terça-feira, 8 de setembro de 2009

STJ - Anula Indenização por Desapropriação de Terras da União na Fronteira oeste do Paraná


Extraído de: Superior Tribunal de Justiça - 08 de Agosto de 2009
Processos Relacionados : REsp 867016


FONTE: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL Nº 867.016

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou a ação que condenou a União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em indenização por desapropriar terras na fronteira oeste do Paraná. O título de propriedade havia sido conferido pelo estado do Paraná na década de 50, e o Incra realizou a desapropriação na década de 70, a fim de evitar o seguimento de conflitos violentos na região. Mas o STJ reconheceu que a União não poderia desapropriar seus próprios bens, anulando a indenização.

O caso tem origem na década de 50


Os títulos foram concedidos informa a sentença original não aos que já ocupavam as terras, mas a pessoas chegadas ao poder, laranjas e fantasmas que ficaram conhecidos como lavradores do asfalto.


No caso analisado, os expropriados obtiveram na ação original o pagamento da indenização. Após negativa a recurso do Incra, ficou determinado que fossem sacados os depósitos até então em juízo referentes à indenização e afastada a dúvida sobre a propriedade das terras. Essa decisão transitou em julgado isto é, tornou-se irrecorrível em 1999. No entanto, o Incra e a União entenderam que a decisão violava disposição literal da lei, ofendia a coisa julgada e fundava-se em erro de fato, o que autorizava a ação rescisória. A ação foi desprovida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e recurso especial da União e do Incra contra essa decisão levou o caso ao STJ.



EIS A ÍNTEGRA DA DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.


Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudênci
a

RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : UNIÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDEBRANDO FREITAS CAYRES
ADVOGADO : ADILSON AMARO ALVES
EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V, CPC. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP 476.665⁄SP). AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DE TERCEIRO. ART. 287, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA VIA ELEITA. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. O Recurso Especial interposto contra acórdão proferido em sede de ação rescisória pode veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei


2. A Corte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, decidiu que:"(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - RESP 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20.06.2005). Precedentes jurisprudenciais do STJ: AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006 e RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006.


3. A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstituí-lo.


4. Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


5. A doutrina especializada, ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado", deixa assente que o interesse deste, ensejador da legitimação para propositura da rescisória, não pode ser meramente de fato, vez que, por opção legislativa os interesses meramente econômicos ou morais de terceiros não são resguardados pela norma inserta no art. 487 do CPC. É o que se infere, por exemplo, da lição de Alexandre Freitas Câmara, in verbis:

"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.


Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (in "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)


6. In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.


7. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


8. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


9. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

"Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.

É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).

Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).


10. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


11. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


12. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


13. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis:
CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


14. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


15. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


16. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


17. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis:

"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)

Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


18. No mesmo sentido:
"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.
- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.
- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)

TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.

I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.

II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.

III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)


19. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


20. Precedentes: REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ. 25.08.2008; REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ. 20.08.2008; REsp 933.901⁄PR, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, DJ. 25.06.2008; REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ. 19.06.2008.


21. O pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada - proferido o voto do Ministro Relator, após a sustentação oral dos procuradores de ambas as partes - afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., desta relatoria, DJ 27.09.2004.


22. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


23. A ofensa a princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.


24. Recursos especiais parcialmente conhecidos e providos.

ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, por unanimidade, conhecer parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, dar-lhes provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki (voto-vista), Denise Arruda, Benedito Gonçalves e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 05 de maio de 2009(Data do Julgamento)


MINISTRO LUIZ FUX
Relator


ERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA
Número Registro: 2006⁄0148815-9 REsp 867016 ⁄ PR


Números Origem: 200104010247870 9704437366

PAUTA: 04⁄11⁄2008 JULGADO: 04⁄11⁄2008

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX

Presidente da Sessão
Exma. Sra. Ministra DENISE ARRUDA

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA

Secretária
Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : UNIÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDEBRANDO FREITAS CAYRES
ADVOGADO : ADILSON AMARO ALVES

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Fins de Reforma Agrária

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr. ADILSON AMARO ALVES, pela parte RECORRIDA: HILDEBRANDO FREITAS CAYRES.

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Após o voto do Sr. Ministro Relator conhecendo parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, dando-lhes provimento, pediu vista o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki. Aguardam os Srs. Ministros Denise Arruda, Benedito Gonçalves e Francisco Falcão.

Brasília, 04 de novembro de 2008



MARIA DO SOCORRO MELO
Secretária

RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)

VOTO-VISTA
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO. GLEBA SITUADA EM FAIXA DE FRONTEIRA E PARQUE NACIONAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO ART. 555 DO CPC. PEDIDO DE VISTA DOS AUTOS. DESNECESSIDADE DE REINCLUSÃO DO PROCESSO EM PAUTA DE JULGAMENTO. PRECEDENTES. LEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO. RECONHECIMENTO. INDENIZAÇÃO DOS EXPROPRIADOS. INVIABILIDADE, NA HIPÓTESE. PRECEDENTES. RECURSOS ESPECIAIS PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA PARTE, PROVIDOS, ACOMPANHANDO O RELATOR.

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

1.Trazem os autos dois recursos especiais interpostos em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que, em preliminar, julgou pela ilegitimidade ativa da União e, no mérito, julgou improcedente a ação rescisória. O acórdão recorrido foi assim ementado:
"ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. QUESTÃO DE ORDEM APRESENTADA PELO MPF. REJEIÇÃO DE AMBOS OS FUNDAMENTOS. AÇÃO RESCISÓRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO FEDERAL. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. OFENSA À COISA JULGADA. ERRO DE FATO. INOCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO. CUSTAS E HONORÁRIOS.

I. Rejeitada questão de ordem apresentada pelo Ministério Público Federal, tanto quanto à alegação de que não teria sido examinada, pelo Relator, a preliminar de ilegitimidade da União, quanto em relação ao segundo fundamento, no sentido de reincluisão dos autos em pauta.

II. Reconhecida a ilegitimidade ativa da União Federal.

III. A adoção, pelo acórdão rescindendo, de uma das interpretações cabíveis à espécie, não significa violação à literal disposição de lei, mas, ao contrário, coaduna-se com os dispositivos legais apontados como violados.

IV. Improcedem as alegações de ofensa à coisa julgada e de decisão baseada em erro de fato, se as mesmas não restaram demonstradas.

V. Ação rescisória julgada improcedente, com condenação nas custas e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa."
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados. Em seu recurso especial (fls. 529⁄536), a União aponta violação aos seguintes dispositivos: (a) art. 535 do CPC, pois, mesmo com a oposição dos embargos de declaração, o Tribunal de origem não se manifestou quanto às matérias ali indicadas; (b) art. 485, V, do CPC, porque o acórdão recorrido ofendeu os (I) arts. 487, II, do CPC, e 5º da Lei 9.469⁄97, na medida em que possui legitimidade ativa para a causa; (II) arts. 145, II, do CC⁄16 e 20, § 2º, da CF⁄88, porquanto é impossível a desapropriação de área situada no Parque Nacional do Iguaçu, dentro dos limites de faixa de fronteira; (III) art. 5º, caput e XXIV, da CF⁄88, já que "o valor a que chegou a decisão rescindenda está totalmente dissociado da realidade, tendo havido super avaliação do imóvel desapropriado, conclusão que facilmente é possível se chegar mediante análise do preço atribuído ao hectare pelo perito, não precisando para isso ser nenhum expert, até porque para chegar ao valor da terra nua, foi realizada pesquisa de mercado, sem levar em conta que se tratava de área situada dentro do Parque Nacional de Iguaçu, que nunca poderia ser explorada, chegando a preço vinte vezes superior ao de compra" (fl. 535).

O INCRA, em seu recurso (fls. 546⁄577), indica ofensa aos seguintes dispositivos: (a) art. 535 do CPC, pois, mesmo com a oposição dos embargos de declaração, o Tribunal não se manifestou a respeito das matérias ali apontadas; (b) arts. 555, § 2º, do CPC, e 130 do RITRF da 4ª Região, ao argumento de que é nulo o acórdão recorrido, tendo em vista que não houve reinclusão da apelação em pauta de julgamento após pedido de vista; (c) art. 47 do CPC, já que a União tem legitimidade ativa para a causa; (d) arts. 1º e 2º do Decreto-lei 1.942⁄82, porque (I) tal diploma não pode ser aplicado retroativamente; (II) não configurados os requisitos para a posse agrária; (e) arts. 472 do CPC e 1º e 2º do Decreto-lei 2.073⁄40, sob o fundamento de que a área discutida é de domínio da União, sendo, portanto, inviável o pagamento de indenização aos recorridos; (f) art. 15-A do Decreto-lei 3.365⁄41, na medida em que não são devidos os juros compensatórios àquele que não detinha a posse do imóvel, além do que tal bem não pode ser explorado economicamente por estar situado no perímetro do Parque Nacional do Iguaçu.
O relator, Min. Luiz Fux, deu provimento aos recursos especiais, em voto assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V, CPC. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP 476.665⁄SP). AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DE TERCEIRO. ART. 287, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA VIA ELEITA. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. O Recurso Especial interposto contra acórdão proferido em sede de ação rescisória pode veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei


2. A Corte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, decidiu que:"(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - RESP 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20.06.2005). Precedentes jurisprudenciais do STJ: AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006 e RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006.


3. A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstituí-lo.


4. Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


5. A doutrina especializada, ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado", deixa assente que o interesse deste, ensejador da legitimação para propositura da rescisória, não pode ser meramente de fato, vez que, por opção legislativa os interesses meramente econômicos ou morais de terceiros não são resguardados pela norma inserta no art. 487 do CPC. É o que se infere, por exemplo, da lição de Alexandre Freitas Câmara, in verbis:
"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.
Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (in "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)


6. In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.


7. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


8. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


9. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

"Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.
É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).
Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).


10. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


11. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


12. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


13. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis:

CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


14. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


15. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertence, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


16. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


17. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis:


"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)

Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


18. No mesmo sentido:
"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)


TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)
19. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


20. Precedentes: REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ. 25.08.2008; REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ. 20.08.2008; REsp 933.901⁄PR, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, DJ. 25.06.2008; REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ. 19.06.2008.


21. O pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada - proferido o voto do Ministro Relator, após a sustentação oral dos procuradores de ambas as partes - afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., desta relatoria, DJ 27.09.2004.


22. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


23. A ofensa a princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.


24. Recursos especiais parcialmente conhecidos e providos."
Pedi vista.

2.Acompanho o relator quanto (a) ao não conhecimento dos recurso especial em relação à ofensa aos dispositivos constitucionais (arts. 5º, caput e XXIV, e 20, § 2º), já que a competência do STJ, nos termos do art. 105, III, da Constituição, restringe-se à uniformização da aplicação da lei federal infraconstitucional; (b) à inexistência de violação ao art. 535 do CPC; (c) à negativa de reconhecimento da ofensa ao art. 555 do CPC, tendo em vista a orientação jurisprudencial manifestada nos seguintes julgados: EDcl no REsp 445.910⁄MG, 1ª T., Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 16.04.2007; HC


25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ de 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474.475⁄SP, 1ª T., Min. Luiz Fux, DJ de 27.09.2004.


3.Do mesmo modo, acompanho quanto ao reconhecimento da legitimidade ativa da União na hipótese, já que, nos termos do art. 487 do CPC, a ação rescisória pode ser proposta não apenas por quem foi parte no processo originário, mas também pelo terceiro juridicamente interessado. No caso, o interesse da União é evidente, já que, conforme bem destacado pelo relator, "o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título a non domino pelo Estado do Paraná".


4.Quanto ao mais, considerando a orientação firmada pela 1ª Turma (v.g., REsp 953.791⁄PR, Min. Denise Arruda, DJe de 01.10.2008; REsp 842.056⁄PR, Min. Luiz Fux, DJe de 19.06.2008; ) acerca do descabimento da indenização na hipótese, também acompanho o relator.


5.Diante do exposto, conheço parcialmente de ambos os recursos especiais para, nessa parte, dar-lhes provimento, acompanhando o relator. É o voto.



CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA
Número Registro: 2006⁄0148815-9 REsp 867016 ⁄ PR


Números Origem: 200104010247870 9704437366

PAUTA: 05⁄05⁄2009 JULGADO: 05⁄05⁄2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX

Presidente da Sessão
Exma. Sra. Ministra DENISE ARRUDA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. IVALDO OLÍMPIO DE LIMA

Secretária

Bela. MARIA DO SOCORRO MELO

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : UNIÃO
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
PROCURADOR : VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)
RECORRIDO : HILDEBRANDO FREITAS CAYRES
ADVOGADO : ADILSON AMARO ALVES

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Fins de Reforma Agrária

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, a Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, deu-lhes provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki (voto-vista), Denise Arruda, Benedito Gonçalves e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.


Brasília, 05 de maio de 2009



MARIA DO SOCORRO MELO
Secretária


RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)


RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Trata-se de recursos especiais interpostos pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA e pela UNIÃO com fulcro no art. 105, III, "a", do permissivo constitucional, em face do acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:
ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. QUESTÃO DE ORDEM APRESENTADA PELO MPF. REJEIÇÃO DE AMBOS OS FUNDAMENTOS. AÇÃO RESCISÓRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO FEDERAL. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. OFENSA À COISA JULGADA. ERRO DE FATO. INOCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO. CUSTAS E HONORÁRIOS.


I. Rejeitada questão de ordem apresentada pelo Ministério Público Federal, tanto quanto à alegação de que não teria sido examinada, pelo Relator, a preliminar de ilegitimidade da União, quanto em relação ao segundo fundamento, no sentido de reincluisão dos autos em pauta.


II. Reconhecida a ilegitimidade ativa da União Federal.


III. A adoção, pelo acórdão rescindendo, de uma das interpretações cabíveis à espécie, não significa violação à literal disposição de lei, mas, ao contrário, coaduna-se com os dispositivos legais apontados como violados.


IV. Improcedem as alegações de ofensa à coisa julgada e de decisão baseada em erro de fato, se as mesmas não restaram demonstradas.


V. Ação rescisória julgada improcedente, com condenação nas custas e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Foram opostos embargos de declaração, que restaram rejeitados nos seguintes termos:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRADIÇÃO. IMPROPRIEDADE DO ARGUMENTO. VÍCIOS INEXISTENTES. REJEIÇÃO.


I. Só resta caracterizada a contradição, em sede de embargos declaratórios, quando demonstrada eventual incoerência entre o julgado e seus próprios termos, mostrando-se de todo impróprio o argumento de contradição entre o acórdão e outro julgado.


II. Nos exatos termos do artigo 535 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são cabíveis, tão-somente, para sanar obscuridade ou contradição, ou, ainda, para suprir omissão acerca de tema sobre o qual o Tribunal deveria ter se manifestado - hipóteses não ocorrentes na espécie.

Noticiam os autos que a União Federal e o INCRA ajuizaram a presente ação rescisória com fulcro nos arts. 485, incs. IV, V e IX, e 487, incs. I e II, do Código de Processo Civil, por violação à literal disposição de lei, ofensa à coisa julgada e em decisão fundada em erro de fato, visando à desconstituição do julgado proferido pela 3ª Turma do TRF da 4ª Região, que negou provimento ao recurso do INCRA e deu parcial provimento ao recurso do Expropriado Hildebrando Freitas Cayres. Em síntese, o acórdão afastou a alegação de dúvidas quanto à propriedade e manteve o pagamento de indenização pela desapropriação de imóvel pertencente à antiga Gleba Silva Jardim, revogando a determinação de que os valores da indenização permanecessem em depósito, à ordem do juízo, até que se esclarecesse a questão do domínio em ação própria.

O acórdão transitou em julgado em 10⁄05⁄1999, conforme certidão de fl. 183.

Os Autores postularam a tutela antecipada por entenderem existir prova inequívoca de que o acórdão rescindendo considerou preço superavaliado como justa indenização da desapropriação, bem como ser verossimilhante a alegação de que sua pretensão coaduna-se com o disposto no art. 5º, inc. XXIV, da CF⁄88, fazendo-se presente, de resto, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. No mérito, pediram que a ação fosse julgada procedente a fim de rescindir o julgado, para, em nova apreciação da lide, sucessivamente: a) julgar-se improcedente a ação originária; b) decretar-se a nulidade do processo, a partir da falta de citação da esposa do expropriado para integrar o pólo passivo na relação processual; c) decretar-se a nulidade da ação originária a partir do laudo pericial, inclusive, determinando-se a realização de nova perícia no Juízo de origem, ou, alternativamente, considerar-se como indenização justa o mesmo valor pago pelo Expropriado, na compra do imóvel, atualizado, sem a aplicação de juros compensatórios; d) decretar-se a nulidade da ação originária a partir do laudo pericial, inclusive, pela falta da planta e do levantamento topográfico da área; e) fixar a taxa dos juros compensatórios em 6% ao ano; e, cumulativamente, f) determinar-se o reexame necessário, para se analisar, de ofício, o pressuposto lógico e jurídico da desapropriação; g) condenar-se a parte contrária nos encargos de sucumbência.

Subindo os autos, foi inicialmente indeferido o provimento antecipado do pedido, com base nas seguintes razões:

"(...) Não reconheço a existência de prova inequívoca em favor do alegado pelos demandantes, de vez que não há demonstração de ser supervalorada a indenização. Assinale-se, a propósito, que mais de duas terças partes do valor total reclamado pelos expropriados correspondem a juros compensatórios, ficando demonstrado, portanto, que a causa maior do agravamento da indenização é a falta do pagamento de sua importância principal.

Tampouco admito, ao menos em sede de juízo prefacial, a inobservância, pelo acórdão rescindendo, do disposto no art. 5º, inc. XXIV, da CR⁄88.

Por fim, no que diz respeito ao 'periculum in mora', certamente aflige muito mais aos expropriados do que ao Poder Público" (fl. 248).

O INCRA interpôs agravo regimental, visando à reconsideração da decisão e o deferimento da tutela de urgência postulada na inicial ou, ainda, à submissão do recurso à apreciação da 2ª Seção.

A decisão foi mantida e a 2ª Seção, por voto de desempate, deu provimento ao agravo regimental, nos termos do voto condutor.

O Expropriado ofereceu contestação e, em função dos documentos juntados, deu-se vista aos Autores, que se manifestaram.

Juntada petição do Réu, foram apresentadas alegações finais pelo INCRA, pela União Federal e por Hildebrando Freitas Cayres.

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento da rescisória, por ofensa à coisa julgada e⁄ou violação aos dispositivos constitucionais referidos.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento à ação rescisória, nos termos da ementa supra destacada.

A UNIÃO interpôs seu recurso especial apontando violação aos arts. 485, V e 535, do CPC, sob os seguintes fundamentos:

a) o acórdão recorrido não enfrentou todas as questões postas na ação rescisória, restando omisso;

b) ao considerar a União parte ilegítima para a Ação Rescisória, o acórdão recorrido acabou por violar literal disposição de lei e negar vigência aos arts. 487, II, do CPC e ao art. 5º, da Lei nº 9.469⁄97;

c) a legitimidade da União para o ajuizamento da Ação Rescisória encontra fundamento ao tratar-se a área objeto de desapropriação de bem da União, por localizar-se em terras de fronteira no Estado do Paraná;

d) é impossível a desapropriação de área de domínio da União, de modo que o acórdão recorrido violou também o art. 145, II, do Código Civil, bem como os arts. 20, § 2º e 5º, XXIV, da Constituição Federal;
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA interpôs seu recurso especial apontando violação aos seguintes artigos: I) em virtude do domínio da União sobre o imóvel, ao art. 145, II, do CC, ao art. 131, do CPC, art. 20, § 2º, da CF⁄88; II) por ausência dos pressupostos processuais, ao art. 10, § 1º, inciso I, art. 47, caput e parágrafo único, art. 131, 214, 267, caput, inciso IV e § 3º, art. 282, II e VII, art. 284 e 285, todos do CPC, e 5º, caput e incisos I e LIV da Constituição Federal; III) pela violação dos princípios constitucionais da isonomia e o da justa indenização, aos arts. 131, do CPC, art. 5º, caput e inciso XXIV da CF; IV) quanto à planta da área desapropriada, aos arts. 176, II § 3º, da Lei 6.015⁄73; 282, inciso VI, 283 e 475, inciso II, do CPC; art. 5º, LIV e XXXV, da Constituição Federal; V) quanto aos juros compensatórios, na violação aos arts. 3º, da MP 1577⁄97 e arts. 462, 475, II, do CPC, art. 5º, II, da CF; VI) quanto à coisa julgada e carência de ação, por violação aos arts. 131, 267, incisos V e VI, e § 3º, 458, caput e incisos I, II e III; 472 e 475, caput, e inciso II; art. 515, do CPC e art. 5º, incisos LIV e XXXV, da Constituição Federal. Aduz, em síntese:

a) houve negativa de prestação jurisdicional, ante o não enfrentamento das matérias suscitadas nos embargos de declaração;

b) nulidade do acórdão recorrido ante a ausência de reinclusão do processo em pauta após pedido de vista, que excedeu o prazo previsto no art. 555, § 2º, do CPC e do art. 130, do RITRF⁄4ª Região, sendo levado em mesa após 01 (um) ano do pedido de vista;

c) nulidade do processo desapropriatório por falta de citação do cônjuge do expropriado;

d) violação ao art. 47 do CPC, pela obrigatória participação da União no feito como litisconsorte ativo, tendo em vista que as terras desapropriadas encontram-se em faixa de fronteira de domínio da União;

e) a AC 9621⁄PR reconheceu a propriedade da União das terras situadas no perímetro de julgamento;

f) não pode em momento algum haver titulação válida do Estado do Paraná, porquanto não se tratam de terras devolutas, cuja indenização e levantamento dos valores representa a sangria dos cofres públicos;

g) violação ao art. 472, do CPC, porque o acórdão rescindendo não poderia decidir acerca da legitimidade do domínio sem que a União Federal integrasse a lide;

h) os juros compensatórios, caso existente, devem limitar ao percentual de 6% ao ano.
O expropriado apresentou contra-razões às fls. 581⁄642, aduz o recorrido, em síntese:

a) que ação originária encontrava em fase de pagamento pela via de precatório requisitório, sob o número 210⁄2000;

b) que após formalizado o precatório requisitório, o Ministério Público Federal ofertou parecer opondo-se ao pagamento, que foi de pronto acatado pelo juízo de primeira instância;

c) tal decisão foi danosa ao recorrido, pois o precatório requisitório não é um procedimento judicial, mas sim de ordem administrativa e, desse modo, não havia como se renovar discussão sobre a liquidação ou sobre o mérito da ação de desapropriação propriamente dita, não havendo norma constitucional ou infra-constitucional que pudesse dar amparo à manifestação do Ministério Público Federal;

d) as terras do recorrente nunca foram devolutas e a sua titulação é absolutamente certa e conforme as disposições legais que regem a matéria de transmissão de propriedade, não há qualquer medida judicial que desconstituiu o seu título de legitimidade;

e) as terras dos autos não integravam o patrimônio da União, eis que já estavam desmembradas da antiga Gleba Silva Jardim;

f) a legitimidade do título do expropriado foi expressamente reconhecida através de sucessivos pronunciamentos nos autos originários, tanto por parte do INCRA, coo por parte da UNIÃO;

g) o INCRA realizou acordos com todos os demais proprietários vizinhos das terras desapropriadas da referida ação, quer pagando em dinheiro, quer fornecendo outras terras;

h) o título de domínio do expropriado não tem origem em expedição de título de domínio indevidamente feita pelo Estado do Paraná, nem se filia à transcrição de número 1.394, do Livro nº 3, do mesmo Cartório de Registro de Imóveis de Foz do Iguaçu-PR, sendo, pois, a sua transcrição absolutamente legítima;

i) na Colônia Tucuruvi é que houve a tal superposição dos títulos, emitidos ilegalmente pelo Estado do Paraná, sendo absolutamente certo que a A.Civ. 9621⁄63 não se refere às terras da Transcrição nº 1.496 CRI de Foz do Iguaçu, como reconhecido, formalmente, pelo INCRA, por seus Ilustres Procuradores e pela União;

j) nunca houve na gleba desapropriada qualquer superposição de títulos, assim como nunca houve qualquer conflito, quer armado, quer judicial, pela posse ou pela propriedade das terras;

l) a Colônia Tucuruvi não pode ser confundida com a Gleba Silva Jardim, sendo absolutamente certo que sobre aquela área que incidiram várias ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público Federal, objetivando a declaração de nulidade dos títulos de propriedade outorgados, indevidamente, pelo Estado do Paraná. Então, não é possível estabelecer qualquer identidade entre as referidas terras e as suas respectivas titulações;

m) as terras objeto da desapropriação não estão situadas na faixa de fronteira, já que ali não se trata de linha de fronteira terrestre, mas fronteira por água.
Parecer da d. Subprocuradoria Geral da República pelo provimento dos recursos especiais, assim ementado:

"Recurso Especial. Desapropriação. Terras situadas em faixa de fronteira. Recurso especial da União. Conhecimento e provimento. Embargos de declaração. Omissão existente. Nulidade do acórdão recorrido. A motivação das decisões judiciais reclama do órgão julgador, sob pena de nulidade, explicitação fundamentada quanto aos temas suscitados, mesmo que o seja em embargos declaratórios. Precedentes do STJ. Violação aos artigos 487, inciso II, do CPC e 5º, da Lei n.º 9.469⁄97. Ocorrência. Legitimidade ativa da União. Interesse jurídico demonstrado. Possibilidade de intervenção em ação na qual é parte Autarquia Federal. Recurso especial do INCRA. Conhecimento e provimento. Embargos de declaração. Omissão existente. Nulidade do acórdão recorrido. A motivação das decisões judiciais reclama do órgão julgador, sob pena de nulidade, explicitação fundamentada quanto aos temas suscitados, mesmo que o seja em embargos declaratórios. Precedentes do STJ. Questão de ordem suscitada pelo Ministério Público Federal. Nulidade do acórdão regional por ausência de inclusão obrigatório do feito em pauta, estando ausente a necessária intimação das partes. Violação ao § 2º do artigo 555 do CPC c⁄c artigo 130 do Regimento Interno do TRF⁄4ª Região. Legitimidade da União para figurar no pólo ativo da ação rescisória. Litisconsórcio ativo necessário. No mérito, impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto-lei nº 1942⁄82. Dominialidade da União reconhecida na AC nº 9621⁄PR, cujo contexto engloba as terras objeto da ação desapropriatória originária. Parecer pelo conhecimento e provimento dos recurso especiais da União e do INCRA".

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 867.016 - PR (2006⁄0148815-9)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V, CPC. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP 476.665⁄SP). AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DE TERCEIRO. ART. 287, II, DO CPC. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DA VIA ELEITA. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. O Recurso Especial interposto contra acórdão proferido em sede de ação rescisória pode veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei


2. A Corte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, decidiu que:"(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - RESP 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20.06.2005). Precedentes jurisprudenciais do STJ: AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006 e RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006.


3. A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstituí-lo.


4. Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


5. A doutrina especializada, ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado", deixa assente que o interesse deste, ensejador da legitimação para propositura da rescisória, não pode ser meramente de fato, vez que, por opção legislativa os interesses meramente econômicos ou morais de terceiros não são resguardados pela norma inserta no art. 487 do CPC. É o que se infere, por exemplo, da lição de Alexandre Freitas Câmara, in verbis:

"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.

Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (in "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)


6. In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.


7. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


8. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


9. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

"Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.

É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).

Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).

10. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


11. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


12. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.
13. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis:
CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.
§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


14. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


15. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


16. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


17. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis:


"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)

Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


18. No mesmo sentido:
"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.
- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.
- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.
- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)

TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)


19. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


20. Precedentes: REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ. 25.08.2008; REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ. 20.08.2008; REsp 933.901⁄PR, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, DJ. 25.06.2008; REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ. 19.06.2008.


21. O pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada - proferido o voto do Ministro Relator, após a sustentação oral dos procuradores de ambas as partes - afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., desta relatoria, DJ 27.09.2004.


22. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


23. A ofensa a princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.


24. Recursos especiais parcialmente conhecidos e providos.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator):

a) Violação a dispositivo constitucional
Prima facie, a irresignação no que tange à ofensa de princípios e preceitos da Carta Magna não é passível da apreciação em sede de recurso especial.
Com efeito, descabe ao STJ examinar a questão, porquanto reverter o julgado significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao colendo STF, e a competência traçada para este Tribunal, em sede de recurso especial, restringe-se unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional.

Nessa esteira, os precedentes de ambas as Turmas de Direito Público do STJ:

"AGRAVO REGIMENTAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PLANO DE SEGURIDADE SOCIAL DO SERVIDOR PÚBLICO. MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. MEDIDA PROVISÓRIA N. 560⁄94. REEDIÇÕES. MATÉRIA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCABÍVEL O RECURSO ESPECIAL. PRECEDENTES. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 168 DO CTN. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA.


No acórdão recorrido, embora tenha sido mencionada legislação federal, decidiu-se a controvérsia com fundamentos essencialmente constitucionais, relativos aos princípios da reserva legal e da anterioridade (artigos 150, I e 195, § 6º, ambos da Constituição Federal). Incomportável, portanto, o exame do tema no âmbito do recurso especial.
(...)

Agravo regimental a que se nega provimento." (AGA 440.261⁄DF, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 04⁄08⁄2003)

"TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE SERVIDOR PÚBLICO ATIVO. MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA. INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 560⁄94 E SUAS POSTERIORES REEDIÇÕES. MATÉRIA DE ÍNDOLE EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA.
(...)

- A matéria referente à validade do aumento de alíquota da contribuição social incidente sobre os vencimentos dos servidores públicos federais, instituído pela Medida Provisória nº 560⁄94 e suas posteriores reedições, envolve discussão de natureza constitucional, não podendo ser examinada em sede de recurso especial.

- Agravo regimental improvido." (AGRESP 417.059⁄RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 21⁄10⁄2002)


b) Violação ao art. 535, do CPC
Ademais, não restou configurada a violação do art. 535 do CPC, uma vez que o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronunciou-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão, como de fato ocorreu na hipótese dos autos. Neste sentido, os seguintes precedentes da Corte:

"AÇÃO DE DEPÓSITO. BENS FUNGÍVEIS. ARMAZÉM GERAL. GUARDA E CONSERVAÇÃO. ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO. PRISÃO CIVIL. CABIMENTO. ORIENTAÇÃO DA TURMA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA⁄STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PROCESSO EXTINTO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. APLICAÇÃO DO § 4º DO ART. 20, CPC. EQÜIDADE. RECURSO DO BANCO PROVIDO. RECURSO DO RÉU DESACOLHIDO.
(...)


III - Não padece de fundamentação o acórdão que examina suficientemente todos os pontos suscitados pela parte interessada em seu recurso. E não viola o art. 535-II o aresto que rejeita os embargos de declaração quando a matéria tida como omissa já foi objeto de exame no acórdão embargado.
(...)" (REsp 396.699⁄RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 15⁄04⁄2002)


c) Nova inclusão em pauta para julgamento do voto-vista
Conforme noticiam os autos, o julgamento da ação rescisória no tribunal a quo foi iniciado na sessão de 13.09.2004 que, após a sustentação oral por parte do INCRA e a prolatação de três votos, houve pedido de vista. O feito foi apresentado em mesa - sem publicação de pauta - na sessão de julgamento no mês de setembro de 2005, ou seja, após o decurso de 01 (um) ano.


Deveras, a jurisprudência da Corte se firmou no sentido de que o adiamento do julgamento do recurso não implica a necessidade de nova publicação da pauta. Ademais, não há que se falar em cerceamento de defesa, uma vez que a parte recorrente já havida realizado sua sustentação oral.
Nesse sentido, os seguintes arestos:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NULIDADE DO ACÓRDÃO. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO.


1. Ação Popular movida contra o Município de Bady Bassit; em que se pleiteia a suspensão dos efeitos dos atos administrativos praticados pela Municipalidade, com base na lei local nº 1.310⁄97, consubstanciados na expedição de alvará, autorizando a construção de um Motel em área destinada, originariamente, a uso residencial.


2. O presente recurso especial foi incluído na pauta do dia 20⁄05⁄2003, cuja publicação no Diário Oficial deu-se em 14⁄05⁄2003.
Iniciado o julgamento do feito no dia 20⁄05⁄2003, foi ele adiado e não retirado da pauta, como aduzem os embargantes, sendo que na sessão do dia 16⁄12⁄2003, o mesmo foi julgado.


3. O adiamento do julgamento do recurso não implica a necessidade de nova publicação da pauta. (Precedentes da Corte: HC34793, Rel.
Min.Felix Fischer, DJ de 17⁄06⁄2004;RESP 268.659⁄RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 15⁄04⁄2002;REsp 95.082, Rel. Min. Ruy Rosado, DJ de 14⁄10⁄96) 4. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no REsp 474475⁄SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02.09.2004, DJ 27.09.2004 p. 213)


PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO DA REINCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INOVAÇÃO DA LIDE.
INVIABILIDADE. INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DO ART. 535 DO CPC. REDISCUSSÃO DE QUESTÕES DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE.


1. Havendo pedido de vista dos autos, em sessão já iniciada e proferido o voto do Ministro Relator, afigura-se desnecessária a publicação da reinclusão do feito em pauta de julgamento para ser prolatado o voto-vista, vez que tal situação equivale ao adiamento do término do julgamento. Em caso de adiamento, a jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar desnecessária a publicação da pauta. Precedentes: HC 25.427⁄SP, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ 01.12.2003; RMS 11.076⁄RS, 6ª T., Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 04.08.2003; EDcl no REsp 474475 ⁄ SP 1ª T., Min. Luiz Fux DJ 27.09.2004.


2. Revelam-se improcedentes os embargos declaratórios em que as questões levantadas traduzem inconformismo com o teor da decisão embargada, pretendendo rediscutir matérias já decididas, sem demonstrar omissão, contradição ou obscuridade (art. 535 do CPC).


3. Não é possível, em sede de embargos de declaração, inovar a lide, invocando questões até então não suscitadas. Precedentes: EDcl no Resp n.º 72.204⁄RJ, 1ª Seção, Min. João Otávio de Noronha, DJ de 14.11.2005; EDcl no REsp n.º 457.714⁄SP, 3ª Turma, Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 10.10.2005; EDcl no AgRg no REsp n.º 604.741⁄CE, 5ª Turma, Min. Laurita Vaz, DJ de 01.02.2006; EDcl nos EDcl no AgRg no Ag n.º 650.348⁄SP, 6ª Turma, Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 05.12.2005.
4. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no REsp 445.910⁄MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27.03.2007, DJ 16.04.2007 p. 167)


"PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ADIAMENTO DO JULGAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE NOVA PUBLICAÇÃO.


O simples adiamento do julgamento do recurso, sem retirada de pauta, dispensa – em princípio – a publicação de nova intimação das partes. (Precedentes). Writ denegado." (HC34793, Rel. Min.Felix Fischer, DJ de 17⁄06⁄2004)

"CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO RESCISÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE. NULIDADE DO ACÓRDÃO NÃO CONFIGURADA. ADIAMENTO AUTOMÁTICO DA PAUTA. DESNECESSIDADE DE NOVA PUBLICAÇÃO. RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE POR CULPA DE PREPOSTO NA CONDUÇÃO DO ÔNIBUS. REEXAME DA PROVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7-STJ.
I. Possível o julgamento do processo em sessão posterior àquela inicialmente designada, porquanto o adiamento se dá automaticamente, sem necessidade de nova publicação.
II. Nulidades não configuradas.
III. Reconhecimento de culpa do preposto da empresa de transporte coletivo, a afastar a alegação da autora de que sua condenação se baseara exclusivamente na atribuição de responsabilidade objetiva.
IV. Descabimento da rescisória para revisão da matéria de prova, o mesmo acontecendo, ao teor da Súmula n. 7 do STJ, quanto à admissibilidade do especial.
Recurso não conhecido." (RESP 268.659⁄RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 15⁄04⁄2002)

"INTIMAÇÃO. PAUTA DE JULGAMENTO. ADIAMENTO.

1. O RECURSO, CUJO JULGAMENTO FOI ADIADO, PODE SER JULGADO EM SESSÃO PROXIMA, INDEPENDENTEMENTE DE NOVA PUBLICAÇÃO DE EDITAL.

2. O REGISTRO CONSTANTE DO EDITAL AFIXADO NA PORTA DA SESSÃO: "MOTIVO ADIADO POR INDICAÇÃO DO PRESIDENTE", SIGNIFICA QUE ELE VINHA ADIADO DE SESSÃO ANTERIOR, E SERIA JULGADO, E NÃO QUE SERIA NOVAMENTE ADIADO. MÉRITO DEPENDENTE DE MATÉRIA DE PROVA.
RECURSO NÃO CONHECIDO." (REsp 95.082, Rel. Min. Ruy Rosado, DJ de 14⁄10⁄96)

d) Legitimidade ativa da União
A legitimidade ativa para a propositura da ação rescisória, em princípio, é conferida às partes do processo no qual proferida a sentença rescindenda, posto que nada mais lógico do que os destinatários do comando judicial viciado pretenderem desconstitui-lo.
Parte, para efeito de propositura da ação rescisória, é aquela que formulou pedido e aquela em face de quem o pedido foi formulado. Assim, tanto o autor quanto o réu, originários, podem manejar a rescisória, ainda que o processo tenha corrido à revelia do demandado.
Como de sabença, o terceiro prejudicado, que de há muito é prestigiado pelos ordenamentos mais vetustos e que lhe permitem intervir em qualquer grau de jurisdição, também está habilitado à rescisão da sentença. Para esse fim, o seu legítimo interesse revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido.


In casu, a União é parte legítima para a propositura da ação rescisória que se apresenta juntamente com o INCRA, vez que o objeto do acórdão rescindendo é a desapropriação de terras localizadas em faixa de fronteira, pertencentes à própria União e que foram alienadas a título non dominio pelo Estado do Paraná.
Assim, o interesse da União está resguardado pela norma inserta no art. 487 do CPC, que ao relacionar os legitimados à figurar no pólo ativo da referida ação dispõe:

"Art. 487. Tem legitimidade para propor a ação:

I - quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular;

II - o terceiro juridicamente interessado;

III - o Ministério Público:


a) se não foi ouvido no processo, em que lhe era obrigatória a intervenção;

b) quando a sentença é o efeito de colusão das partes, a fim de fraudar a lei."

Ao discorrer acerca da definição de "terceiro juridicamente interessado" a doutrina especializada assim dispõe, verbis:

"(...) No que concerne aos terceiros juridicamente interessados, há que se recordar que os terceiros não são alcançados pela autoridade de coisa julgada, que restringe seus limites subjetivos àqueles que foram partes do processo onde se proferiu a decisão.
Pode haver, porém, terceiro com interesse jurídico (não com interesse meramente de fato), na rescisão da sentença. Como regra, o terceiro juridicamente interessado será aquele que pode intervir no processo original como assistente. Considera-se, também, terceiro legitimado a propor a 'ação rescisória' aquele que esteve ausente do processo principal, embora dele devesse ter participado na condição de litisconsorte necessário." (Alexandre Freitas Câmara, In "Lições de Direito Processual Civil", vol. II. 10.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005, pp.24⁄25 - grifo nosso)

No mesmo sentido, ensina o ilustre processualista José Carlos Barbosa Moreira:

"Não basta o simples interesse de fato. O credor, por exemplo, não se legitima segundo o artigo 487, n.º II, à rescisória da sentença que tenha condenado o devedor em ação proposta por outro credor: ainda que o desfalque patrimonial resultante diminua ou até elimine a possibilidade concreta de satisfação do crédito, este, de iure, subsiste incólume." (in "Comentários ao Código de Processo Civil", vol. V, 12.ª ed. rev. e atual., Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 170)


e) Mérito da ação rescisória
Quanto ao mérito, conforme relatado, a União Federal e o INCRA ajuizaram a presente ação rescisória com fulcro nos arts. 485, incs. IV, V e IX, e 487, incs. I e II, do Código de Processo Civil, por violação à literal disposição de lei, ofensa à coisa julgada e em decisão fundada em erro de fato, visando à desconstituição do julgado proferido pela 3ª Turma desta Corte, que negou provimento ao recurso do INCRA e deu parcial provimento ao recurso do Expropriado Hildebrando Freitas Cayres. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou provimento à ação rescisória, nos termos da ementa supra destacada.

ACorte Especial, revendo anterior posicionamento jurisprudencial, entendeu pela possibilidade de o Recurso Especial veicular os mesmos dispositivos legais que ensejaram a propositura da ação rescisória, por violação literal a disposição de lei, consoante se infere de trecho do voto condutor, proferido no RESP 476.665⁄SP, verbis: "(...)Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - REsp 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20⁄6⁄2005).

No mesmo sentido confiram-se, à guisa de exemplo, julgados desta Corte, assim ementados:
"AGRAVO REGIMENTAL. AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS CAPAZES DE INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL. DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DAS VIAS RECURSAIS. SÚMULA 514⁄STF. MOMENTO DA FLUÊNCIA DOS JUROS MORATÓRIOS. QUESTÃO DE DIREITO.

- Não merece provimento recurso carente de argumentos capazes de desconstituir a decisão agravada.

- O Recurso Especial pode vir calcado nos mesmos dispositivos que ensejaram a Ação Rescisória por violação literal a disposição de Lei. Assim decidiu, no REsp 476.665⁄PÁDUA, a Corte Especial do STJ, revendo posição anterior. (grifo nosso)

- "Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os recursos" (Súmula 514⁄STF).
- A discussão acerca do momento inicial da fluência dos juros de mora envolve questão de direito e não de prova." (AgRg no Ag 580593⁄SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 21.02.2006)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ALEGAÇÃO GENÉRICA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284⁄STF. CONHECIMENTO DO RECURSO NO QUE CONCERNE À APONTADA OFENSA AO ART. 485, V, DO CPC. APLICAÇÃO DA SÚMULA 7⁄STJ NO QUE CONCERNE À ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 485, IX, § § 1º E 2º, DO CPC. AFASTADA A SÚMULA 126⁄STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO DA LEI N. 4.870⁄65. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. PREÇOS DO SETOR SUCRO-ALCOOLEIRO. FIXAÇÃO EM DESACORDO COM O ESTABELECIDO NA LEI N. 4.870⁄65. CABIMENTO DE INDENIZAÇÃO.

In casu, cingiu-se a recorrente a formular a alegação genérica de violação do artigo 535, II, do Código de Processo Civil, sem apontar qualquer omissão no acórdão recorrido. Incidência da Súmula 284⁄STF, segundo a qual "é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

"Não se olvida que a violação de lei, para dar azo à rescisória, deve se referir à letra da lei. O art. 485, V, da lei de regência se refere à letra da lei, tanto quanto o art. 105, III, 'a', da Constituição. Se o autor da rescisória afirma violado certo artigo de lei e vê sua pretensão julgada em seu desfavor, o recurso especial pode envolver o tema da contrariedade do mesmo dispositivo que na ação se alegou malferido" (Corte Especial - REsp 476.665-SP, Relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 20⁄6⁄2005). Colocada essa premissa, ficam afastadas as alegações da recorrida de que a matéria agitada nas razões de recurso é inédita, bem como de que se operou a preclusão consumativa. (grifo nosso)

Em relação ao artigo 485, IX, § § 1º e 2º, do CPC (erro de fato), verificar se na hipótese restou comprovado ou não o prejuízo que se busca indenizar demandaria o reexame de matéria probatória, uma vez que seria necessária a análise da perícia acostada aos autos. Incide na espécie, dessa forma, a Súmula 07⁄STJ, o que determina o não-conhecimento do recurso especial quanto à alegada ofensa ao artigo art. 485, IX, § § 1º e 2º, do CPC.

O egrégio Tribunal a quo decidiu a questão no âmbito infraconstitucional, notadamente à luz do artigo 485, V e IX, do CPC e da Lei n. 4.870⁄65. Deve prevalecer o entendimento segundo o qual a análise da aplicação de uma lei federal não é incompatível com o exame de questões constitucionais subjacentes ou adjacentes. A competência somente seria deslocada para a Máxima Corte se a v. decisão recorrida tivesse julgado o feito única e exclusivamente sob o prisma constitucional, o que se não deu no caso ora em exame. Mais a mais, na espécie não tem aplicação a Súmula 126 desta Corte, pois a recorrente interpôs recurso extraordinário.

A verificação acerca da apontada violação à literal dispositivo de lei, a autorizar a rescisão do acórdão rescindendo (art. 485, V, do CPC), não implica revisão de matéria de prova. Com efeito, a conclusão sobre o cabimento ou não de indenização ao setor sucro-alcooleiro envolve o exame da legislação aplicável à espécie.

Ausência de prequestionamento dos artigos 9º e 10º da Lei n. 8.492⁄92; 89 da Lei n. 5.764⁄71; 35 do Decreto-lei n. 2.284⁄86; 1º, 2º, 6º e 7º do Decreto-lei n. 2.335⁄87; 8º da MP n. 32⁄89; e 8º da Lei n. 7.730⁄89. No que se refere aos artigos 9º, 10 e 11 da Lei n. 4.870⁄65, bem como do Decreto-lei n. 2.283⁄86, o recurso deve ser conhecido, diante do prequestionamento explícito dos dispositivos legais tidos por malferidos.

Consoante salientado por este Relator quando do julgamento do REsp 79.937⁄DF (Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 10.9.2001), da simples leitura dos artigos 9º, 10 e 11 da Lei n. 4.870⁄65, que devem ser interpretados de forma sistemática, depreende-se que o IAA, entidade estatal, com o escopo de harmonizar a distribuição de bens relevantes nacionalmente como o açúcar e o álcool, devia fixar os preços a serem cobrados pelas usinas, mas, logicamente, tais preços não podiam ser fixados abaixo do levantamento de custos realizado.

A Constituição Federal de 1967 já positivava o princípio do equilíbrio econômico-financeiro do contrato no art. 167, II, de acordo com o qual as tarifas deveriam assegurar dita equação. Na Constituição de 1988, o art. 175, parágrafo único, III, também faz referência à política tarifária, a ser disciplinada em lei. E imbuído do mesmo espírito é o art. 37, § 6°, da Carta, que dispõe sobre responsabilidade civil do Estado, uma vez que a ninguém é dado suportar sozinho o peso de uma medida que a todos aproveite.

É cediço que os preços dos combustíveis estão sujeitos a uma disciplina própria, o que acarretou a própria edição da Lei n. 4.780⁄65 e a criação do IAA. Ao poder público, todavia, não assiste impor ônus demasiado ao fornecedor de cana-de-açúcar em prol da coletividade. In casu, competia ao Estado, como consta na parte final do § 1º, do artigo 14, da referida Lei, “assegurar os interesses do fornecedor de cana, garantir o abastecimento do mercado interno e evitar o abuso do poder econômico e o eventual aumento arbitrário dos lucros”. A competência para a fixação dos preços em nada altera essa necessidade.

Impõe-se, portanto, a reparação do dano, nos termos do artigo 37, § 6º, da CF, pois a Administração, ao fixar o preço do açúcar e do álcool abaixo dos custos – que mandara apurar, por meio da Fundação Getúlio Vargas -, inviabilizou a atividade sucro-alcooleira.

Sobre a questão dos períodos de congelamento de preços, mantém-se o entendimento de que o Governo deveria obedecer os critérios estabelecidos na Lei n. 4.870⁄65.

Preliminares de incidência da Súmula 284⁄STF quanto à apontada ofensa ao artigo 535, do CPC, aplicação da Súmula 7⁄STJ em relação à alegada violação do artigo 485, IX, § § 1º e 2º, do CPC, e ausência de prequestionamento da Lei n. 5.764⁄71 acolhidas. Recurso especial conhecido em parte e improvido." (RESP 746301⁄DF, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 23.05.2006)

Por essas razões, e tendo em vista o prequestionamento dos dispositivos tidos por violados, conheço do recurso especial e passo à análise da controvérsia acerca da desapropriação em terras de fronteira.
O caso sub examine merece uma retroação histórica sobre os fatos e suas conclusões bem lançadas na sentença de primeiro grau, verbis:

"A problemática das terras no Estado do Paraná iniciou-se quando, na década de 1950, o Governo, nas mãos do então Governador, o Sr. Moyses Lupion, titulou extensas áreas de "terras devo lutas" no Oeste do Estado, cujas terras estavam situadas na chamada "faixa de fronteira". Ocorreu, porém, que as pessoas que foram tituladas pelo Estado do Paraná não foram as mesmas pessoas que há muitos anos já ocupavam aquelas terras, seja na condição de proprietários seja na condição de posseiros, pessoas essas que, com seu trabalho e suor, cultivavam-nas e as tomaram produtivas. (Narram levantamentos feitos pelo INCRA e pelo MPF que o Governador, com as titulações, teria buscado beneficiar pessoas "chegadas" ao poder, as quais não tinham qualquer afinidade com a agricultura, por isso mesmo que ficaram conhecidas como "agricultores de asfalto").

O fato é que, de posse dos títulos de propriedade, os titulados pelo Estado do Paraná, ao verificarem que as terras que adquiriram estavam ocupadas por terceiros e também que o preço delas subia a cada dia que passava (não só por sua extrema fertilidade, que propiciava grandes níveis de produção, como também pelo fato da abertura e do asfaltamento das estradas, que facilitava o acesso e o escoamento da produção), passaram a tentar obter a posse fisica das mesmas, às vezes por meios legais (ações judiciais etc.), mas na maior parte das vezes fazendo uso da força, contratando, até mesmo, 'jagunços" para o "serviço".

Diante desse quadro, é fácil concluir que a violência encontrou terreno fértil para explodir, como de fato ocorreu. Tanto que até foi preciso, em alguns casos, a intervenção do Exército.

Confira-se, nesse sentido, matéria veiculada no dia 14 de julho de 2001, no jornal "Gazeta do Povo", de Curitiba⁄PR, denominada "A história de grilagem no Oeste", subtítulo da matéria principal ("INCRA revisará 30 mil títulos de propriedades rurais no Paraná", que alertava os seus leitores acerca do final do prazo para a ratificação dos títulos expedidos pelo Estado do Paraná na região Oeste do Estado), in verbis:

"Conforme o Livro Branco de Grilagem de Terras no Brasil, na década de 50 as terras do Oeste do Paraná, na fronteira com Argentina e Paraguai, foram ocupadas por imigrantes de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

As terras. chamadas devolutas. foram tituladas a afetos do governo. 'laranjas' e até fantasmas. Esses títulos foram expedidos independentemente de as terras estarem ocupadas. foi quando nasceram os conflitos. As pessoas eram expulsas por jagunços e até mesmo pela polícia. Segundo o livro elaborado pelo INCRA, o Poder Judiciário foi conivente com a aparente legalidade dos títulos.

Em 1957, a maior parte das terras do Oeste pertencia à União e não podia ser titulada pelo Estado. Foi nesta época que surgiu a cumplicidade entre o Poder Executivo e os cartórios, que autenticaram falsas procurações.

Dados históricos dão conta que 40 mil hectares do imóvel Rio Quarto, em Céu Azul, no Oeste, foram grilados, beneficiando um diretor do Departamento de Terras do Estado. Estima-se que o governo tenha titulado outra área de 50 mil hectares, a Gleba Chopinzinho, em nome de 119 fantasmas do município de mesmo nome." (Grifei).

Em outro subtópico da mesma matéria, assim está relatada a situação vivida por causa da titulação promovida pelo Governador Moyses Lupion:

"Tanto o Diretor Executivo do INCRA, Valdir Dorini, como o fundador do instituto, o paranaense Reinhold Stephanes, reconhecem que a situação gera polêmica porque envolve uma história de conflito agrário. que resultou em morte e injustiças (veja histórico). 'A época de maior conflito. entre 1955 e 1960. foi em Francisco Beltrão. quando houve intervenção federal com a presença do Exército' disse Stephanes. Foi nessa época. durante o governo de Moisés Lupião (sic), que ocorreu boa parte dos conflitos." (Grifei).

Nessa mesma direção, escreveu o então Prefeito do Município de Palotina, Sr. João Bortolozzo, ao Secretário Executivo da Comissão Especial da Faixa de Fronteira, em 23 de agosto de 1971, cujo relatório integra os autos da Reclamação n. 1.074⁄PR, em trâmite no Supremo Tribunal Federal:

"Caminhava, portanto, o Município de Palotina a passos largos em direção ao seu futuro de prosperidade e grandeza, quando alça-se ao comando político do Estado a figura celebérrima do Moyses Lupion, acompanhado de uma coorte faminta de lucros fáceis. E lá se foi a tranqüilidade de nossos habitantes.

Pretendendo apossar-se daquelas terras fertilíssimas, mas, tendo contra sua pretensão as transcrições imobiliárias que escudavam o direito dos sucessores da 'BRA VIACO' e de Ruy de Castro, Lupion simplesmente rebatizou a gleba Piquiry, passando a denominá-Ia por colônias Rio Azul, Piquerobí e Pindorama, designações com as quais titulou-a toda, não em favor dos que a trabalhavam e a faziam produzir, mas em favor de seus apaniguados, os chamados' lavradores de asfalto'.

E, pasme V. Exa., esses títulos de Lupion, em flagrante duplicidade registrária, foram 'normalmente' transcritos no Registro de Imóveis. Ademais o D.G.T.C. (Departamento de Terras) em tempo algum fez qualquer medição ou demarcação na propriedade de Ruy de Castro ou na parte restante, ainda de propriedade da 'BRA VIACO'. Acrescente-se a isso que na área de Palotina jamais qualquer titulado teve posse, nem ali plantou um único pé de couve.

Claro está que esses registros dúplices geraram situações complexas, as quais desencadearam conflitos de graves proporções entre os sucessores de Ruy de Castro e titulados pelo Estado, estes acobertados ostensiva e acintosamente pela Polícia de Lupion. E, como não poderia deixar de ser, o sangue correu fartamente, a ponto de a 53 Cia. de Fronteiras, do Exército Nacional, haver destacado um grupo para Palotina a fim de coibir os desmandos praticados pelos sicários do Governo Estadual."

Conquanto a(s) área(s) deste processo não coincida(m) com as mencionadas nas citações anteriores, estas bem ilustram o que o então Governador do Estado do Paraná fez em toda a Região Oeste do Estado, em cuja região está integrada a(s) já mencionada (s) área (s).

Diante dessa situação de insegurança e violência generalizadas, o Governo Federal, por meio do INCRA, teve que agir para que a paz e o progresso voltassem à região.

Mas, por que desapropriar aquelas terras, quando o INCRA já tinha conhecimento das titulações irregulares promovidas pelo Estado do Paraná na "faixa de fronteira"? Por que propôs ações expropriatórias, em vez de ações voltadas à defesa do patrimônio da União (ações anulatórias dos títulos espúrios ou mesmo ações discriminatórias)?

É o próprio expropriante quem responde esses questionamentos, na sua manifestação datada de 03 de março de 1986, constante nos autos n. 1999.70.02.003744-0, em trâmite nesta Vara Federal:

"A violência tornou-se a palavra de ordem e muitos foram os que ali deixaram suas vidas.

Foi diante de tal quadro que a Autarquia passou a intervir na região, procurando, dentre as alternativas jurídicas que se apresentavam, qual aquela que num menor espaço de tempo, viesse a satisfazer o interesse social e devolver à região a paz de há muito almejada, rearticulando o processo produtivo, e, sobretudo a Justiça Social.

Duas foram as alternativas jurídicas: a primeira, seria ingressarmos com diversas ações anulatórias daqueles títulos concedido a non domino pelo Estado na faixa de fronteira de domínio da União, ou, como segunda alternativa, a desapropriação por interesse social de todas as glebas tituladas irregularmente.

A primeira alternativa, embora juridicamente correta, na prática, no entanto, era inviável. Muitos daqueles títulos já haviam sido desdobrados e o número de proprietários agora somava-se a milhares de pessoas e uma ação judicial dessa natureza, por si só já é morosa, acrescido do fato do assoberbamento de serviço que acarretaria ao judiciário, cuja precariedade de material, pessoal e mesmo o próprio volume de ações que seriam cometidas aos magistrados - que hoje já atingem o limite do incomensurável - inviabilizaria essa primeira alternativa.

Por outro lado, havia toda uma pressão social de natureza política e econômica a reclamar soluções urgentes, isto porque a regularização fundiária dessas glebas, titulando aqueles que efetivamente se encontravam na posse dos lotes nelas inseridos, representava, não só um aumento do mercado consumidor, bem ainda, possibilitaria um aumento da produtividade da terra a fim de satisfazer as necessidades do mercado interno e a captação de divisas através da exportação (...) para o mercado internacional, promovendo, por outro lado, ajá decantada Justiça Social.

Optou-se, assim, pela segunda alternativa - a desapropriação por interesse social - por ser esta a medida jurídica que mais de perto atende aos anseios dos agricultores, o que, uma vez imitido na posse e transcrita a área em _ nome do INCRA possibilitaria ao órgão titular os que na posse da terra estão possibilitando-os a obter crédito bancário para o crescimento de suas lavouras, desenvolvendo, por outro lado, outras atividades afins (comércio, indústria, etc.), em toda região." (Mantida a redação original).

Conforme se constata da manifestação do expropriante, a escolha da ação de desapropriação. em lugar das outras ações. deu-se em razão da necessidade e urgência do caso concreto, vale dizer, para fazer cessar os conflitos e o derramamento de sangue, necessitava o !NCRA imitir-se imediatamente na posse dos imóveis titulados ilegalmente pelo Estado do Paraná, o que só seria possível por meio de ação onde houvesse previsão de liminar imissão na posse, ou seja: a expropriatória. Não é demais lembrar, também, que a ação expropriatória, ajuizada sob a égide do Decreto-lei n. 554, de 25.04.69, trazia ainda outra vantagem, pois permitia a transcrição, ab initio, do bem expropriado em nome do expropriante (arts. 6° e 7°), possibilitando ao !NCRA titular, desde logo, os imóveis em nome das pessoas que verdadeiramente os tomavam úteis e produtivos (quais sejam, aquelas pessoas que detinham a posse fisica das terras em litígio e as cultivavam).

Importante lembrar que esse "procedimento" adotado pelo !NCRA já é do conhecimento do TRF da 4a Região, conforme se vê nas notas taquigráficas constantes do julgamento dos Embargos de Declaração na AC n. 96.04.58585-1:

"Juíza Sílvia Goraieb (Presidente):
Até hoje não entendi como o !NCRA desapropriou essas áreas, sabendo que eram da União.

Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira (Repres. do Min. Público): O !NCRA afirma que essa era a forma mais ágil de regularizar a situação do conflito.

Juiz José Germano da Silva (Relator):
Estava morrendo gente em 1974. O Governo tinha de tomar uma providência.

Certo ou errado, o fato é que o INCRA foi bem sucedido no seu intento. Com as desapropriações e a outorga de títulos às pessoas que realmente ocupavam e produziam naquelas terras, a paz voltou à região, tanto que os imóveis, que haviam sofrido razoável desvalorização em razão do conflito, com o fim desse, novamente voltaram a valorizar-se.

Aqui estão, pois, as peculiaridades das ações expropriatórias levadas a efeito pelo INCRA na Região Oeste do Estado do Paraná na década de 1970: o INCRA, mesmo ciente de que as "terras devo lutas" alienadas pelo Estado do Paraná na "faixa de fronteira" integravam o patrimônio da União, "optou" por desapropriá-las porque essa era a única medida judicial, dadas as suas características (possibilidade de liminar imissão na posse e transferência do bem para o expropriante), que poderia rapidamente pôr fim à violência que se instaurara na região, o que não sucedia com as outras medidas à sua disposição - ação discriminatória, ação de anulação de títulos dominiais etc. -, por serem de tramitação mais morosa, apesar de serem processualmente mais adequadas, como bem reconheceu o próprio expropriante. Daí é que, em razão desses caracteres particulares, entendo que tais desapropriações devem ser tratadas de forma diferenciada".

A desapropriação consiste no procedimento através do qual o Poder Público incorpora para o seu patrimônio, compulsoriamente, a propriedade do particular, fundado em um interesse público.
A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira, pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.
Destarte, ninguém pode transferir o que não tem, tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).
Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que:

Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.
É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).
Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência.

(Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).

O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual.
Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.
Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que:

A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação.
(Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310).

Finalmente, acerca da novel política de nulidades do Código Civil, merecem transcrição os ensinamentos da abalizada doutrina, verbis:

A invalidade é gênero, no qual se distinguem duas espécies: a nulidade e a anulabilidade. Entre os vários critérios de distinção, o mais destacado é a causa de cada um: enquanto na invalidade há uma afronta mais grave, por conta de um motivo de interesse público, a anulabilidade resulta de uma desconformidade menos grave, tutelando-se um interesse particular (v. comentários ao art. 171). Aduz-se, também, caracterizando a nulidade, a legitimidade mais ampla para invocá-la, podendo ser pronunciada mesmo de ofício pelo juiz (art. 168) e a insuscetibilidade de confirmação ou convalescimento pelo tempo (art. 169), além do polêmico critério distintivo da retroatividade dos efeitos de sua declaração (v. comentários ao art. 182).

Para maioria da doutrina, a classificação entre nulidade absoluta e nulidade relativa, abandonada pelo CC1916, equivale à atual distinção entre nulidade a anulabilidade (nesse sentido: Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, p. 633; Silvio Rodrigues, Direito Civil, p. 292; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso, pp. 399 e ss.). Em contraposição, alguns autores, como Francisco Amaral (Direito Civil, p. 526), Antônio Junqueira de Azevedo (Negócio Jurídico e Declaração Negocial, p. 112) e Leonardo Mattietto ("Invalidade", p. 321), salientam serem ambas subspécies de nulidade (justificadas por interesse público) distintas apenas na legitimidade para sua argüição. A jurisprudência, contudo, continua a usar os termos "nulidade absoluta" e "nulidade relativa" como equivalentes à nulidade e à anulabilidade (STJ, 4ª T., Resp. 246.824, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julg. 21.03.2002, publ. DJ. 29.04.2002).

Enfim, a hipótese de nulidade é fixada no interesse de toda a coletividade, tendo alcance geral e eficácia erga omnes. O negócio nulo fica privado de produzir efeitos jurídicos por ter sido realizado em ofensa grave aos princípios de ordem pública.

O sistema jurídico aplica uma sanção aos negócios praticados em violação à norma jurídica congente, sepultando-os em sua origem. Neste sentido, a jurisprudência acolhe a nulidade como sanção, e não como vício (STJ, 5ª T., Resp. 149.906, Rel. Min. Felix Fischer, julg. 20.02.1997, publ. DJ. 24.03.1997).

Na lição de Clóvis Bevilaqua, "esta reação é mais enérgica, a nulidade é de pleno direito, e o ato é nulo quando ofende princípios básicos da ordem jurídica, garantidores dos mais valiosos interesses da coletividade. É mais atenuada a reação, a nulidade é sanável e este é apenas anulável quando os preceitos violados se destinam, mais particularmente, a proteger interesses individuais (Código Civil, p. 331).

Leonardo Mattietto destaca, no entanto, a imprecisão técnica na utilização da expressão nulidade de pleno direito, uma vez que a nulidade, em nosso sistema, depende sempre de declaração judicial ("Invalidade", p. 320).

O exame da matéria submete-se ao princípio da conservação dos atos e negócios jurídicos, segundo o qual, na palavras de Antônio Junqueira de Azevedo, "tanto o legislador quanto o intérprete, o primeiro, na criação das normas jurídicas sobre os diversos negócios, e o segundo, na aplicação dessas normas, devem procurar conservar, em qualquer um dos três planos - existência, validade e eficácia -, o máximo possível do negócio realizado pelo agente.

(Negócio Jurídico - Existência, p. 64). ) (Gustavo Tepedino, et. al. Código Civil Interpretado Conforme a Constituição, vol. I, Renovar, p.309⁄310).

No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Beviláqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, 5. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003; Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


Destarte, a adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu,a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.

Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99, verbis:

CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.

A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria, o que encerra figura assemelhada à confusão.

Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.

In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado do
Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências as entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelos juízos de primeira instância.

Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis.

TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO. USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.

I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.

II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.

III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".

Nesse sentido, merece destaque as fundamentações proferidas pelo então Ministro Aliomar Baleeiro, verbis:

" É histórico que, no Brasil, de início, todas as terras foram públicas, em virtude da posse que Pedro Álvares Cabral tomou da descoberta em nome e para o domínio do rei de Portugal. A conquista dilatou para o poente a posse histórica inicial até os confins do oeste. De começo, o território colonial foi uma vasta fazenda da Corôa Portuguesa - parte da "minha real Fazenda", - como escreviam em leis e alvarás os monarcas lusos, referindo-se à universalidade dos bens públicos.

Essas terras passaram ao domínio nacional com a independência e, por força do art. 64, da Constituição Federal de 1.891, vieram a pertencer aos Estados-Membros de sua situação.

É certo que, desde de a primeira metade do século XVI, começou o processo de desmembramento pelas sesmarias e datas, a partir do litoral atlântico, até atingir o oeste remoto.

Mas a validade de cada desmembramento depende do título expedido por uma autoridade pública competente.

Depois de uma legislação fragmentária e extravagante, a Assembléia Geral do Império do Brasil dispôs sobre essa matéria de terras devolutas na Lei n.º 601, de 18.09.1850, que proibiu a cessão gratuita e veio a ser regulamentada pelo Dec. n.º 1.318, de 1.854. Ora, essa primeira lei nacional de terras determinou que ficasse reservada uma faixa ao longo das fronteiras, numa largura de 10 léguas, para sua proteção militar e colonização. De então pro diante, essa faixa nuca deixou de pertencer à União, porque não foi atingida pelo art. 64, da C.F. de 1.891, desde que esse dispositivo ressaltou expressamente para o domínio nacional a porção de território indispensável à defesa das fronteiras, etc. Não revogou, mas confirmou a lei de 1.850, que estabelecia a largura daquela porção de terras nos limites com o território estrangeiro. Logo nos primeiros anos da República, tentaram os Estados dilatar o sentido do art. 64, da C.F de 1891, pretendendo até que no conceito de terras devolutas entravam os terrenos ribeirinhos e os de marinha. Mas isso não prevaleceu, desde a reação do Senado, em 1.892, rejeitando um projeto nesse sentido, até o veto de Prudente Morais a outro semelhante, em 1896.

A C.F. de 1.946, em cuja vigência Mato Grosso vendeu as terras aos Réus, inclui no rol de bens da União, as ilhas fluviais nas zonas limítrofes, com outros países e a porção de terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, etc.

É incontestável nem foi constatado pelos réus que a área comprada por estes, em 1.955, constitui parte duma ilha fluvial na zona limítrofe com outro país. Além disso, estava na faixa de fronteira desde a delimitação da lei de 1.850 até os diplomas em vigor ao tempo da venda celebrada por Mato Grosso.

O art. 5º do Dec. Lei n.º 9.760, de 05.09.46, que regula de modo geral os bens da União, conceitua no art. 5º, as terras devolutas na faixa de fronteira, e em nenhuma das suas categorias poderá ser enquadrado aquele polígono que o Estado vendeu aos réus sem ter o domínio dele.
(...)

O Supremo Tribunal Federal, reiteradas vezes, depois do Decreto Lei n.º 9.760, tem firmado o domínio da União sobre as terras de fronteiras, repelindo as investidas e venda do Paraná, inclusive em ação deste contra aquela (...).

Porque o domínio da União na área dos confins é a continuação daquel'outro resultante da posse histórica de 1.500 e da conquista posterior, e porque essa faixa não se compreende nas terras devolutas transmitidas pela C.F. de 1.891 aos Estados membros, está livre de provar seu domínio. Este é pleno iure. O particular é que terá o ônus de provar que sua área foi desmembrada legitimamente do patrimônio público em algum tempo por um título idôneo ou por algumas das formas de aquisição toleradas pelo Dec. Lei n.º 9.760 de 1.946 imamovial (sic) ou praescriptio longis simi temporis consumada ante do C.C (...)". (STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ. 09.11.1973)

No mesmo sentido, os seguintes precedentes daquele Pretório Excelso:

"TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".
(...)
Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. é verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


"TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO. RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964)

À guisa de exemplo, recentes precedentes desta E. Corte:

TERRAS DEVOLUTAS SITUADAS NA "FAIXA DE FRONTEIRA". TRANSFERÊNCIA A NON DOMINO PELO ESTADO DO PARANÁ. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO COM FINALIDADE REIVINDICATÓRIA. CONFLITOS FUNDIÁRIOS. PARTICULARIDADES QUE VIABILIZARAM A AÇÃO. LEGITIMIDADE DO ESTADO DO PARANÁ. SENTENÇA EXTRA PETITA E FALTA DE INTERESSE. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. SÚMULA 284⁄STF.

I - Quanto ao recurso do Espólio de José de Moura Torres, interposto com base unicamente em divergência jurisprudencial, verifica-se que o recorrente não apontou qual o dispositivo legal que teria sofrido interpretação divergente. Incidência da súmula 284⁄STF. Precedentes: REsp 468944⁄RS, Rel.Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ 12.05.2003 e AgRg no REsp 994910 ⁄MG, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJ 23.04.2008 e REsp 907.966⁄RO, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI , DJ 09.04.2007 p. 244.

II - Tendo o Estado transferido terras a non domino situadas na "faixa de fronteira" de domínio da União, para particulares, os quais por sua vez estão sendo desapropriados pelo INCRA, a solução da controvérsia, em tese, poderá afetar sua esfera jurídica, remanescendo patente a legitimidade do Estado do Paraná.

III - A ação utilizada pelo INCRA para outorga de títulos das pessoas que realmente ocupavam e produziam nas terras em conflito foi a mais apropriada nas circunstâncias apresentadas. Mesmo ciente de que as "terras devolutas" alienadas pelo Estado do Paraná na "faixa de fronteira" integravam o patrimônio da União, agiu acertadamente o INCRA ao optar pela desapropriatória ao invés de outras medidas reivindicatórias, não havendo se falar em inadequação. Inexistente a violação ao artigo 267, VI, do CPC.

IV - No que concerne à pretensa existência de decisão extra petita, como o próprio recorrente afirma, o Instituto recorrido, em sua peça exordial, pugna pela imissão na posse das áreas, impugnando o domínio ilegítimo dos expropriados. O fato de se aludir à eventual obtenção de tal declaração em ação própria não veda o julgador a apresentar desde logo tal declaração, máxime, como in casu ocorreu, quando vislumbrar que o exame do domínio é precedente à desapropriação.

V - A ratificação de títulos concedidos em área de fronteira descrita na Lei nº 9.871⁄1999 está direcionada ao detentor da posse, sendo certo que os procedimentos ulteriores a cargo do INCRA para declarar a nulidade das terras no âmbito administrativo não vedam a opção pela via judicial, tendo em vista as peculiaridades das questões envolvidas.

VI - Recurso especial do ESPÓLIO DE JOSÉ DE MOURA TORRES não conhecido. Recurso especial do ESTADO DO PARANÁ improvido.

(REsp 951.469⁄PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12.08.2008, DJe 25.08.2008)


ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL AJUIZADA PELO INCRA. ÁREA SITUADA EM FAIXA DE FRONTEIRA.
ESTADO DO PARANÁ. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284⁄STF. ANÁLISE DA LEGITIMIDADE DOS TÍTULOS NA AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. PROPRIEDADE DO IMÓVEL E EXISTÊNCIA DE DANO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7⁄STJ.

1. É pressuposto de admissibilidade do recurso especial a adequada indicação da questão controvertida, com informações sobre o modo como teria ocorrido a violação a dispositivos de lei federal. Súmula 284⁄STF.

2. Esta Corte, por diversas vezes, assentou o entendimento de que "in casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado do Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis" (REsp 721.768-PR, 1ª Turma, Min. Luiz Fux, DJ de 18.06.2008).

3. No mesmo sentido, são os julgados da 1ª Turma desta Corte, todos da relatoria do Min. Luiz Fux: REsp 728.795⁄PR, DJ de 19.06.2008;
REsp 825.685⁄PR, DJ de 19.06.2008; REsp 842.056⁄PR, DJ de 19.06.2008;REsp 848.965⁄PR, DJ de 19.06.2008; REsp 850.935⁄PR, DJ de 18.06.2008.

4. Incide o óbice da Súmula 7⁄STJ quanto às alegações da recorrente de que já fez prova de ser a proprietária do imóvel objeto da ação e à ocorrência de danos decorrentes da expropriação levada a efeito, pois o Tribunal de origem, ao analisar tais questões, posicionou-se no sentido de o imóvel jamais fugiu ao domínio da União e que se trata de hipótese em que não há que se falar em prejuízos aos ditos 'expropriados' que, por jamais exercerem qualquer das faculdades inerentes ao domínio das terras sob análise, nada sofreram com a retomada, pela União, da propriedade de terras que, em realidade, sempre lhe pertenceram. Nesse panorama, tendo-se que as especiais circunstâncias de fato levadas em consideração no acórdão recorrido não podem ser revistas em sede de recurso especial, não merece ser conhecida, no ponto, a pretensão recursal.

5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido.
(REsp 1029295⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.08.2008, DJe 20.08.2008)


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.

1. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.

2. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).

3. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que: "Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.

É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).

Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).

4. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


5. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, 5. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003;


Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


6. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


7. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis: CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.
§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


8. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


9. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


10. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos

- expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


11. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis: "TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".

(...) Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


12. No mesmo sentido: "TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO.

RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964) TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO.
USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art.200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ.
09.11.1973)


13. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


14. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.


15. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 933.901⁄PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p⁄ Acórdão Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.06.2008, DJe 25.06.2008)


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO DIRETA. DISCUSSÃO ACERCA DO DOMÍNIO. ART. 34 DO DL. 3.365⁄41. TERRAS DE FRONTEIRA. PARANÁ.


1. A alienação pelo Estado da Federação de terras de fronteira pertencentes à União é considerada transferência a non dominio, por isso que nula.


2. É máxima jurídica sedimentada que "ninguém pode transferir o que não tem", tampouco a entidade pública pode desapropriar bem próprio (nemo plus iuris transfere ad alium potest quam ipse habet).


3. Deveras, a doutrina de Carnelutti na sua Teoria Geral do Direito, acerca do ato jurídico inexistente aduz que: "Oposto a eficácia do ato e, em geral, do fato, que procede, não da sua perfeição mas da sua imperfeição, é a sua ineficácia. Ineficácia do ato material e inexistência do ato jurídico são designações equivalentes.


É a segunda a preferida na prática, em matéria de ato ilícito e, em geral, de atos não imperativos, em vista de estes atos serem praticados com um fim prático, independente da sua eficácia jurídica. Quando faltam os requisitos dessa eficácia, diz-se então, simplesmente, que não existe ato jurídico, ou que o ato material não constitui ainda um ato jurídico. Tal é, particularmente a fórmula adotada pelo Código de Processo Penal, onde se declara, para o caso de existir o ato material mas ser desprovido dos requisitos jurídicos, que o fato não constitui infração (a chamada Declaração de inexistência da infração: art. 479 do CPP).


Quanto aos atos imperativos, quando existe o ato material mas falta algum dos seus requisitos jurídicos, é uso chamar à ineficácia nulidade, designação diversa que tem como razão o fato de em tais atos a consecução do seu fim prático depender da sua eficácia jurídica, o que faz com que a ineficácia os torne inúteis, isto é, os anule por completo. O aforismo nullum est quod nullum producit effectum teria, pois, mais sabor se o invertêssemos; a nulidade é que é a expressão da inutilidade, e não vice-versa. Por outro lado, a inexistência deveria aqui significar, não propriamente a inexistência dos elementos jurídicos, mas dos elementos materiais do ato. Em breve veremos, porém, que há necessidade de alterar o conceito de inexistência. (Ed. Lejus, 2000, p. 484 e 161).


4. O novel Código Civil, ao versar a política das nulidades, erigiu regras que revelam que a nulidade absoluta e a inexistência jurídica são denominações que revelam a mesma essência conceitual. Assim é que dispõem os arts. 166, 168 e 169, verbis: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;


Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.


Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.


Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.


5. A doutrina do novo ordenamento é assente no sentido de que que: "A impossibilidade do objeto refere-se, essencialmente, ao aspecto físico ou jurídico. Por impossibilidade física do objeto compreende-se tudo o que o homem não pode realizar por suas próprias forças, impedindo pelas leis naturais. O aspecto jurídico diz respeito ao objeto incompatível com o ordenamento jurídico, seja por determinação da lei ou de disposição negocial. Indeterminável é o objeto que não pode ser determinado, faltando no conteúdo da declaração os requisitos para tornar possível a prestação" (Gustavo Tepedino et. al. Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. Vol. I. Renovar, p.310). No mesmo sentido, a doutrina atual do tema em contradição: Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 2002; Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico e Declaração Negocial, São Paulo, 1986; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. I, 20. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2004; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3. ed., Coimbra Editora, 1999; Clovis Bevilaqua, Código Civil Comentado, 10. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1953; Francesco Ferrara, A simulação dos Negócios Jurídicos, São Paulo, Saraiva, 1939; Francisco Amaral, Direito Civil, 5. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2003; J.M. Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. III, 9. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1963; João Alberto Schützer Del Nero, Conversão Substancial do Negócio Jurídico, Rio de Janeiro, Renovar, 2001; José Beleza dos Santos, A Simulação em Direito Civil, Coimbra, 1955; Leonardo de Andrade Mattietto, Invalidade dos Atos e Negócios Jurídicos, in Gustavo Tepedino (coord.), A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 2002; Luís Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, 4. ed., Coimbra, Almedina, 1995; Marcos Bernades de Mello, Teoria do Fato Jurídico: Plano de Validade, 4.ed., Rio de Janeiro, Saraiva, 2004; Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, vol. I, 3. ed., São Paulo, Saraiva, 2003;

Pietro Perlingieri, Perfis do Direito Civil, Rio de Janeiro, Renovar, 1999; Régis Velasco Fichtner Pereira, A Fraude à Lei, Rio de Janeiro, Renovar, 1994; Renan Lotufo, Código Civil Comentado, vol. I, São Paulo, Saraiva, 2003; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. 1, São Paulo, Altas, 2001; Sílvio Rodrigues, Direito Civil, 34. ed., São Paulo, Saraiva, 2003.


6. A adequação da realidade normativa à realidade prática denota que a ação de desapropriação por interesse social restou como a única demanda possível, posto ensejar imissão imediata na posse pela União, atingindo o escopo judicial da paz social, in casu, a crise fundiária legal entre os assentados e os ilegalmente titulados.


7. Deveras, a expropriação é ação real e por isso o domínio é o seu tema central. A suposta propriedade do Paraná sobre os imóveis ilegalmente alienados impõe a formação de litisconsórcio necessário (art. 47, § único, c.c o art. 3º, § 1º, da Lei n. 9.871⁄99), verbis: CPC - Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processos Lei n° 9.871⁄99 - Art. 3° Caso a desapropriação, por interesse social, para fins de reforma agrária, recaia sobre imóvel rural, objeto de registro, no Registro de Imóveis, em nome de particular, que não tenha sido destacado, validamente, do domínio público por título formal ou por força de legislação específica, o Estado, no qual situada a área, será citado para integrar a ação de desapropriação.

§ 1° Nas ações judiciais em andamento, o Incra requererá a citação do Estado.


8. Consectariamente, inocorre julgamento extra-petita na análise do domínio, no bojo da presente ação, porquanto há, em verdade, impossibilidade jurídica de o titular expropriar bem próprio, o que encerra figura assemelhada à confusão.


9. Deveras, não cabe ao ente público expropriar e indenizar aquilo que lhe pertente, ou, ainda, ao Incra indenizar área pertencente à União.


10. In casu, cuidam-se de milhares de ações de desapropriação em curso na Justiça Federal do Estado Paraná, cuja discussão dominial assume relevância amazônica, impondo-se o afastamento do óbice em enfrentar a legitimidade dos títulos, sob pena de resultar em nefastas conseqüências aos entes envolvidos - expropriados, Incra, União e Ministério Público, como, v.g., duplicação do número de ações no judiciário e enriquecimento sem causa, com prejuízos incalculáveis, segundo relatado pelo juízo de primeira instância.


11. Destarte, o afastamento da orientação jurisprudencial dominante torna-se, na hipótese, medida imperiosa, sem caracterizar violação à uniformização, porquanto a dúvida quanto à legitimidade dos títulos é real e concreta, demonstrável prima facie evidente, inclusive com orientações firmadas há décadas pelo Pretório Excelso, verbis: "TERRAS DE FAIXA DE FRONTEIRA. LEI N. 2.597 DE 12-9-55. ESSAS TERRAS PERTENCEM AO DOMÍNIO DA UNIÃO. OS ESTADOS DELAS NÃO PODEM DISPOR".

(...) Ora, no caso concreto, a justiça paranaense fez reverter para o Estado, as terras outrora vendidas à recorrente e integrantes da referida faixa. É verdade que essas terras foram vendidas pelo Estado, mas, isso significa que os seus títulos estão sujeitos à ratificação e retificação pela União que, no exercício do seu juízo discricionário, dirá se esses títulos continuam ou não continuam a ser válidos, através do reconhecimento que processar da legitimidade da concessão feita. E, as terras pertencem, incontestavelmente, ao domínio da União. É faixa de fronteira reservada expressamente há mais de um século aos serviços de defesa nacional, faixa esta, que hoje passou a ser de 150 Km, como em 1850 era de dez léguas". (STF - RE. 52331⁄PR. Min. Hermes Lima, DJ. 10.09.1963.


12. No mesmo sentido: "TERRAS DEVOLUTAS. FAIXA DE FRONTEIRA. CONCESSÃO FEITA PELO ESTADO.

RESCISÃO.

- As terras devolutas situadas na faixa de fronteira são bens dominicais da União.

- As concessões de terras devolutas situadas na faixa de fronteira, feitas pelo Estado anteriormente à vigente Constituição, devem ser interpretadas legitimando o uso, mas não a transferência do domínio, em virtude de manifesta tolerância da União e de expresso reconhecimento de legislação federal.

- O Estado concedente de terra devoluta na faixa de fronteira é parte legítima para rescindir os contratos de concessão com ele celebrados, bem como para promover o cancelamento de sua transcrição no Registro de Imóveis". (STF - ERE. 52331⁄PR, Rel. Min. Evandro Lins e Silva, DJ. 30.03.1964) TERRAS DEVOLUTAS DE FRONTEIRA. NULIDADE DA VENDA PELO ESTADO MEMBRO.
USUCAPIÃO DO DECRETO LEI 9.760⁄46. INAPLICABILIDADE DA LEI 2.437⁄55.


I - As terras situadas na faixa ao longo das fronteiras nacionais, na largura prevista na Lei 601⁄1850 e Decreto 1318⁄1854, em princípio, são do domínio da União, não sendo válidas as vendas delas feitas por Estados-Membros, aos particulares, ressalvadas as exceções do art. 5º, do Decreto Lei n.º 9.760⁄1.946.


II - Os bens públicos imóveis da União não podem ser adquiridos por usucapião (C.C, art. 67; Dec. 22.785⁄33; Decreto Lei 9.760⁄46, art. 200) ressalvados os caos de praescriptio longis simi temporis, a de 40 consumado antes de 1.917, e os do art. 5ª, "e", do Decreto Lei 9.760⁄46.


III - A lei 2.437⁄55, como disposição geral, não alterou o prazo de 20 anos da disposição especial do art. 5º, "e" do Decreto Lei nº 9.760⁄46".(STF - ACOr. 132⁄MT. Rel. Min. Aliomar Baleeiro, DJ.
09.11.1973) 13. A ratio essendi do art. 34, do Decreto-lei n.º 3.365⁄41, pressupõe disputa de preço e não controvérsia ab origine sobre se o expropriante titular do domínio pode expropriar res própria.


14. O prequestionamento é requisito essencial à apreciação do recurso especial. Ante à sua ausência, impõe-se a aplicação da Súmula 282⁄STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada".


15. Inadimissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo". (Súmula 211 do STJ).


16. É entendimento pacífico nesta Corte Superior que quando a matéria controvertida não foi apreciada pela instância originária, ainda que tenha surgido no próprio acórdão recorrido, obsta-se o conhecimento do apelo extremo.


17. Recurso especial do Ministério Público Federal não conhecido.


18. Recurso especial do INCRA provido.
(REsp 842.056⁄PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03.06.2008, DJe 19.06.2008)

Ex positis, conheço parcialmente dos recursos especiais e, nesta parte, DOU-LHES PROVIMENTO.
É como voto.


Documento: 833791 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 06/08/2009

Um comentário:

Adilson Amaro Alves disse...

Neste caso, o Recorrido Hildebrando Freitas Cayres, após o julgamento, ingressou com embargos de declaração, com pedido de atribuição de efeito de infringência, alegando obscuridade, contradição e omissão existentes no v. acórdão. O Min. Luiz Fux acolheu os embargos e, em princípio, entendeu que havia essa possibilidade (efeitos de infringência). Houve oferecimento de contrariedade pela União e os autos estão conclusos ao Relator.
Todo o caso remonta ao Império Brasileiro e as terras em questão, diferentemente de outras, foram legitimamente tituladas com base na Lei Imperial n. 601/1855, via decreto imperial de concessão, ao Engenheiro Texeira Soares e/ou à companhia por ele formada (aqui a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande) visando a construção da ferrovia. O decreto imperial foi ratificado integralmente por sucessivos decretos republicanos, até que no ano de 1920 houve a efetiva transferância de titularidade das terras à dita Companhia que, por sua vez, no ano de 1925, vendeu parte das terras à empresa Mate&Lopez e esta vendeu, em cadeia sucessória legítima, a varias pessoas. Em tais terras nunca se verificaram conflitos possessórios ou d superposição de títulos e nem foram, em momento algum, tituladas, na decada de 1950, pelo Estado do Paraná.
O que está acontecendo é que se fez confusão com outras terras e é isso que se pretende esclarecer, via embargos com efeitos de infringência e, como de fato, a modificação do julgado.
Maiores esclarecimentos podem ser prestados por mim, Adilson Amaro Alves, advogado do Recorrido Hildebrando Freitas Cayres e sua mulher Ruth Loebwein Freitas Cayres.