Turma, tem esclarecido com maestria o cerne da questão (REsp 542.056/PR, por ele relatado):

Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.

A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365/41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria, o que encerra figura assemelhada à confusão.

Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.

Como visto, os arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941 referem-se à dúvida dominial entre os particulares. Esse debate, em regra, é irrelevante para o prosseguimento da Ação de Desapropriação, que prestigia o interesse social na imediata imissão na posse e célere transferência do domínio para o Poder Público. O levantamento da indenização pelo particular fica na dependência da solução da controvérsia quanto à propriedade do imóvel.

Os autos tratam de hipótese excepcional e diversa daquela prevista no Decreto-Lei 3.365/1941, o que leva ao afastamento da aplicação da regra em questão.

Os dispositivos citados (arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941) não podem impedir a discussão quanto à possibilidade jurídica do pedido, já que é inviável uma Ação de Desapropriação de imóveis da União situados na faixa de fronteira. Essa matéria não está sendo trazida pela parte expropriada - via contestação, como referida no art. 20 -, mas pela Autoridade desapropriante.

Nesse sentido, precedente da Primeira Seção desta Corte, de minha relatoria, julgado em 12 de agosto de 2009 –

EREsp 783840/PR: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. TERRAS DE FRONTEIRA. DEBATE ACERCA DA PROPRIEDADE PÚBLICA DOS IMÓVEIS. POSSIBILIDADE. CONDIÇÃO DA AÇÃO: POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. ARTS. 20 E 34 DO DL 3.365/1941. INAPLICABILIDADE.
(...)

7. O art. 20 do DL 3.365/1941 impede, em regra, a discussão sobre o domínio nas Ações de Desapropriação. De modo coerente, o art. 34, parágrafo único, veda o levantamento da indenização no caso de dúvida quanto ao domínio (o que pressupõe o depósito pelo expropriante).

8. Ocorre que esses dispositivos legais (arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941) referem-se à questão dominial entre particulares e são inaplicáveis se a dúvida recair sobre a possibilidade de desapropriação, no caso de o imóvel pertencer ao expropriante.

9. A dúvida relativa ao proprietário privado do imóvel (não é o caso dos autos) é irrelevante para o andamento da desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada pelo Poder Público.

10. A discussão quanto ao proprietário privado somente é relevante para definir quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de depositar ou apurar o seu quantum . Por essa razão, o art. 20 do DL 3.365/1941 refere-se à contestação da desapropriação, que é apresentada, evidentemente, pelo expropriado.

11. O art. 20 do DL 3.365/1941 é dispositivo inscrito em favor do Poder Público, que prestigia a celeridade processual e o interesse social.

Seria paradoxal interpretá-lo de modo a compelir a União a pagar por imóvel que lhe pertence.

12. No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as terras a serem desapropriadas. É evidente que seus imóveis não podem ser objeto de Ação de Desapropriação, muito menos quando por ela intentada.
(...)

16. Embargos de Divergência não providos Diante do exposto, nos termos do art. 557, caput, do CPC, nego seguimento ao Recurso Especial.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília (DF), 08 de setembro de 2009.
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator

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